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Nine Artists, na Stevenson Gallery, na Cidade do Cabo

Published22 Jul 2015

Tags stevenson Nine Artists


Marvin Luvualu Antonio, Cape Town Redux, 2015, Acrylic on canvas, 280 x 227cm
© the artist. Courtesy STEVENSON, Cape Town. Photo: Mario Todeschin


Marvin Luvualu Antonio e Matthew Alexander King são dois artistas que integraram a exposição Nine Artists, que terminou a 18 de Julho, na Stevenson Gallery, na Cidade do Cabo e cuja permissa foi assim resumida no comunicado da galeria: “Each artist has, in some way or another, a relationship to the African continent. As a gallery, this reflects our program, but our intention for this exhibition was to avoid the imposition of an homogenizing theme, and the prescriptive reading thereof. Doubtless the exhibition will be read as a whole, but that is up to the viewer. It is, like many exhibitions, an experiment.”

O site Contemporay and entrevistou estes dois artistas sobre os trabalhos expostos no contexto da sua obra.

Marvin Luvualu Antonio

Stefanie Jason: Could you share how the concept of Trash Talks came about?

Marvin Luvualu Antonio: It was spurred by Philip K. Dick’s novel Do Androids Dream of Electric Sheep, specifically an invented term that kept being used: kipple. It refers to the detritus that covers the landscape and literally rains down on the human population in the form of dust. I liked how the characters had a neurotic relationship to kipple, which was this inescapable reminder of a past no one could either remember or had seen before. Their engagement with it raised questions about themselves and their world. So considering my affinity to found objects, I wanted to use the idea of kipple as a framework to engage with the landscape of Cape Town and its own archive of objects to produce a new site-specific body of work. I also thought the book made amazing analogies surrounding the idea of ‘the real’ in terms of humans’ relationships to replicas or what constituted real human connection. The androids made me think of sculpture or art in general in that sense.

Matthew Alexander King, You Asked A Joke Question, But I Gave A Serious Answer, 2015, Performance © the artist. Courtesy STEVENSON, Cape Town. Photo: Mario Todeschini

Matthew Alexander King

SJ: What brought about You Asked A Joke Question, But I Gave A Serious Answer [And So On], and its title? And why did you choose performative gestures for “Nine Artists”?

Matthew Alexander King: The very prosaic start of this answer is that I was asked specifically to do performance work for “Nine Artists.” The title in your question is actually truncated. The full title of my section of the show is, You Asked A Joke Question, But I Gave A Serious Answer, or Very Uncertain Gestures, or ‘Did I Win?’ ‘No. But At Least You Got Four Feet From The Dock’. I have a fondness for very long titles, for their unwieldiness and so on. It’s also a fairly straightforward way of providing thematic cues. Or, at least I hope it’s straightforward. The ‘performative gestures’ come then from that kind of space. I’ve been preoccupied of late with thinking about performance art and where some of its ‘limits’ might be, and what it means to work up against them. The invitation to be on this show seemed to provide me with the time to try and do something useful somewhere along those limits.

A entrevista completa, aqui

A cultura griot no livro Medicin, de António Poppe

Published21 Jul 2015

Tags poesia tradição griot

Capa de Joana Fervença

A partir do livro de poesia Medicin, de António Poppe, pela editora Douda Correira, cuja capa é inspirada num estudo árabe de anatomia, Alexandra Lucas Coelho escreve sobre a tradição dos griots, presente no livro, que invoca também um dito do militar brasileiro Cândido Rondon, bisneto de indígenas. 

1. Ouvir um livro antes de o ler, aconteceu antes de eu deixar Lisboa, no começo de Junho. É um livro feito para isso mesmo, ser dito, talvez cantado, como os griots fazem. A primeira vez que vi a palavra “griot” pensei numa criatura lendária, daquelas que os homens esculpiam nos templos ou à entrada das cidades, mas os griots existem em carne e osso até hoje. O pré-poema deste livro é uma definição de griot e diz assim:

Djeli, Griot: artesão da palavra. Guardião oral, oriundo Mandinga. Conciliante contador de histórias. Músico tocador de Kora que abrange tudo. Cadência que sara a voz criada. A fala do encontro.

2. Navegando pela rede, uma das explicações para a origem da palavra “griot” é a palavra portuguesa “criado”. A minha amiga Daniela Moreau confirma, e ela é o ponto de coincidência entre o livro que ouvi em Lisboa e este lugar onde agora o li, no interior de Minas Gerais. Não me tinha ocorrido ao trazê-lo, mas a Daniela passou os últimos anos mergulhada no mundo que os griots cantam e contam, guardando genealogias, herbários, antologias, a história da África ocidental. Então, quando abri o livro, ela abriu no ecrã do computador griots de há cem anos no Mali e no Senegal: por vezes em pé, por vezes sentados no chão, por vezes acompanhando um senhor, porque na tradição os griots eram os louvadores de um senhor, figuras da corte, embora sempre tenham existido griots itinerantes. Griots, resume Daniela, são louvadores, e também estarão no ensaio que ela se prepara para publicar no Brasil, resultado de anos de pesquisa sobre milhares de fotografias do francês François-Edmond Fortier (1862-1928), todo um caleidoscópio novo para o Mali e o Senegal durante a colonização francesa. Neste fim-de-mundo mineiro, que adoptei como oficina, Fortier é uma espécie de espírito da casa. Senta-se à mesa connosco e com os espíritos que vou trazendo, por exemplo, os que estão emmedicin. (assim mesmo, sem capitular e com ponto final), de António Poppe, o livro que ouvi antes de deixar Lisboa.

O artigo completo em O que vi seja amor

Imagem e memória: retrospectiva de Videobrasil em Buenos Aires

Published17 Jul 2015

Tags videobrasil videoarte



Imagem: Liu Wei. “Unforgettable Memory”, 2009. Video, 10’17’’.

Memorias imborrables é uma exposição, em três lugares da cidade de Buenos Aires, que mostra obras do arquivo de VideoBrasil, o festival de vídeoarte mais antigo da América Latina, com mais de 30 anos. Agora na capital argentina, uma selecção de 14 obras que sublinham a perspectiva crítica, histórica e a relação com as lutas políticas e sociais. 

“Con la selección intenté ser fiel a la línea de Videobrasil, y a la cuestión política y social que el festival siempre muestra”, comenta Pérez Rubio. “Hay presentes una serie de artistas provenientes de puntos geopolíticos claves. A través de ellos me pregunté cómo intentan recrear la memoria y cómo reflejan los conflictos que ocurren alrededor.” El corralito de 2001 en nuestro país, el apartheid sudafricano, la guerra civil en el Líbano, el avance de las compañías petroleras sobre la Amazonia, el racismo, la discriminación por género, la esclavitud, la colonización, son temas que se presentan en estos trabajos –algunos, piezas históricas del lenguaje audiovisual– y que, en diferente medida, continúan vigentes. El video más antiguo es de principios de los años 80: O sangue da terra , de Aurélio Michiles es un alucinante documental que el artista realizó con el pueblo Sateré Mawé en medio del Amazonas, en contra de la compañía petrolera francesa Elf Aquitaine, ¡sin siquiera tener una cámara propia! Analógica, por supuesto, la película fue hecha en U-matic, el primer formato de videocasete que estuvo a la venta. El video más reciente es de 2013 –el excelente O samba do crioulo doido , de Luiz de Abreu–. Si se tiene en cuenta que entre uno y otro video hay tres décadas, es inmediata la reflexión sobre cómo algunos problemas políticos y sociales siguen sin solución aún tiempo después de haberse puesto en evidencia. También es notable en Memorias imborrables la cuestión del desarrollo técnico; los diferentes soportes con que cada uno de los videos fue realizado son indicadores, también, de diferentes períodos históricos. A pesar de que todas las obras están digitalizadas, existe un desafío que va más allá de esta muestra, y que se refiere a temas de conservación y restauración patrimonial técnica y digital: ¿cómo hacer para preservar las características de cada soporte de video? “Esto es fundamental para realizar una lectura histórica de las obras –comenta Farkas– ya que algunas están identificadas por los tipos de aparatos técnicos del momento en que fueron realizadas. Se trata de lo que podríamos llamar una arqueología de los medios”.

Na Revista Clarín, Si hay imagen no hay olvido

A despedida de Paul Theroux de África

Paul Theroux, escritor de viagens e romancista, autor de a Arte da Viagem (Quetzal, 2012), O Grande Bazar Ferroviário (Quetzal, 2011), Regresso à Patagónia, entre tantos títulos, viveu no Malawi nos anos 60 e regressou diversas vezes ao continente africano, tema de muitas das suas obras.  Último Comboio para a Zona Verde (Quetzal, 2014) narra a sua viagem da Cidade do Cabo até Angola, experiência de tal forma marcante que assinala a sua despedida de África. O El Pais escreveu sobre este livro:

El último tren a la zona verde relata el viaje del autor por tierra por el sur de la costa oeste africana entre Ciudad del Cabo y Angola, un país que ha padecido una de las guerras más largas, salvajes y olvidadas del siglo XX. La desértica Namibia ocupa un lugar central en su viaje y, sobre todo, su encuentro con los bosquimanos, una tribu de cazadores recolectores que tienen un lazo directo con nuestros antepasados más remotos, ya que son el pueblo más antiguo de la tierra. Este libro es mucho más que un viaje. En cierta medida, Theroux lo utiliza para despedirse de África, ya que está escrito desde la sensación de que tal vez no le queden energías para realizar otro recorrido similar. Y, en ese sentido, trata de reflejar en él toda una vida de sabiduría viajera, de cruces de fronteras, de encuentros inesperados con el otro, de paisajes y ciudades que muestran la inagotable diversidad del mundo. El libro está lleno de historia, de referencias literarias —recuerda una maravillosa frase del gran libro de Rebecca West sobre los Balcanes, Cordero negro, halcón gris: “A veces es muy difícil saber la diferencia entre la historia y el olor de una mofeta”—. Pero, ante todo, ofrece una mirada sobre lo que significa viajar, escrita por un autor que ha recorrido prácticamente todo el mundo. Explica, por ejemplo, que no se puede conocer una ciudad desde su centro, que siempre hay que acudir a su periferia.

Artigo completo em Una despedida de África

Hélia Correia e a língua portuguesa

Imagem: Gonçalo Rosa da Silva

A escritora portuguesa Hélia Correia foi recentemente distinguida com o Prémio Camões, sucedendo ao brasileiro Alberto Costa e Silva. Autora de romances, contos, peças de teatro e poesia, conta com uma obra extensa, entre a qual se destaca O Separar das Águas (1981), A Casa Eterna (2000), Adoecer (2010) e Vinte Degraus e Outros Contos (2014), publicados em Portugal pela Relógio d'Água.  O prémio foi entregue dia 7 de Julho, ocasião em que a autora falou da importância da literatura e da diversidade da língua portuguesa. 

Na ditadura da economia, a palavra é esmagada pelo número. A matemática, que começou nobre, aviltou-se, tornando-se lacaia. Se a literatura salva? Não, não salva. Mas se ela se extinguir, extingue-se tudo.

O nosso mundo de sobreviventes está seguro por laços muitos finos. Eu vejo os fios que unem os textos nas diversas versões do português, leves fios resistentes e aplicados a construirem uma teia que não rasgue. Quando o angolano Ondjaki dedica um poema ao brasileiro Manoel de Barros, quando Mia Couto reconhece a influência que teve Guimarães Rosa na sua escrita transfiguradora e transfigurada pelas africanas narrativas do seu povo; quando a portuguesa Maria Gabriela Llansol  considera Lispector «uma irmã inteiramente dispersa no nevoeiro», vemos a língua portuguesa a ocupar - não como o invasor ocupa a terra, mas como o sangue ocupa o coração - um espaço livre, um sítio para viver, uma comunidade de diferenças elástica, simbiótica e altiva. Esta é a ditosa língua, minha amada.

