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E difícil ultrapassar a ficção de 12 Anos Escravo, que é no fundo o documento de uma desumanidade.
Assistimos a uma curiosa evolução dos vários regimes políticos dos Estados africanos. Países como Eritreia, o Tchad, a Guiné Equatorial mantêm regimes autocráticos. A África do Sul mostra-se incapaz de encontrar soluções para a diminuição da desigualdade. Sucedem-se guerras civis na Somália. Em mais de três dezenas de países africanos foram adoptadas leis homofóbicas e quatro desses países punem a homossexualidade com pena morte. E, mais recentemente, todos os países da CPLP, o que inclui tanto os ex-colonizados como o ex-colonizador, já declararam aceitar como novo membro um dos estados mais tenebrosos de África: a Guiné-Equatorial cujo presidente é o ditador Obiang.
De tudo isto fica a sensação de uma grande decepção pós-colonial. Como se entre o período da colonização -- ou seja, entre o século XV e o século XX -- e o período que se lhe seguiu (que numa classificação rudimentar da História se chama Pós-colonial), houvesse um corte radical e se apresentasse uma espécie de um grande final à maneira de Hollywood com os ex-colonizados mártires a vencer e os maus, os colonizadores, a serem expulsos daquelas terras depois de anos de ocupação indevida mas em que o colonialismo ficou recalcado e agora ressurge com novas formas e outros protagonistas, grande parte deles, africanos. O que os primeiros sonhadores de um pós-colonialismo como Aimè Césaire, Frantz Fanon ou Amílcar Cabral queriam, a criação de um homem novo a partir do que se tinha tornado a figura do negro, afinal não se tornou realidade nem nas primeiras independências, nem em todo o continente africano. Porventura porque o homem novo não é senão uma miríade messiânica e o que pode e também já acontece são sociedades renovadas que desconstroem o seu passado colonial.
É um facto que se deu a ocupação de todo um continente – para só falarmos em África – por um conjunto de nações europeias que formaram Impérios. Estes, exploraram os recursos naturais das terras de vários povos, ocuparam os seus espaços, violentaram-lhes os horizontes e, pior, criaram uma mercadoria a que chamaram: o negro. E esta mercadoria, o negro, foi traficada durante centenas de anos sem que os arautos mais puros do Iluminismo europeu se tivessem insurgido contra isso. Entre esses promotores da modernidade europeia estão escritores como Diderot ou Voltaire, dramaturgos como Molière ou Voltaire, libretistas como Lorenzo Da Ponte, pintores como Velazquez, David, Manet, Ingres, filósofos como Kant ou Hegel; ilustres fundadores da modernidade europeia que aceitaram ir no embalo com que o capitalismo nascente introduzira, nas transacções comerciais, o negro. A justiça manda que se ressalve o Padre António Vieira a denunciar a escravidão transatlântica.
É certamente para todos nós inconcebível que homens e mulheres pudessem ser propriedade privada de outros seres humanos até há pouco mais de 150 anos. Por isso é difícil o exercício de racionalidade quando assistimos a filmes como “Django Libertado” de Tarantino e “Doze anos escravo” de Steve McQueen. Porque se tem dificuldade em ultrapassar o lado ficcional e ver ali a expressão documental dessa desumanidade.
O problema da incompletude da Modernidade europeia tem como núcleo principal – ainda hoje - o grande trauma do colonialismo. Este ficou por resolver e a sombra dessa barbárie é o fardo escuríssimo que a Europa e os colonos europeus herdaram. Recordemos que a escravatura atlântica atingiu vários continentes e em todos eles as pessoas de origem africana foram transformadas em mercadoria. Um sistema muito complexo, envolvendo vários poderosos – os Estados, os príncipes, os negociantes, a Igreja Católica – criou “o Negro como uma espécie de homem-coisa, homem-metal, homem-moeda, homem-plástico” (Achille Mbembe, “Critique de la raison nègre”, 2013).
