Phax Ahamada workshop in Cairo
Publicado6 Set 2012
Publicado6 Set 2012
Publicado17 Jan 2012
“When the revolution happened, every artist I knew put down their materials.” William Wells, director of the Townhouse Gallery, is well placed to speak. Some say he has done more for contemporary Egyptian art in the last decade than the Minister for Culture. In 1998 he established the independent art space in downtown Cairo, in a nest of streets where for some time the ahwas(coffee-shops) have been busy with political dissidents. The gallery took an active role in the uprising, giving their space over to the revolutionary Radio Tahrir. “Many artists moved very smoothly into political activism, using their skills in the service of the revolution.”
Tahrir became a theater for political operations which harnessed extraordinary creativity: “In the first eighteen days vendors mixed with artists … it was hilarious, people were responding to things very quickly, creatively. Moments after the regime announced that the protesters were representing the United States, someone in Tahrir Square had produced books which said ‘US Agenda’, ‘Israeli Agenda’ and so on.” When protest encompasses everything that art has – or aims for – the privileged seclusion of art seems obsolete. Artists started to collect and organize data, to serve the revolution by making real information available online. “There was mass documentation … filmmakers started making work around the square itself.” “Then another group of revolutionary artists: filmmakers, grafiti artists came running.” Artists turned to raw data collection to record state violence: “people were taking USB sticks from phones … people filming people filming.” Townhouse helped to set up screens in Tahrir Square where this work could be shown. Then “the army smashed the screens … we created something and they destroyed it.”
Para ler o artigo completo de Orlando Reade, basta clicar aqui.
Publicado3 Jan 2012
Uma previsão do que poderá ver no PRÓXIMO FUTURO na edição de 2012...
Publicado3 Jan 2012
© Amr Abdallah Dalsh / REUTERS
Onze meses depois do início da Primavera Árabe, o programador e ensaísta António Pinto Ribeiro fez check in num hotel ao lado da Praça Tahrir. Nos dias seguintes, os combates recomeçaram. "Parei de escrever a minha novela; a realidade é mais veloz do que a minha ficção", disse-lhe a escritora Magdy El Shafee.
Estou no Cairo em Dezembro de 2011, onze meses depois da revolução do Nilo, iniciada a 25 de Janeiro, uma das datas dessa revolução regional que os media designaram como Primavera Árabe. Não sabendo muito bem onde ficar, hospedei-me naturalmente num hotel perto da Praça Tahrir por onde, aliás, o táxi que me conduzia do aeroporto fez questão de passar, indicando-ma como lugar de peregrinação; e claro que a minha primeira saída para a cidade foi exactamente para ver a Praça Tahrir.
Exalava um cheiro nauseabundo resultante do facto de, nas redondezas, haver uma única casa de banho, numa mesquita vizinha e naturalmente insuficiente para responder às necessidades dos milhares de pessoas que por ali passavam ou lá estiveram acampadas. Já não eram muitas as tendas, a maioria num estado miserável, e a população que por lá andava era constituída por mendigos e algumas centenas de jovens, muitos deles tentando vender aos poucos turistas os novos gadjets da revolução.
Foi uma decepção este primeiro confronto com a praça-símbolo que há meses vem alimentando a ideia de uma libertação possível para os egípcios, para os árabes, para os europeus e também para mim que, como milhões de pessoas no mundo inteiro, viram naquela praça e no que nela se passou a possibilidade de um novo mundo. Claro que os cínicos dirão com a sobranceria do seu egoísmo e da sua ignorância que o fracasso era previsível. Não só não era previsível - como a própria revolução não o era à altura - como, pior do que isso: que tinham feito os cínicos, e em particular os europeus, para que tal não acontecesse? Como sempre, nada!
Nos dias seguintes à minha chegada os combates de rua recomeçaram inesperadamente com enorme violência, fazendo mais feridos, mais mortos e prisões, e obrigando os hotéis das redondezas a encerrarem por falta de turistas e a entaiparem as janelas e as portas sumptuosas para evitarem a destruição ou a invasão. Forçado a mudar de hotel, no momento em que saía, o recepcionista chorava porque esse seria o seu último dia de trabalho. Com um salário baixo e uma família para sustentar, num país onde não existem as protecções do estado social (não há subsídio de desemprego), ele iria juntar-se aos milhões de outros egípcios no desemprego: 30, 40, 50 por cento?