O texto completo, em Ditosa lingua

Visões sobre a negritude na fotografia

Published14 Jul 2015

Tags Negritude fotografia arquivo Sebastião Salgado

Imagem: Fotógrafo desconhecido, Retrato de estúdio do Rei Khama III. África do Sul, início do séc. XX

A exposição Distance and Desire: Encounters with the African Archive esteve patente no C/O Berlin, em colaboração com o African Photography from The Walther Collection. Elsa Guily, crítica de arte radicada em Berlim, analisa esta exposição, confrontando-a com outra, Genesis, de Sebastião Salgado, do ponto de vista da representação dos estereótipos e da perpetuação, ou não, da perspectiva ocidental dominante sobre a negritude.

 Its eloquent title, Distance and Desire: Encounter with the African Archive, announces its preconceived purpose upfront: asking questions as to the role of archives and the impact of the photographic image in the writing of history. The project was organized into three sections, beginning with photographs from the Walther Collection and juxtaposing images from historical archives of photos taken in southern and eastern Africa around the turn of the twentieth century with works by contemporary artists from African perspectives whose approaches seek to reinterpret the ethnographic and colonial archive. From the outset, the visitor is clued in:  it is impossible to view these photographs without realizing the violent relations inherent in European colonialism in Africa, and equally impossible to detach them from the historical contexts in which they were produced. The displacement of these archives invites us to examine our own gaze with a certain critical distance in order to reflect upon the processes of identifying and constructing difference, especially racial and gendered difference. The project re-envisions the archive as the bearer of collective memory, restoring the agency and individuality of the subjects portrayed and thereby creating alternative narratives of history.

In parallel to Distance and Desire, the Genesis project by photographer Sebastião Salgado intones an ecological message to humanity. These purportedly “socially conscious” photographs, which amount to a romantic invitation on an “eco-tourist” journey, perpetuate the representation of ethnicized bodies beside immaculate landscapes in black and white. The portraits’ subjects are made anonymous, their identities reduced to objectifying and vulgarizing captions that describe their practices and customs. Considering that both cultural visions are embedded in the same globalized, post-migratory space, it seemed to me that despite the Distance and Desire project’s noble intentions to deconstruct the white supremacist gaze, an ambivalent complicity might lodge in visitors’ minds. Thus I was compelled to interrogate both exhibition spaces jointly in light of the problems of images’ circulation and the act of “making visible.” How is the viewer positioned in relation to the discursive powers of representation? What relationships are formed between the photographer as an auteur, the individual photographed, and the viewer? At what point does the act of observation begin to dictate the subject’s development?

O texto completo em Gazing at a Distance

A obra de Clarice Lispector pelo seu biógrafo

Published13 Jul 2015

Tags clarice lispector Benjamin Moser

Benjamin Moser, biógrafo de Clarice Lispector, autor de Clarice. Uma Vida (2010, Civilização Editora), publica na New Yorker um texto sobre a escritora. 

In the eighty-five stories that she wrote, Clarice Lispector conjures, first of all, the writer herself. From her earliest story, published when she was nineteen, to the last, found in scratchy fragments after her death, we follow a lifetime of artistic experimentation through a vast range of styles and experiences. This literature is not for everyone: even certain highly literate Brazilians have been baffled by the cult-like fervor she inspires. But for those who instinctively understand her, the love for the person of Clarice Lispector is immediate and inexplicable. Hers is an art that makes us want to know the woman; she is a woman who makes us want to know her art. Through her stories we can trace her artistic life, from adolescent promise through assured maturity to the implosion as she nears—and summons—death.

But something more surprising appears when these stories are at last seen in their entirety, an accomplishment whose significance the author herself cannot have been aware of, for it could only appear retrospectively. This accomplishment lies in the second woman she conjures. Clarice Lispector was a great artist; she was also a middle-class wife and mother. If the portrait of the extraordinary artist is fascinating, so is the portrait of the ordinary housewife, whose life is the subject of her stories. As the artist matures, the housewife, too, grows older. When Lispector is a defiant adolescent filled with a sense of her own potential—artistic, intellectual, sexual—so are the girls in her stories. When, in her own life, marriage and motherhood take the place of precocious childhood, her characters grow up, too. When her marriage fails, when her children leave, these departures appear in her stories. When the author, once so gloriously beautiful, sees her body blemished by wrinkles and fat, her characters see the same decline in theirs; and when she confronts the final unravelling of age and sickness and death, they appear in her fiction as well.

O texto completo em The True Glamour of Clarice Lispector

Carta aberta pela liberdade de expressão, de Abdelhak Serhane

Abdelhak Serhane, escritor, ensaísta e poeta marroquino que esteve presente na Festa da Literatura e do Pensamento das Zonas de Contacto, no Próximo Futuro, em Junho de 2015, no debate em torno dos quatro anos da Primavera Árabe, escreveu uma carta sobre a questão da diminuição da liberdade de expressão no seu país, que tem tido forte eco nas redes sociais, apontando ao Estado o principal foco de repressão a par de um investimento contraditório em equipamentos culturais, conforme noticia H24 com o Le Figaro.

A carta, na íntegra, publicada no blogue de Mediapart

« Tout ce qui dégrade la culture raccourcit les chemins qui mènent à la servitude. » A. Camus

 

Au Maroc, depuis une décennie au moins, nous assistons à des offensives répétées de la part du système contre les libertés en général et la liberté d’expression en particulier. La presse dite indépendante fait désormais partie du souvenir et rien ne justifie la violence physique disproportionnée ou le harcèlement psychologique dont use l’Etat contre la liberté des citoyens.

L’Etat qui emprisonne le journaliste, condamne le chanteur, appréhende le caricaturiste, interdit un livre ou un film, pousse ses intellectuels à l'exil ou au silence… L’Etat qui veut cacher la vérité comme il cache ses femmes et musèle ses hommes, qui s'entoure de lamentables interlocuteurs, crie au scandale devant les fesses d’une star invitée par lui, tremble devant une robe ou un bikini, mobilise ses cohortes de journaleux spécialistes de l'injure quand le mensonge est dévoilé... n'est pas un Etat solide, sûr de sa légitimité. L'Etat qui refuse de voir ce qui se passe dans la rue, ne veut pas entendre ce qui se dit sur lui, qui ne dialogue pas, qui a atteint un niveau singulier dans l'art de l'interdit et de la répression, est un Etat qui a peur. Peur de ses propres enfants et de ses défaillances. Un mot le perturbe. Un dessin le trouble. Un livre le déstabilise. Une caricature l’ébranle. Une information le dérange. Une anecdote l’agite...Et un spectacle lui ôte le sommeil. Cet Etat-là n'est pas un Etat-citoyen. Un Etat qui s'impose par la violence du gourdin n'est pas un Etat de droit. Un Etat qui n'honore pas ses femmes et ses jeunes, qui ne les respecte pas, n’est pas un Etat démocratique et ne peut être ni respecté ni écouté ni honoré à son tour. Et cet Etat qui permet aujourd’hui à n’importe qui de s’ériger en censeur, donneur de leçons, juge ou gardien de la morale, cherche à faire de nous des morts-vivants.

Texto integral em Ils veulent qu'on vive comme des morts

Atenas: cultura e arte em tempos de incerteza

No passado mês de Junho, dias 18 e 19, aconteceu na Fundação Calouste Gulbenkian o Encontro de Lisboa: Reunião de Organizações Independentes para a Mobilidade Artística e Cultural no Mediterrâneo e na América Central, uma iniciativa do Roberto Cimetta Fund em parceria com o Próximo Futuro, inserido no Observatório de África, América Latina e Caraíbas.

O encontro, restrito ao grupo de trabalho, cujo programa pode ser consultado aqui, abordou o conceito de mobilidade, as necessidades dos artistas destas regiões, os benefícios da mobilidade cultural para o diálogo da sociedade civil, os financiamentos existentes e necessários, entre outros temas.

Herman Bashiron Mendolicchio, um dos participantes no encontro,doutorado em História de Arte, Teoria e Criticismo pela Universidade de Barcelona e é investigador visitante no United Nations University Institute on Globalization, Culture and Mobility (UNU-GCM), publicou recentemente o artigo "Athens: arts and culture in times of uncertainty":

In a recent trip to the Greek capital, the city of Athens, I tried to understand the production, development and circulation of art and culture in “difficult times”. For that I met and talked to artists and professionals from cultural institutions, and I dipped in the atmosphere of the city today. If we exclude those central streets crossed by tourists, the Acropolis area and some spring nights in Gazi or Exarcheia, the general atmosphere of the city is definitely quite tense.

The economic crisis, which has evident effects on the daily life of the population, has certainly affected the art and cultural sector. At the same time, the points of view and perceptions regarding the vitality, the opportunities and the strength of the sector are quite discordant.

On one side, the cultural and artistic field have been ravaged by the savage cuts brought by a widespread depression. On the other side, the cultural and social life in the city of Athens seems to remain bright and effervescent. What are the reasons behind this apparent contradiction? From a certain point of view, the public funding in Greece has always been quite small and the sector is used to struggle to find the necessary funds to survive. According to some Athenians, the economic crisis has awakened, paradoxically, a sense of vitality, a rediscovered sense of relations, giving new and higher relevance to the social aspects of life. Other Athenians, nonetheless, perceive a deep depression in the sector, pointing at the example of many artists and cultural professionals who have migrated to other countries.

Artigo completo aqui

Diego Rivera e Frida Kahlo em Detroit

Published9 Jul 2015

Tags Frida Khalo diego rivera Detroit

Imagem: Frida Kahlo, “Self-Portrait on the Borderline between Mexico and the United States” (1932), oil on metal (private collection)

A exposição Diego Rivera and Frida Kahlo in Detroit, no Detroit Institute of Arts, mostra, até domingo, obras dos dois artistas mexicanos relacionados com a sua passagem pela cidade, nos anos 30, num tempo muito anterior à bancarrota da cidade, que mudou completamente a paisagem e a vida dos seus habitantes. O site Hyperallergic escreve sobre esta exposição:

Detroit has become a cautionary tale for what can happen when people cling to old methods in times that require innovation and radical change. The most interesting and important part of this exhibition is not how the artists loved each other or what they made in Detroit, or even why or how they made it, but the way it underlines the struggles and ties between art, labor, and matrimony that persist 80 years after the couple left town. The air of conventionality and traditionalism in the way this couple’s works and lives are displayed doesn’t feel like a celebration of the DIA or Detroit’s artistic future, but like a representation of the city’s continued longing for the perceived comforts of the past. The art is constantly in conflict with the institutions it ostensibly sought to romanticize: Rivera and Kahlo’s marriage; the automotive industry; and, more subtly, the museum itself.

O artigo completo em Frida Kahlo and Diego Rivera Offer Dueling Accounts of Detroit’s Industrial Glory

Alejandro Zambra escreve sátira sobre acesso à faculdade no Chile

Published8 Jul 2015

Tags Alejandro Zambra


Ilustração: Matt Dorfman Alejandro Zambra, autor chileno que esteve no Próximo Futuro em 2014, publica texto inédito na revista The New Yorker, uma sátira aos exames de entrada para a faculdade no Chile. 

After so many study guides, so many practice tests and proficiency and achievement tests, it would have been impossible for us not to learn something, but we forgot everything almost right away and, I’m afraid, for good. The thing that we did learn, and to perfection—the thing that we would remember for the rest of our lives—was how to copy on tests. Here I could easily ad-lib an homage to the cheat sheet, all the test material reproduced in tiny but legible script on a minuscule bus ticket. But that admirable workmanship would have been worth very little if we hadn’t also had the all-important skill and audacity when the crucial moment came: the instant the teacher lowered his guard and the ten or twenty golden seconds began.

At our school in particular, which in theory was the strictest in Chile, it turned out that copying was fairly easy, since many of the tests were multiple choice. We still had years to go before taking the Academic Aptitude Test and applying to university, but our teachers wanted to familiarize us right away with multiple-choice exercises, and although they designed up to four different versions of every test, we always found a way to pass information along. We didn’t have to write anything or form opinions or develop any ideas of our own; all we had to do was play the game and guess the trick. Of course we studied, sometimes a lot, but it was never enough. I guess the idea was to lower our morale. Even if we did nothing but study, we knew that there would always be two or three impossible questions. We didn’t complain. We got the message: cheating was just part of the deal.

