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"Branco sai, Preto Fica", no El Pais


Branco Sai, Preto Fica, de Adirley Queirós, mostra-se hoje na Cinemateca do Próximo Futuro. Filme premiado e presente em vários festivais internacionais, parte de um evento real e junta-lhe elementos de ficção científica. O El Pais escreveu sobre o filme. 

O futuro chegou, e – pelo menos no Brasil - ele é mais próximo do lixão tecnológico que se tornou a Terra quando os humanos a deixaram para construir um planeta ‘ideal’ em Wall-E, na visão do cineasta Adirley Queirós. Em seu filme Branco sai, preto fica, que estreou nesta quinta-feira em salas brasileiras, há uma mistura de documentário e ficção científica, potente e complexa mesmo para um adulto ilustrado, que denuncia com criatividade e irreverência a atitude criminosa do Estado brasileiro contra os negros e marginalizados partindo de um crime específico em Brasília.

Aconteceu em 26 de março de 1986 em Ceilândia, na periferia da capital. Dois jovens negros e alegres frequentam um baile black, o Quarentão, onde exibem seus passinhos inventivos junto a uma rapaziada cativa. Certo dia, a polícia chega com cavalos e até helicópteros e avança contra tudo e todos, investindo contra os dois meninos (e outros tantos) sem dar explicações. Eles são Marquim, que ficou aleijado e vive preso a uma cadeira de rodas, e Sartrana, que teve uma perna amputada e caminha com uma prótese. Ambos viveram para contar, ou melhor, para atuar em sua própria história.

Seu título, explicado logo no início do filme, diz respeito à ordem dos policiais quando invadem o Quarentão repartindo violência: “Puta prum lado e veado pro outro! (...) Tô falando que branco pra fora e preto aqui dentro! Branco sai e preto fica, porra!”. Eram os anos 80, mas podia perfeitamente ser o presente.

O relato, verídico, é resgatado em cenas ficcionais com depoimentos reais dos ex-dançarinos atores e, além disso, temperado com a inclusão de um terceiro personagem na história: Dimas Cravalanças, que chegou do ano de 2073 para recolher provas contra o Estado criminoso. É aí que toma forma a ficção científica, acrescentando um humor fino e crítico ao filme – que só por resgatar um episódio absurdo como o do Quarentão já valeria o ingresso, mas, ao recusar a possível dureza de um documentário e o tom piegas em que ele facilmente poderia mergulhar, se faz muito mais relevante.

O longa-metragem venceu onze prêmios no Festival de Brasília de 2014, entre eles o de melhor filme, e foi selecionado por vários festivais internacionais. Não é por menos: da paisagem de feiura ímpar de Ceilândia – escura, suja, enferrujada e incompleta, como um mal esboço de si mesma – às gírias nas falas dos personagens, tudo contribui para criar um pacto firme entre o filme e o espectador. E, em águas mais profundas, proporciona um fácil paralelo com temas tão em pauta no Brasil de hoje, como a violência policial, o racismo e a nossa frágil democracia, tão contaminada pela corrupção.

O artigo completo e uma entrevista com o realizador aqui