Ninguém é capaz de dizer o número exacto. Esta incapacidade, mais do que indiciar a ausência de uma informação estatística, é o reflexo da total desconsideração e alheamento a que o governo anterior tinha votado a população. Não lhe interessava minimamente saber o estado em que ela se encontrava e ignorava completamente as suas condições de vida e as suas dificuldades de subsistência.
Com a intenção de ser solidário simultaneamente com os protestantes da Praça Tahrir e com o recepcionista, disse-lhe que em Portugal tínhamos passado por um processo semelhante, e que a situação iria acalmar e ele ia conseguir ter uma vida mais normal, queira isto dizer o que se quiser, mas não fui nada convincente. O recepcionista continuou a chorar enquanto tratava de fazer o checkout aos poucos hóspedes que ainda restavam. Depois, tivemos que descer para a cave, atravessar as dispensas e a cozinha, saindo por uma porta exígua para a rua, onde um motorista amigo esperava para nos levar a um hotel noutro bairro, mais seguro, já do outro lado do Nilo.
Duas janelas
Nesse hotel para onde me mudei a sensação de desolação mantinha-se. Embora aos funcionários sejam actualmente dadas instruções para dizer que todos os hotéis do Cairo estão com taxas de ocupação de mais de 60%, na realidade, esse valor é falso e é muito inferior. Nas ruas, e exceptuando os jornalistas presentes na Praça Tahrir, ou nas ruas que lhe dão acesso, e alguns funcionários das embaixadas do vizinho bairro de Zamalek, não se encontram mais estrangeiros.
Os restaurantes internacionais estão praticamente vazios e os taxistas oferecem preços de saldo para quem quiser visitar as pirâmides. A televisão estatal transmite em duas janelas: a da esquerda está sempre a transmitir a imagem da Praça Tahrir, enquanto a da direita vai alternando entre telenovelas, notícias de desporto, talk shows, etc.
A poluição é assustadora: uma neblina de gases está permanentemente suspensa sobre a cidade, tornando o ar irrespirável e a luz do sol rarefeita. O corpo dói com a sensação de estar intoxicado e não há garrafas de água suficientes para tentar lavar a garganta. O tráfico caótico, o zhama, e o buzinar, o hiza, constante tornam-se a cada hora que passa mais insuportáveis, e a deslocação para a baixa da cidade é mais difícil do que nunca, porque quando a ponte principal que faz a ligação entre as duas margens do Nilo está desimpedida, são aos milhares os carros que param para os mirones olharem a Praça Tahrir.
Numa cidade onde não há qualquer regra de trânsito que não possa ser infringida com a maior naturalidade, a confusão é total. A piorar a situação, muitas ruas foram cortadas ou tornaram-se intransitáveis por causa das barreiras de blocos de cimento construídas pelo exército para melhor controlar os manifestantes.
Para se ir do bairro de Zamalek à Townhouse Gallery, do outro lado do rio, demora-se duas horas a mais do que era costume. A Townhouse Gallery é, desde a sua fundação, em 1998, um dos mais criativos e alternativos centros culturais do Egipto, e o seu director e os artistas que ali trabalham ou residem estão preocupados. Anónimos começaram a fotografar e a filmar toda a gente que sai e entra do edifício e a inauguração de uma exposição foi cancelada porque a rua foi interdita ao trânsito. Todos se sentem ameaçados, tanto mais que a Townhouse Gallery é conhecida como lugar de acolhimento de ex-presos políticos, mulheres violadas e artistas militantes.
Aqui se faz teatro, dança e exposições e nenhum texto é censurado, porque até agora a comunidade internacional, e sobretudo as organizações holandesas e alemãs, tem exercido forte pressão para proteger este espaço de liberdade de criação.
O mesmo receio tem o director do Temple Independent Company, outro centro de produção de artes performativas do Cairo que tem adiado sistematicamente as estreias das suas produções. "Eles", diz-me, "já começaram a tapar as estátuas e as mulheres sem véu são insultadas nas ruas". Com o receio de que o álcool seja interdito, "muitos começaram a comprá-lo em glandes quantidades, tendo em vista consumi-lo em tempo de ilegalidade, ou vendê-lo como futura fonte de rendimento, no mercado negro".
"Eles" são os salafistas ou "os barbudos", como lhes chamam. "Uns fascistas", dizem alguns, e diferenciam-nos, apesar de tudo, dos Irmãos Muçulmanos, tentando explicar-me que estes últimos são como os democratascristãos na Europa. De qualquer modo, não há fundamentalistas moderados, como bem o escreveu
recentemente o escritor e poeta marroquino Tahar Ben Jelloun (n. 1944) - ser fundamentalista religioso é incompatível com ser racionalista moderado.