O artigo completo aqui

Filosofia africana

Published7 Jul 2015

Tags Filosofia africana

Imagem: Chérif Thiam: “Gouye Birame Coumba”, Senegal, 1973

A partir de livros como El pensamiento tradicional africano, de Ferrán Iniesta ou Síntesis sistemática de la Filosofía Africana, de Nkogo Ondó, Sonia Fernández Quincoces, colaboradora do blogue Literafrica identifica vários nomes do pensamento filosófico africano, como Cheik Anta Diop, Wole Soyinka, Chinua Achebe, Ngugi wa Thiong´o, Okot p’Bitek o Taban Lo Li, entre outros:

El historiador y antropólogo senegalés Cheikh Anta Diop publicó en 1955 su tesis doctoral en el libroNations nègres et culture  sobre la idea de que el antiguo Egipto había sido una cultura negra. Peroafirmó además que Egipto había sido la cuna de la civilización occidental. Diop aseguró que la filosofía nació en Egipto, fruto de los viajes a esta tierra que llevaron a cabo pensadores como Tales de Mileto, Aristóteles, Pitágoras o Platón, que se formaron en Heliópolis, Hermópolis, Menfis o Tebas, los centros del saber egipcios (e, incluso, hay base para hablar de un origen de la filosofía en Etiopía).

Lo anterior es una muestra más de lo poco que conocemos sobre nuestra propia cultura y pensamiento. Y lo mucho que nos han (re)conducido hacia ese lugar único al que (re)conocemos como la única civilización: occidente. Para después verter buenas capas de negación en torno al constatado hecho de que los africanos han elaborado (antes y después) sistemas de pensamientos complejos y dignos de ser escuchados, tenidos en cuenta y estudiados. La creencia colonialista que mantenía que el negro no podía crear filosofía alguna debido a su mente pre-lógica fue la antesala de la negación de su existencia. El anterior solo es uno de los muchos clichés que pesan sobre ella, al igual que el creer que no existe actividad filosófica fuera del tipo o método occidental de filosofar tan sustentado en el razonamiento lógico.

Artigo completo em El pensamiento africano existe, aunque lo ignoremos o lo desconozcamos

O Totem do Próximo Futuro em 2014 no Archdaily

Published6 Jul 2015

Tags Totem Tupã Projecto Subvert arquitectura

© Subvert / APP Photography

O Totem Tupã, o espaço onde se realizaram em 2014, os debates da Festa da Literatura e do Pensamento da América Latina, foi destacado no site de arquitectura Archdaily. O projecto, da Subvert Studio, foi concebido por Tiago Rebelo de Andrade, Diogo Ramalho, Manuel Tojal, Kaleigh Nunes, Adrien Zlatic. 

© Subvert / APP Photography

Totem é "(...) um objeto ou animal no qual uma determinada sociedade acredita ter um significado espiritual e que é adotado por essa mesma sociedade como um símbolo."

O Totem reflete os quatro elementos naturais: a terra – de onde ele surge; o ar – o elemento que o sustenta; o fogo – através da reflexão da luz e do sol; e a água – insinuado pela respetiva textura e forma. A estrutura do pavilhão é de aço e construído com placas de madeira cobertas de papel espelhado.

Outras imagens e informação aqui

O mercado da arte segundo os países de origem

Published3 Jul 2015

Tags Mercado da arte Origem geográfica

De que forma a origem geográfica dos artistas condiciona o valor das obras no mercado mundial? Como é que esse aspecto influencia as economias? Quais são os países mais valorizados? É o tema do artigo do site Hyperalergic, que se refere a um site dedicado a comparar mercados em várias áreas.  

Still, aside from being pretty, the maps offer some insightful observations of the art market: as howmuch.net notes, buyers tend to assign the greatest value to Western — and largely European — works: according to its numbers, paintings by Munch, Warhol, Klimt, van Gogh, Monet, Ruben, and Modigliani claim the top ten positions. The most expensive painting from Asia is reportedly Zhang Daqian’s “Lotus and Mandarin Ducks,” which sold for $24,551,210 — or less than 14 percent of Picasso’s price tag. Chilean artist Robert Matta claims the highest value for a South American work for “La révolte des contraires,” which raked in $5,010,500; just $35,000 shy of Matta’s painting is the highest-selling one from Africa: South African artist Irma Stern’s “Arab Priest.” Matta and Stern’s paintings each amount to less than three percent the cost of the Picasso.

Discrepancies aside, the study concludes that the maps illustrate “the accumulation of wealth in rich nations,” showing the increasing value of artworks as investments rather than objects appreciated solely for aesthetic reasons.

O artigo completo aqui

«O genocídio do Ruanda: 'o direito de olhar'»

Clara Caldeira, moderadora da sessão de Poesia das Zonas de Contacto, é investigadora do Centro de Estudo de Comunicação e Cultura da Universidade Católica e apresentou na Summer School of Culture/Lisbon Consortium, subordinado ao tema da Cidadania Cultural, um ensaio sobre a representação do genocídio do Ruanda na obra de Alfredo Jaar e Pieter Hugo. 

«O genocídio do Ruanda: 'o direito de olhar'»

Introdução

Num mundo globalizado pela comunicação, historicamente em plena era pós-colonial, no sentido estrito da temporalidade, após a independência dos países outrora colonizados, pretendemos neste trabalho analisar duas visões artísticas sobre o genocídio do Ruanda, ocorrido entre o início de Abril e meados de Julho de 1994 (cerca de 100 dias), que resultou em milhares de mortos, estimados entre 800 mil e um milhão. Queremos averiguar de que forma estas expressões artísticas constituem produção de conhecimento sobre o acontecimento, na complexa rede geopolítica do nosso tempo, contribuindo decisivamente para uma maior cidadania cultural.

Teremos em conta dois criadores, de geografias a sul do Equador, uma vez que nos interessa manter presente as novas identidades contemporâneas e a sua produção de discurso crítico através da criação, no contexto pós-colonial. São eles:

O artista multimédia Alfredo Jaar (Chile, 1956), com obra extensa sobre o etnocentrismo da perspectiva ocidental sobre o mundo, e o trabalho Untitled, de 1994, em que compara a cronologia do genocídio no Ruanda, descrita em texto, com as capas da Newsweek, no mesmo período de 17 semanas, colocando em evidência a invisibilidade da tragédia nesta relevante publicação norte-americana.

O fotógrafo Pieter Hugo (África do Sul, 1976), com dois trabalhos: Rwanda 2004: Vestiges of a Genocide, de 2004, em que, passada uma década, fotografa ossos, roupa, sepulturas; e Portraits of Reconciliation (2014), trabalho onde reúne pares de perpetrador/vítima, lado a lado, vinte anos depois.

Pretende-se, neste ensaio, responder às questões enunciadas:

Do ponto de vista do contexto pós-colonial:

Para o que chamam a atenção estas obras, enquanto discursos de criadores do sul? De que forma as obras constituem um discurso relevante na relação pós-colonial norte-sul, outrora, impérios e colónias? Como é que estes artistas reclamam “the right to look”?

Do ponto de vista da cidadania cultural:

Que contributo dão estas obras para uma ideia de mundo global (pós-colonial, pós-imperial) não estritamente em termos comunicacionais ou económicos, mas de cidadania cultural? Em que medida o facto de estes criadores serem do sul, mas com um alcance mundial, contribui para novos equilíbrios em termos de visibilidade de acontecimentos que levantam questões a nível humanitário?

Breve contextualização do genocídio do Ruanda

O Ruanda é um país africano sem costa marítima que faz actualmente fronteira com o Uganda, o Burundi, a República Democrática do Congo e a Tânzania. Ao contrário dos territórios vizinhos, não teve o seu destino decidido na Conferência de Berlim (1884-1885) que estabeleceu a partilha de África entre as potências europeias, mas sim numa conferência realizada em Bruxelas em 1890, onde foi entregue, juntamente com o Burundi, ao Império Alemão, em troca do Uganda. Depois da I Guerra Mundial e na sequência das sanções impostas pela Sociedade das Nações, o Ruanda é entregue à Bélgica que, mesmo após a II Guerra Mundial, tendo o estatuto de protectorado das Nações Unidas, permanece sob administração belga.

Anteriormente um reino monoteísta, a religião cristã é ali, como noutros lugares, um dos elementos fundamentais do processo de colonização, num regime que privilegiou a minoria tutsi, permitindo-lhes educação e acesso a cargos públicos, o que provoca um ressentimento crescente na maioria hútu, embora as etnias partilhem religião, língua e costumes.

Em clima de lutas independentistas, em 1959 dá-se um motim de expressão hutu e é publicado um manifesto de defesa daquela etnia. Grupos tutsis aproximam-se de outros movimentos independentistas de matriz comunista, o que afasta o governo belga, que passa a dar mais apoio à maioria hutu no processo de independência, que se efectiva em 1962. Os hutus ganham o poder, a tensão cresce, ocorrem tumultos que causam um número indeterminado de mortos, que se estima em milhares, e dá-se uma significativa migração de tutsis para o Uganda, genericamente associados aos comunistas, por oposição ao governo hutu, ligado à Igreja Católica e à influência democrata-cristã europeia.

Em 1973, Juvénal Habyarimana, hutu, então Ministro da Defesa, destitui o seu primo Grégoire Kayibanda e aprova uma nova constituição que aboliu todas as actividades políticas de oposição, com nível elevado de hostilidade contra os tutsis e um acentuado pendor católico, sendo obrigatório ter o baptismo para obter escolaridade mínima. Nos anos 80, um grupo de guerrilha tutsi liderado por Paul Kagame forma, no Uganda, a Frente Patriótica Ruandesa (FPR) com o objectivo de derrubar o presidente e regressar ao poder. O clima de tensão é crescente no Ruanda, com os tutsis a serem acusados por membros do governo de todos os problemas nacionais, e com uma forte retórica anti-comunista. Nos anos 90, o Ruanda atravessa uma crise económica e a FPR entra no país, despoletando o conflito em várias zonas. Em 1993, os Acordos de Arusha, na Tanzânia estabelecem um acordo entre as partes. Neste período, tenso e instável, instala-se no país uma missão de paz das Nações Unidas, para acompanhar o desenrolar dos acontecimentos.

A 6 de Abril um avião que transportava o presidente é atingido por um míssil, causando a sua morte e a do seu homólogo do Burundi, não estando esclarecida até hoje a autoria do atentado. A guarda presidencial dá início de imediato a uma campanha de retaliação e começam as matanças nas ruas de Kigali, sobretudo protagonizadas pela milícia Interahawe, que chegou a ter 30 mil elementos. Armas de fogo e artesanais foram distribuídas avulso à população, uma rádio de propaganda começa a emitir ordens de extermínio dos tutsis, considerando-os “o diabo” a eliminar da face da Terra. A primeira-ministra, hutu moderada, e dez capacetes azuis belgas são assassinados nos primeiros dias do genocídio. Ao final de uma semana, contam-se já 25 mil mortos. Mais de um milhão de refugiados estabelecem-se na Tânzania. A Bélgica retira quase de imediato o seu contingente do terreno. A 21 de Abril, uma resolução das Nações Unidas reduz o efectivo de capacetes azuis de 2500 para cerca de 300 homens. Durante os cem dias em que decorre a tragédia, sucedem-se negociações na ONU, em que a Nigéria intervém a favor do reforço do contingente e os Estados Unidos alegam o rescaldo da Somália para defender a não intervenção, apoiados de uma forma geral pelos países europeus. Várias forças militares colocadas em países próximos responsabilizam-se exclusivamente pela evacuação de brancos do país, de embaixadas e serviços. A missão de paz, comandada por Roméo Delaire, recebe instruções para abandonar o território mas, com o apoio da secção ganesa, o comandante recusa e permanece até ao final do conflito.

Depois de avanços significativos no norte do país, em finais de Junho, a FPR toma a capital e as matanças prosseguem. Os números ascendem a mais de meio milhão de mortos e estima-se que um milhão de hutus tenham saído do país, para campos de refugiados na República Democrática do Congo. Nesta altura, França anuncia o envio de reforços para a força de paz e é criada uma “zona de segurança” no sudoeste. Vários impasses negociais e administrativos retardam a chegada de mais capacetes azuis. Apenas a 21 de Julho se determina o reforço do contingente. Constitui-se um governo multiétnico de transição presidido por Pasteur Bizimungu e Paul Kagame como vice, que depõe o primeiro, sob acusações de instigação de mais conflitos étnicos. Em Novembro de 1994, uma resolução do Conselho das Nações Unidas criou o Tribunal Penal Internacional para o Ruanda que julgou e condenou alguns dos responsáveis hutus. Estima-se que entre 800 mil a um milhão de pessoas perderam a vida e os refugiados ultrapassam os 2 milhões, de ambas as etnias. A violação foi uma prática corrente durante o genocídio, estimando-se que 250 a 500 mil mulheres foram violadas, disparando o índice de infecção por HIV no país, de que resultaram também 75 mil órfãos e cerca de 5000 mil crianças nascidas dessas relações foram assassinadas.

Os acontecimentos do Ruanda e a desresponsabilização da comunidade internacional deram origem a vários trabalhos de investigação e a um pedido formal de desculpas do então Presidente Clinton. A jornalista inglesa Linda Melvern[1] publicou dois livros sobre os planos detalhados do poder hútu para exterminar os tutsis, o conhecimento e a cumplicidade ocidentais, referindo o envolvimento de alguns países em tráfico de armas comprados com fundos humanitários desviados. Recentemente, em 2014, a BBC emitiu um polémico documentário, “Rwanda’s Untold Story”[2], onde vários testemunhos dão conta de matanças de hutus por tutsis, da participação de Paul Kagame em actividades criminosas e em propaganda de guerra enganosa, propondo uma interpretação dos acontecimentos contrária àquela que coloca os hutus como os grandes responsáveis de um genocídio que ficará para a História como um recorde de mortos em relação ao curto tempo do conflito.

[1] A People Betrayed. The role of the west in Rwanda’s Genocide,  Zed Books, 2000;  Conspiracy to Murder: The Rwanda Genocide, Verso, 2004 

[2] Disponível aqui: https://vimeo.com/107867605

A representação ocidental de África

A representação contemporânea ocidental sobre África é, de uma forma geral, negativa, e construída em torno de estereótipos e lugares-comuns sobre o continente, retratando-o como um lugar caótico, corrupto, assolado por conflitos “tribais”, onde a guerra, a miséria e a fome são os elementos chave dessa caracterização, com forte implementação no imaginário colectivo.

Na obra que dedica à questão das imagens do sofrimento, Regarding the Pain of Others, Susan Sontag (2004) situa historicamente a representação fotográfica de África no mundo ocidental desta forma:

"The more remote or exotic the place, the more likely we are to have full frontal views of the dead and dying. Thus postcolonial Africa exists in the consciousness of the general public in the rich world – besides through its sexy music – mainly as a succession of unforgettable photographs of larged eyed-victims, starting with figures in the famine lands of Biafra in the late 1960’s to the survivors of the genocide of nearly a million Rwandan tutsis in 1994 and, a few years later, the children and adults whose limbs were hacked off during the program of mass terror conducted by the RUF, the rebel forces in Sierra Leone (More recently, the photographs are of whole families of indigent villagers dying of AIDS). These sights carry a double message. They show a suffering that is outrageous, unjust, and should be repaired. They confirm that this is the sort of thing which happens in that place. The ubiquity of those photographs, and those horrors, cannot help but nourish belief in the inevitability of tragedy in the benighted or backward – that is, poor – parts of the world"(Sontag, 2004: 63-64).

Outra questão levantada por Sontag, sobre o discurso noticioso ocidental, cada vez mais dominado por imagens, é a noção de ‘mundo’, anunciado nos teasers e nos slogans dos espaços informativos televisivos ou dos jornais e revistas, em corolários que se propõem ‘dar o mundo em 20 minutos’ ou ‘pôr o mundo nas suas mãos’, “a very small place, both geographically and thematically, and what is thought to worth knowing about i tis expected to be transmitted terselly and emphatically” (idem: 17). Um mundo onde, nos media ocidentais, predominam as preocupações do norte do globo ou as suas perspectivas sobre os problemas em outras locais da Terra, nomeadamente África, comummente caracterizada como anteriormente descrito.

Um quadro de exclusão e negatividade que configura “an absolute otherness” (Mbembe, 2001: 2), nas palavras de Achille Mbembe, filósofo e politicólogo camaronense que tem obra publicada sobre as questões da negritude, os processos de colonização e descolonização e a História africana, numa perspectiva epistemológica que considere os contributos, as vozes e a diversidade africanas.

Mmembe esclarece os elementos constituintes dessa alteridade, que torna os africanos “human beings we perceive as foreign to us” (ibidem), considerando-os fundamentais para a auto-definição do Ocidente, por contraponto. “In several aspects, Africa still constitutes one of the metaphors through which the West represents the origin of its norms, develops a self-image, and integrates this image into the set of signifiers asserting what is supposed to be its identity” (ibidem).

Um dos aspectos dessa caracterização é a aproximação dos africanos à imagem de bestialidade/animalidade, conceito desenvolvido pela retórica colonial, numa empresa que se investiu também, simbólica e materialmente, de uma “missão civilizadora”. A esta ideia está associada a de brutalidade, liberdade sexual e morte, algo que não é possível sujeitar a uma ordem racional ocidental ou equacionar segundo o conceito de intimidade, portanto, incompreensível e inacessível (Mmembe, 2001: 2,3). Um dos eixos primordiais de representação da irracionalidade e da inacessibilidade do “africano” são as culturas ditas tradicionais, dominadas pela facticidade e arbitrariedade:

"By facticity is meant that, in Hegel’s words, “the thing is”; and it is merely because it is… and this simple imediacity constitutes the truth. In such case, there is nothing to justify; since things and institutions have always been there, there is no need to seek any other ground for them than the fact their being there. By arbitrariness is meant that, in contrast to the reason in the West, myth and fable are seen as what, in such societies, denote order and time. Since myth and fable are seen as expressing the very power of the originaire, nothing in these societies requires, as noted above, justification, and there is little place for other argument; it is enough to invoke the time of origins. Caught in a relation of pure immediacy, to the world an to themselves, such societies are incaple of uttering the universal” (Mbembe, 2001: 4)

Outra questão identificada por Mbembe no olhar ocidental sobre África é a ausência de individualidade, considerada uma invenção ocidental. Este argumento aplica-se à própria configuração geopolítica do continente, frequentemente ignorada e subsumida na palavra “África”, que assume uma unificação e homogeneidade distantes da realidade. A crítica sobre essa visão está patente, por exemplo, no blogue “Africa no Es um Pais”, do jornal espanhol El Pais, ou no site independente que transmite a mesma mensagem de forma irónica, designando-se Africa is a country. Em Portugal, o programa Próximo Futuro, da Fundação Calouste Gulbenkian, dedicado à investigação e criação não só, mas bastante, centradas em África, desempenha um papel relevante na desconstrução dos lugares-comuns sobre o continente.

Os argumentos de Mbembe não podem, pois, ser absolutizados, no sentido em que é possível, como se vê pelos exemplos referidos, encontrar focos, já com grande expressão, de pensamento e posicionamento no Ocidente que se distanciam das linhas narrativas e conceptuais dominantes sobre África que, no entanto, ainda subsistem no imaginário comum, nas perspectivas artísticas e curatoriais e em grande parte dos media.

No que diz respeito à representação da guerra e do sofrimento humano, considerar as ideias enunciadas por Mbembe é pertinente, por frequentemente nos chegarem explicações assentes no tribalismo, no caos, na confusão de nacionalidades, culturas e identidades, e na ausência de narrativas históricas ou outras dos próprios intervenientes. Acresce dizer que raramente estas perspectivas, ainda dominantes, são investidas de um pensamento auto-crítico que integre, numa lógica cidadã mais global e transtemporal, o peso da própria herança e intervenção do Ocidente em África nos conflitos contemporâneos, tanto ao nível do lastro da colonização, por exemplo, pela manipulação, desenraizamento e deslocação de populações locais, como na actualidade, por acções político-militares, de paz ou bélicas.

Afirma Sontag:

"Generally, the grievously injured bodies shown in published photographs are from Asia or Africa. This journalistic custom inherits the centuries old practice of exhibiting exotic – that is – colonized human beings: Africans and denizens of remote Asian countries were displayed like zoo animals in ethnological exhibitions mounted in London, Paris and other European capitals from the sixteenth until the early twentieth century. (…) The exhibition in photographs of cruelties inflicted on those with darker complexions continues this offering, oblivious to the considerations that deter such displays of our own victims of violence; for the other, even when not an enemy, is regarded only as someone to be seen, not someone who (like us) also sees" (Sontag, 2004: 65).

“The right to look”

Nicholas Mirzoeff, no artigo seminal “The right to look”, coloca em contraponto o direito de olhar e a visualidade, conceitos uteis para a análise aqui em questão. Por visualidade entende o autor o regime de visualização da História, definido por lugares de autoridade e interdição: “This ability to assemble a visualization manifests the authority of the visualizer” (474), autoridade essa que se constrói através de processos de classificação, separação e estetitização. Exemplifica o autor com um caso de racismo:

Think of Rosa Parks refusing to the back of the bus. I tis the dissensus with visuality, meaning “a dispute over what is visible as an element of a situation, over which visible elements belong to what is common, over the capacity of subjects to designate this common and argue for it” (Rancière, 2004:6). It is the performative claim of a right to look where none technically exists that puts a countervisuality on play” (Mirzoeff, 2011: 478)

Mirzoeff identifica três complexos de visualidade, em termos históricos, enquanto formas de organização social e do poder e respectivas figuras de controlo: o complexo da plantação e o capataz (1660-1865); o complexo imperial e o missionário (1857-1947); o complexo militar-industrial e o counterinsurgent (de 1945 até ao presente). Trata-se de sistemas simbólicos que indicam o domínio hegemónico de um certo parâmetro de visualidade vigente em épocas históricas, cujo lastro está presente na actualidade, e que pode ser exemplificado por todos os códigos relativos ao olhar nas relações de poder através dos tempos: o escravo que não podia olhar o senhor, a mulher que não devia olhar o marido nos olhos, o empregado que não dirige o olhar ao chefe, o prisioneiro de um campo de guerra que não pode encarar os seus guardas, os regimes de vigilância proporcionados pelas tecnologias que nos observam mas não podem ser observados, ou o que é transmitido ao público pelos media, de forma unidireccional, criando desta forma processos de hierarquização, domínio e controlo dos regimes de comunicação e representação. Contrapõe-se a estes regimes “the right to look”, ligado ao direito de existir, de afirmar uma subjectividade dentro de uma ordem estabelecida:

The right to look claims autonomy, not individualism or voyeurism, but the claim to a political subjectivity and collectivity (…) It is the claim to a subjectivity that has the autonomy of arrange the relations of the visible and the sayable. The right to look confronts the police who says to us: “move on, there is nothing to see here” (idem: 473, 474)

 Poder-se-ia afirmar que a visualidade, assim formulada por Mirzoeff, encontra paralelo nos “procedimentos de exclusão” do discurso, enunciados por Foucault, na sua Aula Inaugural do Collège de France, em Dezembro de 1970. Procedimentos “que têm por função esconjurar os seus poderes e perigos, dominar o acontecimento aleatório, esquivar a sua temível materialidade”. Destes, destaca-se aqui o interdito e o binómio razão/loucura. O interdito designa os temas sobre os quais não se pode falar, ou os códigos e circunstâncias sociais para o fazer e os sujeitos autorizados a tal.

Notaria apenas que, nos nossos dias, as regiões onde a grelha é mais cerrada, onde as casas negras se multiplicam, é a sexualidade e a política: como se o discurso, longe de ser esse elemento transparente ou neutro no qual a sexualidade se desarma e a política se pacifica, fosse um dos lugares onde elas exercem, de modo privilegiado, alguns dos mais temíveis poderes (Foucault, 1997: 10).