A comunidade artística egípcia está dividida. Muitos foram os que adiaram estreias de espectáculos, concertos e tournées na Europa, ou cancelaram os projectos, uns porque as obras que estavam a criar foram ultrapassadas pelos acontecimentos - "Parei de escrever a minha novela; a realidade é mais veloz do que a minha ficção", diz a escritora Magdy El Shafee (n. 1961) - outros porque a verdadeira arte hoje está na rua.
No Youtube existem dezenas de curtos documentários, canções, fotos, que mostram ao mundo o que está a acontecer todos os dias. O Youtube é, aliás, o glande écran multiplex dos altistas egípcios comprometidos com a revolução. Outros artistas, pelo contrário, sentem-se traídos pela revolução e pelo exército e só desejam partir. Decepcionam-se com amigas que, ou condicionadas por familiares ou por iniciativa própria, começaram a tapar o rosto com a niqab. Acusam a Europa de nada entender do que se está a passar e os seus cronistas e opinion makers de serem levianos nas análises da situação. Muitos têm amigos no Peru e em Santiago do Chile e é para lá que querem partir.
Eu estou aqui, no Cairo, para preparar a edição do Programa Próximo Futuro (da Fundação Calouste Gulbenkian) do ano que vem, e todos eles me dizem que é a Europa que não tem futuro porque se fechou como uma fortaleza sem alma.
Ressentimento
A violência continua, e agora é claro que os inimigos da praça já não são só os salafitas ou os nostálgicos de Mubarak, mas o próprio exército, que deixou de ser um exército amigo para se transformar num poder contestado e a quem todos reclamam que abandone o poder. Não será nem fácil, nem rápido, porque o exército controla toda a máquina administrativa do país e as suas cúpulas detêm parte do poder financeiro, sendo responsáveis por muita da corrupção que grassa.
Mas a violência exercida sobre os manifestantes e, particularmente, o episódio da mulher espancada na praça, a quem parcialmente desnudaram - um dos maiores ultrajes que se pode infligir a uma mulher neste e noutros países muçulmanos -, tornaram impossível a reconciliação dos manifestantes com os militares.
Os manifestantes da Praça Tahir, que depois dos primeiros resultados das eleições começavam a perder o apoio da população, foram agora assimilados pelas manifestações de milhares de mulheres que, condenando cenas de violência como a que sofreu Farida Elhessy (que se sabe agora que era médica e que estava na praça para tratar os feridos) reclamam o fim do conselho dos militares.
Estes protestantes do Cairo não são nem uma força homogénea, nem pertencem à juventude de qualquer partido político. Há os que são manifestantes autênticos, mas há também, confundidos nestas manifestações, pequenos ladrões, carteiristas e até skinheads árabes. Aliás, dever-se-á a estes últimos as cenas de provocação com cocktails molotov que acabaram por causar o incêndio do Instituto Egípcio.
Fundado em 1798, durante a invasão do exército de Napoleão Bonaparte e considerada a instituição científica mais antiga do país, a sua biblioteca guardava manuscritos, mapas e cerca de 200 mil livros antigos, que arderam quase na totalidade. Os que não arderam, foram transportados em camiões, e o destino de muitos deles é uma incógnita. Há quem diga que alguns, salvos, já estão a caminho de antiquários e leiloeiros europeus.
Uma das obras que ardeu quase na totalidade foi um dos raros manuscritos da Descrição do Egipto, elaborada durante a campanha napoleónica (1798-1801), o que, na versão de um jovem sociólogo que participou no trabalho de recolha dos salvados, vai permitir que as editoras francesas comecem desde já a preparar edições em formato de bolso ou de luxo/chic. Este ressentimento face a muitos estados europeus é recorrente, em particular no seio do sector cultural e artístico, que se viu ao longo dos últimos trinta anos abandonado pela grande maioria das organizações europeias, apesar de no país e na capital serem vários os institutos culturais agregados aos ministérios dos negócios estrangeiros.