O binómio razão/loucura opera como outra forma de exclusão, em que o louco, historicamente, era a figura desautorizada, o que dizia não tinha valor simbólico, era desacreditado, embora às suas palavras fossem simultaneamente atribuídos poderes místicos de revelação, uma revelação indesejada e perigosa: “De qualquer modo, excluída ou secretamente investida pela razão, em sentido estrito ela [a palavra do louco] não existia. Era através das suas palavras que se reconhecia a loucura do louco; elas eram o lugar onde se exercia a distinção, mas nunca eram acolhidas ou escutadas” (ibid.: 11)

Extrapolando a figura histórica do louco, pode dizer-se que actualmente esta função é cumprida pelos discursos contracorrente em relação às ideias adquiridas e dominantes. Nomeadamente sobre África, são os discursos que possam desconstruir as ideias estruturantes de uma representação comum e partilhada, nos termos identificados por Mbembe. Ou face ao primeiro procedimento, a exclusão, será hoje a intervenção, nos circuitos com impacto global, os media ou a arte, de vozes antes desautorizadas, porque colonizadas, sem autonomia e sem História, logo sem identidade. 

De que forma os dois discursos artísticos, de Alfredo Jaar e de Pieter Hugo, reclamam “the right to look”, e uma quebra nos procedimentos de exclusão do discurso sobre África, e em particular, sobre o genocídio do Rwanda?

Untitled, de Alfredo Jaar

Alfredo Jaar é artista, arquitecto e cineasta, nascido em Santiago do Chile em 1965 e radicado nos Estados Unidos. Trabalha com vários meios, usando a palavra, o vídeo, a fotografia e frequentemente em formato de intervenção pública nas cidades, através de instalações. O trabalho de Jaar tem sido exibido em todo o mundo. Participou nas Bienais de Veneza (1986, 2007, 2009, 2013), São Paulo (1987, 1989, 2010), bem como na Documenta de Kassel (1987, 2002). A sua obra pode ser encontrada nas colecções do Museu de Arte Moderna e Museu Guggenheim, em Nova Iorque, no MCA, Chicago, MOCA e LACMA, Los Angeles, Tate, Londres, Centro Georges Pompidou, Paris, Centro Reina Sofia, Madrid, do Moderna Museet, Estocolmo, o Museu Louisiana de Arte Moderna de Humlaebeck e dezenas de outras instituições e colecções privadas em todo o mundo. Aborda questões relacionadas com a geopolítica, a guerra, a representação mediática, com uma visão crítica sobre os poderes mundialmente estabelecidos.

O genocídio do Ruanda, país a que se deslocou na época, foi um dos temas mais extensamente tratados na sua obra, tendo o designado Rwanda Project, composto por vários trabalhos[1], ocupado o artista entre 1994 e 2000. O trabalho Untitled consiste em 17 fotografias de capas da revista americana Newsweek, entre 6 de Abril e 1 de Agosto de 1994, cada uma acompanhada de um breve texto onde se descrevem os acontecimentos no Rwanda na respectiva semana. Esteve exposto em diversos locais, entre os quais Goodman Gallery, em Joanesburgo, Galerie Lelong, em Nova Iorque; kamel mennour, em Paris e Galerie Thomas Schulte, em Berlim. Untitled está disponível online, aqui 

[1] A título de exemplo, referimos Rwanda, Rwanda, uma instalação em moopies em ruas de uma cidade sueca apenas com a palavra Rwanda, e The silence of Nduwayezu, centrado na história pessoal de uma criança sobrevivente e órfã, com fotos apenas dele, em exposições em vários locais.

Imagem 1: Exposição Untitled, Alfredo Jaar

O primeiro aspecto que Jaar torna evidente neste trabalho é a invisibilidade da tragédia do Ruanda durante 17 semanas num dos mais importantes órgãos de comunicação social americano. A primeira capa que destaca o acontecimento data de 1 de Agosto. É também a primeira vez que o texto do artista apenas destaca esse facto e nenhum dado sobre o Ruanda. Nas semanas anteriores, os temas mais variados merecem destaque de capa, desde política a celebridades, passando por casos de tribunal e descobertas científicas. Ao lado destas capas, um texto telegráfico dá conta, sempre, do número total de mortes no Rwanda a cada semana e também da questão da intervenção internacional no conflito, nomeadamente as respectivas negociações para a definição e autorização do número de elementos da força de manutenção de paz da ONU, os capacetes azuis, contingente reduzido drasticamente na primeira semana do genocído e apenas reforçado na última. Vejamos alguns exemplos:

Na semana de 12 de Abril, a capa da Newsweek destaca o suicídio de Kurt Cobain, vocalista da banda Nirvana. O texto dá conta da constituição de um governo interino no Rwanda, após a morte do presidente no desastre de avião que despoletou uma semana antes, as matanças, já num total de 25 mil mortos. A primeira referência de Jaar à redução drástica de capacetes azuis no território, de 2500 para 270, refere-se à semana de 21 de Abril, em que a Newsweek destaca descobertas na indústria farmacêutica na área das vitaminas. Quando os mortos atingem a impressionante soma de 100 mil, a capa da Newsweek é dedicada à morte do ex-presidente americano Richard Nixon sem qualquer referência ao Ruanda. Noutra semana, uma efeméride ocupa lugar de destaque na revista: o Dia D (chegada à Normandia das tropas Aliadas na II Guerra Mundial), na mesma semana em que a Frente Patriótica Ruandesa ganha o controlo da capital e os mortos ultrapassam os 300 mil. O tema especulativo da possibilidade de vida em Marte é a chamada de capa a 21 de Julho: o texto informa que as Nações Unidas chegam a um acordo para enviar reforços da força de paz internacional, quando os mortos se estimam já em um milhão. É talvez um dos casos em que a desvalorização daquelas vidas humanas, a que se sobrepõe uma realidade hipotética de existência noutro planeta, se torna mais evidente. O único destaque a um acontecimento africano é a eleição de Nelson Mandela na África do Sul, na semana de 8 de Maio, sem qualquer referência de capa à tragédia que tolhera já, então, 200 mil vidas no Ruanda. Mandela, embora simbolize, por excelência, a afirmação de uma identidade africana pós-colonial e um projecto de nação construída pelos próprios, é, nesta altura, já um consenso internacional, depois de uma história complexa que inclui violações dos direitos humanos sem que tivessem sido por isso visibilizado nos media ocidentais, considerações que não cabe detalhar aqui.

O trabalho de Jaar constitui uma crítica feroz à indiferença da revista perante uma das maiores tragédias do século XX. Desta forma, Jaar dirige o seu olhar, e o do seu público, a um dos principais eixos de constituição do complexo de visualidade contemporâneo, nos termos enunciados por Mirzoeff: os media. Evidenciando simplesmente o contraste gritante entre os destaques de capa da Newsweek e os acontecimentos no terreno, e dada a dimensão avassaladora dos factos, Jaar sublinha a desconsideração desta revista pelos ruandeses comos seres humanos, reforçando os aspectos teorizados por Mbembe de que, aos olhos do ocidente, se trata de uma “otherness” radical o que, em termos humanistas e cidadãos, afirma como intolerável na era da globalização. Por outro lado, chama a atenção para os factos que a revista invisibilizou, reclamando “the right to look” para a realidade do Rwanda, a dimensão humana da tragédia, e para a responsabilidade da comunidade internacional, cujo apoio chegou apenas no rescaldo do genocídio. O facto de não recorrer a imagens para o fazer, mas apenas à linguagem verbal, dá uma força discursiva à sua obra que recusa a exploração de fotografias que poderiam incorrer naquilo que Sontag identifica como o lastro da estética colonial no fotojornalismo moderno, com uma exposição da morte e dos corpos excessiva. Como sintetiza o curador brasileiro Moacir dos Anjos, na sua análise desta obra:

Alfredo Jaar contribui para a criação de uma representação alternativa desse mesmo mundo, contrapondo-se àquelas que ignoram os já excluídos de outras esferas da vida, como a feita pela revista. Contribui, em tarefa partilhada com vários outros artistas, para a criação de uma representação das sobras. Representação contra-hegemônica que aponta e rememora os radicalmente excluídos dos espaços de visibilidade social pela dinâmica política que move o mundo, reclamando para estes a condição de parte (dos Anjos, 2014).

Vestiges of a Genocide e Portraits of Reconciliation de Pieter Hugo

Pieter Hugo nasceu em Joanesburgo, África do Sul, em 1976, vive e trabalha na Cidade do Cabo.  O seu trabalho fotográfico já foi exposto no Hague Museum of Photography, Musée de l’Elysée em Lausanne, Ludwig Museum em Budapeste, Fotografiska em Estocolmo, em  Roma, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, Fondation Cartier Bresson em Paris, na Stevenson Gallery, Cidade do Cabo e na Tate em Londres, entre outros. A sua obra integra as colecções do Museum of Modern Art, V&A Museum, San Francisco Museum of Modern Art, Metropolitan Museum of Modern Art, J Paul Getty Museum, Walther Collection, Deutsche Börse Group, Folkwang Museum and Huis Marseille. Recebeu o Discovery Award, Rencontres d’Arles Festival e o KLM Paul Huf Award em 2008, e ainda o Seydou Keita Award nos Rencontres de Bamako African Photography Biennial, em 2011. Entre os seus trabalhos destacam-se as séries Nollywood, The Hyena and Another Men e This Must be the Place. Sul-africano branco, Pieter Hugo reflecte na sua obra sobre as tensões raciais, diversas formas de exclusão (por exemplo na sua série dedicada aos albinos africanos, The Albino Project), fenómenos urbanos e a intimidade das casas e das relações humanas, na sua imensa diversidade.

Sobre o genocídio do Rwanda, Pieter Hugo tem dois trabalhos, com dez anos de intervalo, no décimo e vigésimo aniversário dos trágicos acontecimentos. Rwanda 2004: Vestiges of a Genocide, de 2004, e Portraits of Reconciliation (2014).

O primeiro, Vestiges of a Genocide é composto por uma série de fotografias dos lastros que encontrou, dez anos após o genocídio, no território, marcas intactas das vidas ceifadas pelo conflito: ossadas, roupas, pinturas de parede vandalizadas, sepulturas colectivas.

Algumas imagens da série disponível aqui

Imagem 2: Roupas de vítimas encontradas na Murambi Technical School onde 50 000 foram assassinadas por milicias Hutu , Murambi

Imagem 3: Cadáveres conservados, encontrados em Murambi Technical College, Murambi, Rwanda, II

Imagem 4: Cabeleireiro/barbearia, pinturas de parede degradadas por milicias hutu, La Mignore, Kigali, Rwanda, I

Imagem 5: Vala comum, Nzega Cell, Gasaka Sector, Rwanda

Gostaríamos de destacar alguns aspectos destas imagens. Não há presença de vida em nenhuma delas, o que acentua por um lado a ideia de morte absoluta e, por outro, a dificuldade em integrar vida na memória de uma tragédia de tamanhas proporções. Fica evidente, também, que muitos destes vestígios não foram removidos, que estão entre a sociedade ruandense, visíveis, como uma chaga aberta, afastando a hipótese, benévola, de que este passado estaria enterrado, dez anos depois.  Ainda, as ossadas e as roupas, na sua despersonalização, apelam a uma ideia de humanidade universal, aproximando qualquer espectador daqueles vestígios. A imagem da sepultura colectiva mostra uma cruz, o que liga aqueles mortos a todo o mundo cristão. As pinturas de parede vandalizadas colocam a questão do olhar, pois são precisamente os olhos que estão amputados na pintura, como forma extrema de retirar a um grupo o poder de existir socialmente.

Esta série produz o efeito de colocar no centro do protagonismo os mortos, os que não podem já falar, os que não puderam, então, falar, portanto, os excluídos, de forma colectiva e indiferenciada. Reclama o direito de lhes dar voz. Recentra o olhar, trazendo-o do conforto retrospectivo da memória para o presente da tragédia, ao mostrar os remanescentes do momento. Em termos do enunciado de Foucault, Pieter Hugo inverte o interdito e questiona a loucura que parte do discurso público mundial atribuiu a este conflito, situando-o em valores religiosos partilhados por milhões de pessoas em todo o globo. Questiona o regime de visualidade mediático que expôs os horrores, apenas no momento em que ocorreram, na lógica estrita da actualidade, colocando em evidência a permanência de uma dor colectiva que atravessou um país, com consequências a longo prazo. Neste caso, a expressão artística fotográfica, sem recurso a palavras, evidencia o inexpressável. Numa entrevista ao jornal The Guardian, em 2009, Pieter Hugo afirmou que estas fotografias focam “that which we do not want to look at”, e expressou também as suas reservas quanto ao seu poder representativo: “I have a deep suspicion of photography, to the point where I sometimes think it cannot accurately portray anything, really.”

A segunda série aqui considerada, Portraits of Reconciliation, foi realizada em 2014, vinte anos depois do genocídio, e são retratos de duplas de perpetrador/vítima, pessoas integradas no programa de reconciliação da organização sem fins lucrativos Association Modeste et Innocent. Foram expostas em outdoors em Haia, na Holanda, numa iniciativa da organização Creative Court para assinalar os vinte anos do genocídio. Um conjunto de fotografias foi publicado no New York Times, acompanhado de testemunhos dos próprios intervenientes.

Algumas imagens, do New York Times, disponíveis aqui

Imagem 7: Deogratias Habyarimana, Perpetrator (direita), Cesarie Mukabutera, Survivor (esquerda). O presidente Kigame apelou aos condenados do genocídio para pedirem perdão às vítimas, com efeitos de redução da pena. Confessou à vítima ter participado no assassinato dos seus filhos, facto que esta desconhecia.

Jean Pierre Karenzi, perpetrator (esquerda),Viviane Nyiramana, Survivor (direita). Matou-lhe o pai e os irmãos. Cumpriu pena na prisão e frequentou um programa de unidade e reconciliação. Pediu perdão e ajudou a reconstruir a casa.

Este trabalho de Pieter Hugo está enquadrado numa iniciativa local com contornos específicos, que promoveu a reconciliação entre vítimas e perpetradores. As imagens resultam, portanto, de um processo onde há intervenientes externos e são retratos em pose de duas pessoas que, normalmente, não se juntariam. Poder-se-ia dizer que são portanto imagens produzidas ou artificiais e são-no, em certa medida, não deixando no entanto de registar um acontecimento real e muito significativo, a aproximação, ainda que temporária e variavelmente profunda, entre pólos opostos de um conflito marcado por um genocídio de grandes dimensões.

O primeiro aspecto a destacar é que esta série contraria, de forma expressiva, a imagem de negatividade que paira sobre o continente, mostrando uma faceta de paz e reconstrução. Opõe-se à narrativa dominante de um continente em guerra permanente, mostrando diacronicamente a evolução de um processo. O processo de reconciliação é dado, exclusivamente, pelos protagonistas, que se apresentam numa certa simplicidade, digna, activa, de aparente bem-estar físico, em alguns casos com expressões de afectividade, sem qualquer contexto estatal ou oficial, nacional ou internacional. Mais uma vez, à semelhança do que acontece na série Vestiges of the genocide, estas imagens apelam a um sentido de humanidade universal: as pessoas, simplesmente, desenquadradas de instituições ou símbolos. No entanto, esta série individualiza casos e a sua força expressiva resulta da singularização.

Considerações finais

Ambos os artistas afirmam “the right to look” sobre o genocídio do Ruanda: no caso de Alfredo Jaar, por uma crítica à imprensa e à política ocidental sobre África, focando-se num caso extremo de invisibilidade do acontecimento, dando simultaneamente, na mesma obra, a dimensão da tragédia e da imobilidade internacional; no caso de Pieter Hugo, por construir uma representação do genocídio, em dois momentos, que destaca não só a dimensão dos factos e a sua gravidade humanitária, mas também enfatiza a universalidade do drama e devolve ao território e aos seus cidadãos o protagonismo e a subjectividade, sem recorrer a qualquer exploração estética do horror, optando antes por imagens sóbrias, até belas, que não deixam de passar uma mensagem fundamental sobre um acontecimento que a todos, globalmente, interpela. Os artistas recusam, os dois, os mecanismos de exclusão do discurso enunciados por Foucault, de forma expressiva.

Ambos os artistas questionam pois, uma noção de humanidade e um espectro de valorização dos eventos, centrados na perspectiva ocidental do mundo, colocando o Rwanda no mapa mental de um público que - pelo prestígio e reconhecimento alcançados com as suas obras e entrada nos principais circuitos da arte mundial - é essencialmente estrangeiro à tragédia do Rwanda. Retomando a noção inicialmente proposta para esta Summer School, “cultural citizenship”, entendida como “a roadmap to the future, couched in the claim of a new civil contract sponsered by the arts”, pode afirmar-se que Alfredo Jaar e Pieter Hugo contribuem, no que diz respeito ao genocídio do Ruanda, para uma visão mais global sobre um conflito predominantemente lido à luz de lugares-comuns que apenas promovem distanciamento.

Susan Sontag, na obra citada, reflecte criticamente sobre outra obra sua, On Photography, onde defendeu que o excesso de imagens no mundo moderno pode promover empatia mas também apatia. Pergunta-se, posteriormente, sobre a validade deste pressuposto.

"That we are not totally transformed, that we can turn away, turn the page, switch the channel, does not impugn the ethical value of an assault of images. It is not a defect that we are not seared that we do not suffer enough, when we see that images. Neither is the photograph supposed to repair our ignorance about history and causes of the suffering it pick out and frames. Such images cannot be more than an invitation to pay attention, to reflect, to learn, to examine the rationalizations for mass suffering offered by established powers. What caused what the picture shows? Who is responsible? It is excusable? Was it inevitable? Is there some state of affairs accepted up to now that ought to be challenged? All this, with the understanding that moral indignation, like compassion, cannot dictate a course of action" (Sontag, 2003: 104).

Reconhecendo assim que o campo da representação não é, de todo, coincidente com o campo de acção (embora o possa afectar), a ensaísta pondera no entanto o problema das imagens do sofrimento longe da simples diabolização da fotografia, valorizando o potencial de reflexão aberta por esta. E acrescentaríamos: se noutros âmbitos, como o da produção mediática, os códigos e as velocidades condicionam essa produção de forma mais estrita, estando também sujeita mais facilmente às lógicas hegemónicas, talvez a arte, na criação de imagens ou na sua crítica, possa trazer um contributo efectivo, em termos de cidadania, não só para pensarmos tragédias como o genocídio do Rwanda mas também para sermos capazes de nos relacionarmos de forma mais ética com as próprias imagens. 

Bienal de Havana 2015

Published1 Jul 2015

Tags Bienal de Havana cuba

A Bienal de Havana 2015 decorreu de 22 de Maio a 22 de Junho, subordinada ao tema "Entre la Idea y la Experiencia", apresentando trabalhos de artistas de 40 países. Pode ler-se na proposta curatorial:

El arte ha trascendido las limitaciones epistemológicas inherentes a otras disciplinas, su condición simbólica le permite determinadas licencias a la hora de imbricar saberes. Por eso, más que nombrar las prácticas, nos interesa acompañar procesos de creación transdisciplinarios y de intermediación que impliquen colaboraciones tanto investigativas como de carácter pedagógico.

Sigue siendo hoy un ejercicio estéril instaurar conceptos preconcebidos de lo que entendemos por arte. La percepción colectiva se transforma en los desafíos y las incertidumbres que genera la experiencia; donde se abren nuevos horizontes culturales y se crean otras maneras de sociabilidad y de interconexión. Los proyectos que se realicen en La Habana deberán incidir en sus moradores bien sea porque estos participen en su concepción y realización o porque las obras se presenten como laboratorio social vivo. Deseamos que las diversas escalas del tejido urbano: las universidades, los centros de investigación y todo aquello que haga posible la integración, puedan utilizarse como emplazamiento y material de trabajo.

Al tomar como referencia esta proyección estamos interesados en propiciar las intersecciones entre diferentes expresiones artísticas como la danza, el teatro, la música, el cine y la literatura, a partir de la riqueza semántica que aporta la hibridez en aquello que entendemos como visualidad. La idea esencial es que estos cruces no sean un simple telón de fondo sino que adquieran una presencia protagónica. De ahí nuestro interés en extender una invitación para la confluencia de artistas y especialistas de otras disciplinas.

Texto completo aqui

Explorando o processo de colaboração e interdisciplinaridade, a Bienal  ocupou a cidade, transformando-a numa galeria de arte a céu aberto, com obras em cinemas, praças, parques, museus e esquinas, como se pode ver na galeria fotográfica do Jornal El Pais.

Cartografia e realidade

Published30 Jun 2015

Tags Cartografia África

Carla Lois é formada em Geografía, doutorada em Historia (UBA), e autora do livro Mapas para la Nación (Editorial Biblos). No ensaio publicado na revista N, da Clarín, reflecte sobre a relação entre cartografia e realidade, ao longo da História, retomando as primeiras incursões de ocidentais pelo continente africano e as representações que produziram

Cada tanto aparece alguna noticia que nos empuja, contra nuestra propia voluntad, a desconfiar de los mapas. Hace poco más de un año, nos enterábamos de que la isla Sandy en el mar del Coral que aparecía en los mapas en realidad no existe, aunque su “foto” aparezca en el aparentemente infalible Google Earth (no hay registros de ellas en ningún mapa del siglo pasado ni tampoco en los actuales mapas oficiales de Francia, en cuya jurisdicción se emplazaría esta misteriosa isla). Aun así, seguimos mirando los mapas como espejos de lugares que no conocemos pero que seguramente existen.

El mundo geográfico es cambiante. Es cierto que algunas islas pueden aparecer y otras, en cambio, desaparecer. O que las montañas disminuyen su altura. O que los ríos modifican su curso y, por tanto, su diseño sobre los mapas. Pero la variabilidad de los mapas no se debe solamente a la inevitable necesidad de actualizarlos para registrar esos cambios físicos. Los mapas también representan geografías dadas por ciertas: hasta que David Livingstone y Henry Morton Stanley se aventuraron al corazón de Africa para descubrir que la fuente del río Nilo es el lago Victoria, los mapas incluían los célebres Montes de la Luna, indicando que eran las montañas que daban al Nilo.

El célebre caso de Livingstone y Stanley no fue una excepción. James Rennel (1742-1830), uno de los fundadores de la Royal Geographical Society, dibujó una cadena montañosa que atravesaba el continente africano siguiendo el curso del río Níger. Aunque nunca había visitado esas zonas, se atrevió a cartografiar temerariamente semejante cordillera inspirado tanto en la descripción que Mungo Park reunía en su libro Viajes a los interiores de Africa , así como en leyendas consagradas (entre ellos, la del geógrafo hispano-árabe del siglo XV, León el Africano) y diversas fuentes de la época. La cadena orográfica de Rennel bautizada con el nombre de Gebirge Kong fue reproducida en más de cuarenta atlas publicados entre 1798 y 1892. Hasta que, en 1889, la audiencia de la Sociedad Geográfica de París escuchaba atentamente la conferencia del oficial francés Louis-Gustave Binger cuando anunció que, luego de haberse internado en el corazón del continente africano hasta Bamako (actual Mali) y llegado hasta la supuesta localización del Gebirge Kong, confirmó que “en el horizonte ¡ni siquiera se veían colinas!”. A pesar de esta contundente demostración, los montes Kong permanecieron todavía un tiempo más en los mapas hasta desaparecer del todo, salir de los mapas y pasar a la historia de los tantos mitos geográficos.

O texto completo em Mapas imaginarios de mundos reales

A história do Congo e a pintura

Published29 Jun 2015

Tags congo pintura

Imagem: Conflit Kasavubu-Kumumba-Tshibumba Kanda-Matulu

A exposição 53 ECHOES OF ZAIRE: POPULAR PAINTING FROM LUBUMBASHI  junta obras de T. Kalema, C. Mutombo, B. Ilunga, Ndaie, e Tshibumba Kanda Matulu. que, através da sua obra, reflectem sobre a História do país, desde o período colonial, em exibição em Londres até final do mês. Na Contemporary and, a critica de arte sul africana Liese Van Der Watt faz a análise:

History is of course never “just a story,” and the extraordinary exhibition 53 Echoes of Zaire that just opened in London, showing some of these paintings by Kanda Matulu and four other painters from the Congo, makes very clear that these painters’ version of history is indeed an emotive, impassioned plea to tell their side of the story, to insert narratives into the vacuum left by official versions of history that circulated at the time.