E, no entanto, no Cairo existe há muitos anos uma comunidade artística e cultural inventiva, trabalhando com recursos mínimos: há excelentes fotógrafos, a literatura egípcia, em árabe, inglês ou até francês, é extraordinária, jovens escritores emergem combinando a BD com narrativas curtas, os bloggs são inventivos e revelam atenção às questões internacionais pertinentes, bandas tocam noites e noites em antigos palácios onde fumar é possível e, apesar de o ambiente ser muitas vezes próximo do irrespirável, as festas acabam com o sol a irromper velozmente, como é próprio do Norte de África.
Muitos são os enfeites a desejarem um Bom Natal em inglês às entradas dos hotéis mas também em algumas ruas, o que não deixa de ser senão a confirmação da globalização de uma festa europeia numa cidade maioritariamente muçulmana e onde a minoria cristã copta só celebra o seu Natal em Janeiro.
À noite continuo a leitura de Os pequenos mundos do edifício Yacoubian (de 2002 e editado em português, pela Presença, em 2008), de Alaa El Aswany, um dos mais lúcidos e fascinantes escritores egípcios da actualidade. Ler este livro a poucas centenas de metros da Praça Tahrir é confrontarmo-nos com uma narrativa que parece ter previsto toda a revolução egípcia, e através dela se entende melhor a complexidade deste país.
Sobre a pequena mesa do quarto amontoam-se outros livros de outros autores egípcios que é urgente ler: Gamal El- Ghitani, Khaled El-Khamissi, Latifa, Al-Zayyat, Bahaa Taher Chedid. Uns antigos, outros actuais, nos seus textos estão escritas as inquietações sobre o Egipto e sobre os egípcios.
O Nilo, esse, mantém-se tranquilo. À superfície, as suas águas são de uma tal calmaria que neste momento se torna até desesperante...
[Artigo no jornal Público (no P2), 30 de Dezembro 2011]
Publicado30 Dez 2011
(Panorama da cidade do Cairo, Egito, vista de cima; Getty Images)
Arquitetos espanhóis propõem revolucionar espaço público no Cairo
Espaços agradáveis no lugar de becos cheios de lixo é a proposta do grupo de arquitetos espanhóis Basurama para revolucionar os espaços mais deteriorados do Cairo.
Basurama analisou esta semana, junto com 20 profissionais da arquitetura e urbanismo egípcios, diversas fórmulas para melhorar locais degradados da capital egípcia e concluíram que "faltam praças, parques e locais para crianças", explica o membro do Basurama, Benjamín Castro.
Castro explicou à Agência Efe que no Egito os espaços públicos estão muito bem definidos: "Existem o café como lugar de encontro, as mesquitas como lugar de recolhimento e oração e o mercado como lugar de troca".
Com a oficina "Resíduos e recuperação urbana", os membros do Basurama, um coletivo de arquitetos de Madri que desenvolve projetos entorno do lixo, quis ir além e analisou, junto com urbanistas, arquitetos e designers egípcios, várias propostas para introduzir mudanças nos espaços públicos do Cairo.
A mobilização popular que em 11 de fevereiro encerrou com 30 anos de Governo do presidente Hosni Mubarak ocupou boa parte do debate, já que durante os dias prévios e posteriores à queda do ditador, a revolução no Egito não foi só política, mas também cidadã.
"A revolução criou uma nova conjuntura na qual o povo se sente mais forte", manifestou o arquiteto e designer egípcio Omar Nagati, que apostou por "captar esta energia e esta motivação e canalizá-la para o lado construtivo, não destrutivo".
A partir desta ideia, os participantes da oficina propuseram iniciativas para limpar becos, reabilitar os grandes espaços vazios e mal-cheirosos sob as pontes que cruzam o Cairo e dar um toque de cor à cidade, um tanto cinza atualmente.
"Queremos intervir com pouquíssimo orçamento e com materiais muito simples para que as pessoas possam fazer o mesmo em outras ocasiões", explicou Castro, que esclareceu que Basurama elaborará uma proposta com as reflexões desta primeira oficina para colocá-la em prática no ano que vem.
Espanhóis e egípcios concluíram que o principal problema nas ruas é a sujeira e a falta de consciência e cuidado dos cidadãos.
(...)
Para ler o artigo completo de Laura Milham Lombraña, basta clicar aqui.
Publicado27 Dez 2011
It's hard enough for a director to react to global political events. Anticipating them? It might be easier to predict Tim Tebow's career arc.
But as violence engulfs Cairo for a fourth straight day -- with at least 10 protesters killed in clashes with the military near Tahrir Square in this charged city -- two feature-film directors are dealing with their unlikely role as a sort of Mideastern political seer.
Maybe most striking is that neither of them made a movie about politics.