The exhibition was curated by Salimata Diop from the Africa Centre in London in cooperation with the Sulger-Buel Lovell gallery. It comprises 53 paintings by artists Louis Kalema,  C. Mutombo,  B. Ilunga,  Ndaie, and  Tshibumba Kanda Matulu, belonging to the Belgian collector Etienne Bol whose late father Victor Bol collected these works while spending time in Zaire in the 1970s.

The artists are all self-taught and the exhibition shows a series of works all executed in a style similar to what is sometimes called the Zaire School of Popular Painting. The most famous of this so-called school is probably Chéri Samba, who shot to fame after he was included in the Magiciens de la Terre (Magicians of Earth) show at the Pompidou in 1989. These works are painted on flour sack rather than canvas, often with a limited palette of poster paints and with thick brushes. But whereas Samba and his colleagues from Kinshasa tend to record everyday events, the works on the current show are all from painters around Lubumbashi, in the south, with a focus on historical topics. This is probably as much the result of the collector’s keen eye as anything else – the catalogue tells us that these works were made for a local audience and were mostly sold to local people, so one may surmise that these artists probably also painted genre paintings for a local clientele.

O artigo completo, aqui

"The story of my life": Alejandro Zambra

Published25 Jun 2015

Tags Literatura América Latina Alejandro Zambra

Illustração de ALVARO TAPIA HIDALGO; REFERENCE: ALMA RODRÍGUEZ AYALA / AGENCIA EL UNIVERSAL / AP

Alejandro Zambra (Santiago, 1975) é considerado uma das mais relevantes vozes da actual literatura chilena. Foi convidado do Próximo Futuro, e esteve presente na Festa da Literatura e do Pensamento da América Latina em 2014, ano da primeira tradução em Portugal: Maneiras de Voltar para Casa (Divina Comédia, tradução de Pedro Tamen). James Wood, na revista New Yorker, apresentou recentemente uma leitura crítica da sua obra.

Zambra’s breakthrough occurred with his third novel, “Ways of Going Home” (2011; published here in 2013, in Megan McDowell’s sparkling translation), which seems a different order of achievement from his earlier work. Here, at last, Zambra’s authorial self-consciousness, his reflections on the perils and pleasures of fiction-making, finds a theme that gives it moral gravity and not just formal ingenuity. The novel begins with some of the charm and joyousness of “My Documents.” A nine-year-old boy in a suburb of Santiago witnesses the earthquake of March 3, 1985. He is afraid, but he also enjoys the new excitements on the street—the grownups gathered around a fire, the kids put in tents for the night. The boy notices Claudia, a twelve-year-old girl; a couple of years later, they become friends. Claudia is interesting for several reasons, one of them being that she has an uncle, Raúl, who lives alone: “Raúl was the only person in the neighborhood who lived alone. It was hard for me to understand how someone could live alone. I thought that being alone was a kind of punishment or disease.” Mysteriously, Claudia asks the boy to spy on her uncle, who is rumored to be a Communist: “To me, a Communist was someone who read the newspaper and silently bore the mockery of others—I thought of my grandfather, my father’s father, who was always reading the newspaper. Once I asked him if he read the whole thing, and the old man answered that yes, when it came to the newspaper you had to read it all.” The boy later discovers that Raúl is in fact not Claudia’s uncle but her father, Roberto, a left-wing activist who has been living under a new identity in order to escape the dictatorship’s scrutiny.

In the novel’s second section, the narrator is the writer of the story we have just read in the novel’s first section; and Zambra’s book proceeds like this, the fiction about Claudia and Raúl/Roberto alternating with sections narrated by a man who is writing those very fictions. But what might have been dryly self-involved steadily opens out into Chilean history and political reality. This man, this writer, is trying to come to a reckoning with recent political events, and with the knowledge that his parents were politically quietist (and possibly right-leaning) during the Pinochet years. He has searing memories from his childhood. When he was thirteen, he became aware for the first time that his schoolmates included the children of murdered and tortured parents, and of murderers, too. One day, when he was sixteen, the police chased some thieves into the school’s parking lot and fired shots. The class’s history teacher started crying and hid under the table. “He slowly managed to calm down as we explained to him that no, the military had not taken over again. . . . Of course I knew, we all knew; he had been tortured and his cousin was taken prisoner and disappeared.” The teacher asks the boy about his parents, and the boy replies that during the Pinochet years they “kept to the sidelines.” The teacher seems to look at the boy with curiosity and disdain.

O artigo completo em Story of My Life: The fictions of Alejandro Zambra

40 anos de independência de Moçambique

Published25 Jun 2015

Tags 40 anos independência Moçambique

Comemoram-se hoje 40 anos de independência de Moçambique. O Jornal Público indaga as mudanças no país, numa reportagem que percorre o dia-a-dia de Maputo e escuta a opinião de historiadores, economistas, políticos, advogados, escritores e jornalistas. 

É fim de dia e Chapane Mutiua, historiador e professor na UEM, especializado no Islão, acaba de falar sobre a sua própria história num dos bares da universidade. É o mais novo de quatro irmãos e o primeiro da família a entrar na universidade.

Nasceu em 1976, um ano depois da independência de Moçambique, numa altura em que a taxa de analfabetismo era das mais altas do mundo (93% em 1975), só havia uma universidade e o número de estudantes universitários era reduzido. Quarenta anos depois, Moçambique tem cerca de 50 instituições de ensino superior, entre públicas e privadas, quase 100 mil matriculados e mais de sete mil graduados (dados Ministério de Educação de 2013).

A democratização da educação é um dos “orgulhos” dos moçambicanos. Conseguiu-se diminuir a taxa de analfabetismo, embora ainda continue a ser das mais altas, com mais de 40%.      

Antes de 1975, o normal era não ir à escola. Por isso o pai de Chapane Mutiua, que nunca estudou, tornou-se “uma pessoa chave” ao incentivá-lo a estudar. Foi o irmão mais velho, professor, quem o ajudou a financiar a escola, a matriculá-lo, a comprar os cadernos. Aos 14/16 anos, Chapane Mutiua teve de se desenvencilhar porque as terras do pai estavam perdidas por causa da guerra civil (1977-1992). Já não havia posses na família. “Uma das coisas que me fez pensar que tinha que fazer negócios foi quando o meu pai teve que cortar as calças compridas para que fosse entregar a um alfaiate e fazer calções para nós” (ele e irmãos).

O texto completo em "No país dos 'my love' ainda não se chegou totalmente à paz

Filinto Elísio: "Torpor da nova poética cabo-verdiana"

 

O encontro sobre Literatura Mundo, no Observatório do Próximo Futuro, amanhã, está inserido na quinta edição da escola de verão do Institute of World Literature, com sede na Universidade de Harvard, que decorre na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa entre 22 de Junho e 16 de Julho. Filinto Elísio será o orador principal da sessão na Fundação Calouste Gulbenkian, com a conferência World Literature and métissage”, aque se segue um painel de debate sobre o tema “The Global Novel and the Novel in a Global World”, com vários investigadores internacionais.

Filinto Elísio nasceu em Cabo Verde, em 1961. Poeta e novelista, publicou Do lado de cá da rosa (poesia), O inferno do riso (poesia), Prato do dia (crónicas), Das frutas serenadas (poesia), Das Hespérides (fotografia, poesia, narrativa), Cabo Verde: 30 anos de cultura (ensaio), Li cores & ad vinhos (poesia), Outros sais da beira-mar (novela) and Me_xendo no Baú. Vasculhando o U (poesia). É co-fundador e membro da Academia de Escritores Cabo-verdianos. Mantém uma coluna de opinião em “Diário de Notícias da Madeira” (Portugal), “A Nação” (Cabo Verde) e “Ponto Final” (Macau), sendo ainda editor em Rosa de Porcelana. Trabalhou como conselheiro do Primeiro Ministro de Cabo Verde e é vice-presidente da Multilingual Schools Foundation, especialista internacional na Multilingual School da Guiné Equatorial e presidente da Assembleia Geral Pró-Praia (ONG). 

No site Buala, o autor publicou o texto "Torpor da nova poética cabo-verdiana", na sequência de um encontro no Museu de São Roque, em 2011:

 

Participar da reflexão e do diálogo em torno da produção cultural africana na contemporaneidade, em particular nos países de língua oficial portuguesa, constitui uma forma de darmos o nosso modesto contributo para o problematizar à luz das outras culturas do Mundo, nomeadamente, quando por indicação do presente enfoque, das Culturas de matriz Ocidental.

Cientes de que os encontros não são inocentes, nem derivam de insólitos, mas sim resultantes de opções e de escolhas, pelo que afirmam produções de pensares e de saberes em prol de causas e de objectivos pré definidos. Por conseguinte, o apelo do Museu de São Roque para que reflictamos e debatamos Africanidades, suas correlações e articulações - abrindo espaço para que, no vaticínio de Amílcar Cabral, o possamos fazer com as nossas próprias cabeças -, é importante, relevante e consequente. Este apelo vem resignificar, de forma muito particular e assertiva, a razão efectiva (e não inocente, repita-se) de estarmos aqui e agora neste encontro.

Perante temática tão vasta quão caudalosa, guardarei as minhas margens pela literatura cabo-verdiana, onde me encontro, com ressalva de escritor, puro esteta se preferirem, e não como estudioso, campo de labor de personalidades como Simone Caputo Gomes, Alberto Carvalho, Elsa Rodrigues, José Luís Pires Laranjeira, Fátima Fernandes, Benjamin Abdala Jr., João Lopes Filho, Manuel Brito-Semedo, Ricardo Riso e José Luís Hopffer Almada, entre vários outros pesquisadores, estudiosos e ensaístas que tanto admiro. A mesma admiração que em mim percorrem os textos críticos sobre as letras cabo-verdianas de Jaime de Figueiredo, Amílcar Cabral, Manuel Duarte, Onésimo Silveira e Manuel Ferreira, sobre outros prismas e por outas temporalidades.

Não sendo apologista de classificar a Literatura Cabo-verdiana pelo viés cronológico, nem acreditando haver suficiente virtude que a literatura em Cabo Verde esteja estratificada em três grandes períodos – pré-Claridoso, Claridoso e Pós Claridoso -, quero crer que há outras e múltiplas formas de olhar esta produção literária que, há mais de dois séculos, tem vindo a marcar o seu espaço no contexto da lusofonia e que, desde a Independência Nacional, há pouco mais de trinta e seis anos, se densifica por produções mais modernistas e mais «aggiornadas» com as letras de recorte universalista.

O artigo completo, aqui

"Branco sai, Preto Fica", no El Pais


Branco Sai, Preto Fica, de Adirley Queirós, mostra-se hoje na Cinemateca do Próximo Futuro. Filme premiado e presente em vários festivais internacionais, parte de um evento real e junta-lhe elementos de ficção científica. O El Pais escreveu sobre o filme. 

O futuro chegou, e – pelo menos no Brasil - ele é mais próximo do lixão tecnológico que se tornou a Terra quando os humanos a deixaram para construir um planeta ‘ideal’ em Wall-E, na visão do cineasta Adirley Queirós. Em seu filme Branco sai, preto fica, que estreou nesta quinta-feira em salas brasileiras, há uma mistura de documentário e ficção científica, potente e complexa mesmo para um adulto ilustrado, que denuncia com criatividade e irreverência a atitude criminosa do Estado brasileiro contra os negros e marginalizados partindo de um crime específico em Brasília.

Aconteceu em 26 de março de 1986 em Ceilândia, na periferia da capital. Dois jovens negros e alegres frequentam um baile black, o Quarentão, onde exibem seus passinhos inventivos junto a uma rapaziada cativa. Certo dia, a polícia chega com cavalos e até helicópteros e avança contra tudo e todos, investindo contra os dois meninos (e outros tantos) sem dar explicações. Eles são Marquim, que ficou aleijado e vive preso a uma cadeira de rodas, e Sartrana, que teve uma perna amputada e caminha com uma prótese. Ambos viveram para contar, ou melhor, para atuar em sua própria história.

Seu título, explicado logo no início do filme, diz respeito à ordem dos policiais quando invadem o Quarentão repartindo violência: “Puta prum lado e veado pro outro! (...) Tô falando que branco pra fora e preto aqui dentro! Branco sai e preto fica, porra!”. Eram os anos 80, mas podia perfeitamente ser o presente.

O relato, verídico, é resgatado em cenas ficcionais com depoimentos reais dos ex-dançarinos atores e, além disso, temperado com a inclusão de um terceiro personagem na história: Dimas Cravalanças, que chegou do ano de 2073 para recolher provas contra o Estado criminoso. É aí que toma forma a ficção científica, acrescentando um humor fino e crítico ao filme – que só por resgatar um episódio absurdo como o do Quarentão já valeria o ingresso, mas, ao recusar a possível dureza de um documentário e o tom piegas em que ele facilmente poderia mergulhar, se faz muito mais relevante.

O longa-metragem venceu onze prêmios no Festival de Brasília de 2014, entre eles o de melhor filme, e foi selecionado por vários festivais internacionais. Não é por menos: da paisagem de feiura ímpar de Ceilândia – escura, suja, enferrujada e incompleta, como um mal esboço de si mesma – às gírias nas falas dos personagens, tudo contribui para criar um pacto firme entre o filme e o espectador. E, em águas mais profundas, proporciona um fácil paralelo com temas tão em pauta no Brasil de hoje, como a violência policial, o racismo e a nossa frágil democracia, tão contaminada pela corrupção.

O artigo completo e uma entrevista com o realizador aqui  

"A cor que caiu do céu", em estreia no Próximo Futuro

Sergio Wolf nasceu em Buenos Aires em 1963. Crítico, docente, argumentista e realizador cinematográfico. Foi juri de festivais internacionais de cinema em Los Angeles, Gijón, Montreal, Gramado e Valdivia. É o realizador da longa metragem que estreia hoje na 2ª sessão da Cinemateca do Próximo Futuro, dedicada a filmes de Ficção Científica de África e América Latina, El Color que cayó del cielo (A Cor que Caiu do Céu), de 2014: um documentário em torno dos caçadores de meteoros, numa viagem a partir de Campo del Cielo, na Argentina, até Pittsburgh e Tucson, nos Estados Unidos, que é também a descoberta da sabedoria indígenas, de mitos, lendas e figuras deste universo. 

Un meteorito ha caído en la provincia de El Chaco, en Argentina, en la zona de Campo del Cielo. A partir de esa premisa, Sergio Wolf encontró una historia extraordinaria. Tan extraordinaria que, si uno la cuenta, nadie la creería. Pero para eso está el documental: para rescatar historias desconocidas y, al mismo tiempo, sorprendentes. Eso es lo que nos presenta “El color que cayó del cielo”, segundo documental del cineasta y crítico de cine argentino.

¿Cómo descubrió Wolf el proyecto? “El que terminó siendo el productor ejecutivo del filme me contó unas líneas, y ahí se dibujó un documental”, comenta el realizador, quien está en Lima para presentar su película. “En mi caso, siempre aparece un documental narrativo. Me interesa la excavación de historias desconocidas y creo que esta historia tenía todo: cubría un arco temporal muy largo, tenía el tema del tráfico de meteoritos, el lado de los conquistadores de meteoritos. La dificultad fue construir una unidad en una historia que tenía varias líneas”, añade el realizador.

En efecto, cómo dice Wolf, el meteorito de 37 toneladas se convierte en un objeto de deseo, tanto de un científico de la Nasa, William Cassidy, como de Robert Haag, un comerciante de estas piedras estelares que fue a Argentina a intentar robárselo, por increíble que parezca. El cineasta va a EE.UU. y entrevista a estos dos personajes. “Mi idea, al ir a Estados Unidos, fue dejar que la gente hablara e inventar situaciones a través de las cuales un personaje muestre lo que es sin que yo tenga que poner un texto en off. Si no arruinaba la escena, el personaje se iba a definir por sí mismo, cosa que ocurrió”, señala el realizador.

EL HOMBRE DE LOS METEORITOS
Sin duda, Haag resulta un absoluto descubrimiento: un auténtico ‘showman’, capaz de contarte las historias más increíbles delante de la cámara. “Intuía el tipo de personaje que era Haag”, dice Wolf. “Yo me preguntaba cómo podía un tipo ser capaz de robarse un meteorito de 37 mil kilos. Y confiaba que el desarrollo de la escena iba a funcionar: sabía que no iba a comenzar preguntádole del robo, sino que él hablara lo que quisiera de los meteoritos y en un momento llegar al robo. Y era un reto manejar el personaje sin que te comiera toda la película, aunque es inevitable que, al final, todos te hablen de Haag. Pero siempre hay una estrella”, añade el cineasta, quien considera que encontrar buenos personajes es fundamental en un documental.

O artigo completo, aqui

V Summer School do Lisbon Consortium: Cultural Citizenship

Published19 Jun 2015

Tags V Summer School Cultural Citizenship

 

A quinta edição da Summer School for the Study of Culture, organizada pela Universidade Católica Portuguesa/Lisbon Consortium, começa para a semana, decorrendo de 22 a 27 de Junho, em vários locais de Lisboa. Subordinada ao tema Cidadania Cultural, o encontro recebe oradores nacionais e internacionais: Mieke Bal (Amsterdam School for Cultural Analysis) Tisa Ho (Hong Kong Arts Festival) Marita Sturken (New York University)... Karl-Erik Scholhammer (PUC-Rio) Igor Stiks (University of Edinburgh) Hans Bertens (University of Utrecht) Luisa Leal de Faria (Universidade Católica Portuguesa) Paulo Soeiro Carvalho (Câmara Municipal de Lisboa).

 

O programa completo, aqui

Poesia das Zonas de Contacto: os poetas em entrevista

Imagem: Maria do Rosário Pedreira, Haris Vlavianos e Antonio José Ponte

"Poesia das Zonas de Contacto" reúne, sábado, dia 20 de Junho, às 19h, três poetas de diferentes geografias, Maria do Rosário Pedreira (Portugal), Haris Vlavianos (Quénia/Grécia) e Antonio José Ponte (Cuba), numa conversa moderada por Clara Caldeira. Deixamos aqui algumas entrevistas que permitem conhecer melhor os convidados.


MARIA DO ROSÁRIO PEDREIRA

Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Estudos Franceses e Ingleses, pela Universidade Clássica de Lisboa. Estudou paralelamente outros idiomas, como o alemão e o italiano, tendo sido bolseira na Università per Studenti Stranieri de Perugia. Foi professora de português e francês, atividade que a influenciou decisivamente a escrever para jovens, ingressando posteriormente na carreira editorial. Atualmente é editora de novos autores portugueses no grupo LeYa. As suas aventuras policiais para jovens foram objeto de adaptação televisiva e venderam mais de um milhão de exemplares. Recebeu vários prémios literários pelos seus livros de poesia e tem participado em numerosos encontros de escritores em Portugal e no estrangeiro. Os seus poemas estão traduzidos em várias línguas

Publicou em 2012 o livro “Poesia Reunida”. Vai voltar a lançar um novo livro de poemas?
Espero que sim mas não tenho nenhuma data. Sou de produção literária bastante lenta e entre 1996 e hoje só escrevi quatro pequenos livros de poesia. A minha poesia foi sempre um bocadinho terapêutica e correspondeu a momentos especialmente negros da minha vida. O que interessa é que eu produza o que faz sentido para o leitor. Como tenho a deformação profissional de ser editora, só me faz sentido fazer um livro que tenha princípio, meio e fim. 

Quando lemos a sua poesia, vemo-la a si? É sobretudo uma poesia feminina, não sei se concorda. 
A minha poesia, o feminino, é discutível, porque uma vez escrevi um livro sob pseudónimo e um membro do júri disse: “sei muito bem de quem é este livro e é de um homem”. É feminino, sou mulher e escrevo como mulher. Se me vê a mim lá? O sentimento que surge no texto é meu e, se escrevo sobre o abandono ou perda, eu sofri-os. Mas tento construir certas narrativas em que o sentimento está lá, mas eu não. E dou o exemplo: há um poema que fala sobre a perda de um filho,e eu nunca tive filhos, pelo que não tenho capacidade para sentir essa dor. 

A entrevista completa em Cargo Collective

HARIS VLAVIANOS

Licenciou-se em Economia Política e Filosofia na University of Bristol e doutorou-se em Ciência Política, História e Relações Internacionais na University of Oxford (Trinity College). A sua tese de doutoramento foi distinguida com o Fafalios Foundation Prize. Já publicou antologias de poesia, uma antologia de pensamentos e aforismos sobre poesia e poética, um livro de breves fragmentos literários e, mais recentemente, um livro de ensaios. É editor da revista Poetics e editor de poesia da Patakis Publications. É Professor de História e Ciência Política no American College of Greecee e também professor de um curso de escrita criativa. É colunista regular do jornal Vima. Recebeu do Presidente da República de Itália, em Fevereiro de 2005, o título de “Cavaliere” e a Dante Society of Italy atribuiu-lhe o Danta Prize pelas suas publicações sobre a Divina Comédia.

In your last book, you do not hesitate, even with a dose of irony, to refer to poetry as a useless art. Which may be the role of this useless art in difficult times, such as the war in Iraq or the disastrous fire in Peloponese? In other words, maybe even more excruciatingly: who can or should poetry concern in such difficult times? Can we state eventually that arts are a luxury which man can enjoy only in times of serenity?

Every era has to resolve its own tragic problems. I do not think that the forest disaster or the war in Iraq are more dramatic events than the First or the Second World War or the Holocaust. In the past there have been poets called to write in times even more difficult and extreme than ours. I use the word useless with a little dose of irony and arrogance as well. In fact, arts in general always concern few people, those who love and are devoted to them but this should not dishearten us. Whenever I am asked who does poetry concern, I always give the same answer, by referring to Chimeneth: it concerns a vast minority. This is an oxymoron phrase. Can a minority be vast? Besides, how can we estimate the special gravity of those who read poetry and philosophy for example, and those who merely consume the seasonal best-sellers on the beach? Seferis published his first book in 300 copies, Rimbaud in 80 and Ungaretti in 100. How many of those prose writers who sell today thousands of copies will be read tomorrow? Very few. Consequently, numbers do not mean anything. 

A entrevista completa em Intellectum.org

ANTONIO JOSÉ PONTE

Ensaísta, narrador e poeta cubano. Trabalhou como engenheiro hidráulico, argumentista de cinema e professor de Literatura. Em 2003, foi expulso da Unión Nacional de Escritores y Artistas de Cuba pelas suas ideias contrárias ao regime castrista. Mora em Madrid desde 2007. Publica regularmente nas revistas La Habana Elegante, Cuadernos Hispanoamericanos e Letras Libres. Atualmente é codiretor da publicação digital Diario de Cuba


—Háblanos de tu condición de poeta.

R.         —Ser poeta es el centro de toda mi vida literaria. Me interesan mucho aquellos novelistas o prosistas que son, aunque sólo episódicamente, buenos poetas. Pienso, por ejemplo, en Malcom Lowry, reconocido por sus novelas, que tiene poemas maravillosos. Ésa sería mi justificación, mi pretensión. Porque me duele contar con una producción poética tan escasa.


A veces me siento desvergonzadamente estéril como poeta. Me digo: bueno, sigues la poesía por otras vías y es preferible ser estéril antes que vanamente locuaz. En resumen, todo un caso de conciencia, difíciles relaciones con la Musa. 

Pero más allá de mi caso personal, creo que un escritor, se dedique al género que sea, tiene una raíz poética. Al comparar Pedro Páramo Cien años de soledad (vuelvo a lo anterior), se percibe que Rulfo tiene un misterio que no tiene García Márquez. No importa que Juan Rulfo no haya escrito un solo poema. No importa si era un lector habitual de poesía, la poesía estaba en su centro.

 A entrevista completa em El Digoras