(...)
The best way to make a movie about the revolution, in other words, is not to make it about the revolution.
Para ler o artigo completo de Steven Zeitchik, correspondente no Cairo, basta ir aqui.
Publicado23 Dez 2011
de Alaa El Aswany
Trad. do inglês de Helena Falé Chora
Editora Presença
Um livro que retrata a sociedade egípcia desde a década de 30 do século passado – data da construção do edifício Yacoubian – até à Guerra do Golfo. Yacoubian é um dispositivo que tanto permite a construção de pequenas narrativas relativas a cada um dos ocupantes dos vários apartamentos, como se tratasse de várias cenas de teatro em simultâneo, como é o ponto de partida e de chegada para as narrativas maiores em torno das grandes questões sociais, políticas e religiosas que trespassaram o Cairo ao longo de oitenta anos.
A perícia do escritor egípcio no modo como encadeia e combina as pequenas e as grandes narrativas é exímia e constitui uma das grandes qualidades da construção desta obra. Uma outra qualidade decorre da forma minuciosa como tece cada uma das personagens e as faz evoluir respondendo às situações que vai construindo ao longo do romance. Ler este livro a poucas centenas de metros da praça Tahrir tem também como efeito entender esta obra como um passado histórico onde a corrupção dos governos, o nacionalismo fundamentalista de Nassar, o fanatismo religioso para o qual muito contribuiu a repressão do regime, terá conduzido a esta praça.
APR
Publicado20 Set 2011
Nascido no Cairo em 1913 e falecido num hotel de Paris a 22 de Junho de 2008, Albert Cossery terá sido o último da geração dos chamados escritores dandies, título atribuído pelo tipo de vida urbana e flânneur que levavam. A sua obra, constituída por cerca de uma dezena de livros, tem como cenário de acontecimentos o seu Egipto do século XX.
No caso do romance "Les Couleurs de L’Infamie", lido na versão da tradutora brasileira Flávia Nascimento, trata-se da pequena história de um ladrão profissional – Ossama – descrito como um ladrão bom porque só rouba os ricos que se vê enredado numa história de corrupção que envolve um político detentor de um grande poder no Egipto sob o regime de Hosni Mubarak. Há como sempre em Albert Cossery uma metáfora da corrupção e da violência social deste regime – que acaba de cair – descritas nas ruas dos bairros pobres do cairo, na presença de milhares de mendigos na cidade, no confronto com a permanente corrupção que alimenta o regime. Parte da narrativa decorre no cemitério do Cairo, uma autêntica cidade que tivemos recentemente a possibilidade de ver no excelente documentário de Sérgio Tréfaut “A Cidade dos Mortos”.
Em "As Cores da Infâmia" há todo um manual de regras de comportamento para o ladrão que é profissional; corre riscos e tem princípios: “Não há nada de mais imoral do que roubar sem riscos” ou “Não inculquei em você a minha arte para que se tornasse um ladrão de cinema, cuja única preocupação é não desagradar ao público” (págs. 66 e 67). E com doses certas de ironia o autor sai das fronteiras do Egipto e fala do mundo: “Repare nas pirâmides. Neste país, não passa pela cabeça de ninguém construir uma pirâmide. O lugar está ocupado há 4 mil anos. Mas no estrangeiro tem-se erguido algumas pirâmides. Aliás essa é a moda da arquitectura moderna” (págs. 129-130).
APR
Publicado24 Fev 2011
Com data de inauguração programada à partida para 30 de Janeiro de 2011 – dia em que consecutivas manifestações nas ruas originaram a primeira nomeação em 30 anos de um vice-presidente no Egipto! –, a exposição “Propaganda by Monuments” foi adiada sine die, tendo a curadora Clare Butcher iniciado um diário que relata as experiências vividas durante a montagem e justificado a opção de refazer o enquadramento conceptual da mostra, de modo a incluir esta inesperada revolução popular egípcia.
Entretanto, algures numa Cairo ainda em processo revolucionário, estarão os trabalhos de Hasan & Husain Essop, Ângela Ferreira, Dan Halter, Runa Islam, Iman Issa, Ahmed Kamel e Kiluanji Kia Henda, escolhidos para uma iniciativa que, curiosamente, já propunha uma reflexão sobre o que acontece quando a revolução se torna realidade e quando a revolução acaba.
Imperdíveis, as palavras e imagens de Clare Butcher aqui.
LM
Publicado21 Jan 2010