Há que olhar o pós-colonialismo para lá do que é a banalização da rede complexa de teorias que os media tanto anunciaram como moda como depois esqueceram, num processo de produção de amnésia colectiva. E há que entendê-lo nas suas múltiplas formas e etapas de desenvolvimento, sublinhando que ele não é assunto exclusivo das ex-colónias, é um problema do antigo Império europeu, para usarmos a designação dos pensadores Toni Negri e Michael Ardt (Empire, 2000).
Entre o que foi promovido e reclamado pelos primeiros lutadores pela causa da libertação das colónias europeias e a actualidade, entre os anos 30 do século passado e a publicação muito recente da obra já incontornável de Achille Mbembe acima mencionada (“Critique de la raison nègre”, 2013), muita coisa aconteceu. Esse processo vai da assunção virulenta e necessária de uma ideologia que rompesse com a opressão colonial (uma vez que esta apenas metamorfoseava o esclavagismo na exploração da força de trabalho a baixíssimo custo, mantendo o negro despojado de ‘cultura’ porque continuava a ser apenas um indígena) até à desconstrução radical do negro, da sua invenção e da invenção da raça.
A obra de Achille Mbembe revela que os saberes e as tecnologias do capital e, mais ainda, do neo-liberalismo que se impuseram como políticas dos Estados conservam, por nostalgia e por interesses de negócios, a figura do negro desta forma: Negro é todo o africano que é pobre.
Sabemos que os processos de libertação e as independências africanas levaram a que, na relação dos Estados ex-colonizadores com os novos países africanos, se gerassem formas mais ou menos continuadas de relações de interesses. Assim, houve uma descolonização política das ex-colónias mas está por fazer a descolonização dos espíritos dos governantes dos dois lados destas parcerias. E isso é evidente na ausência de uma viragem descolonizadora no modo de fazer política.
Repare-se como são poucas as novas formas de fazer política conservando a democracia e enfrentando a globalização. E a ausência dessa necessária viragem descolonizadora, essa preservação de Estados espiritualmente colonizados, revela-se também na ausência nestes estados neo-colonizados das expressões artísticas e das regulamentações de justiça social.
Depois do período de nojo que a Europa viveu (em vários calendários) e que todo o mundo viveu com a declaração das independências pelos estados africanos, veio um tempo em que os independentistas tiveram de se confrontar rapidamente com o nado-morto que era a tal emergência do Homem Novo Africano. Seguiram-se períodos de redefinição, convulsões e alguns apaziguamentos temporários. A expressão maior disto é o período da governação arco-íris na África do Sul durante a presidência de Mandela.
Na tese do já referido livro “Crítica da Razão Negra” há aspectos permanecem como chagas e a todos dizem respeito. O primeiro é que o negro permanece enquanto fantasmagoria, não já com a frieza do homem-metal ou com a espectacularidade da bailarina Josephine Baker, mas como o africano sem papéis que quer chegar a Lampedusa e é identificado como fazendo parte de uma raça: a de todos os negros que querem chegar a Lampedusa. Um segundo é a irrupção populista tanto em países europeus como africanos do tema da raça e da sua associação ao nacionalismo.
Achille Mbembe apresenta uma revisão radical dos textos pós-coloniais clássicos e refuta as teorias pós-coloniais quando hoje persistem em impor-se como ideologia. Afirma que, apesar de o tentar, a Europa já não constitui o centro de gravidade do mundo porque outros saberes tecnológicos e outras formas mais velozes de circulação de capital, oriundas de outras regiões, a ultrapassaram. Mas nem por isso o momento é menos perigoso. Na actualidade, a situação de subalternidade para onde o capitalismo empurrou todos os subalternos, ou seja, quase toda a humanidade, faz com que pensemos que talvez se esteja a caminhar em direcção a um “devir-negro” à escala global que já não identifica somente todas as pessoas de origem africana mas toda a humanidade que estiver na situação de subalternidade: sem papéis, sem trabalho, manipulado nos imensos bancos de dados dos computadores, tanto imigrantes africanos como europeus ambos “homens-descartáveis” no nomadismo forçado vendendo a sua criatividade e a sua força de trabalho, e aos quais são indiferentes os poderosos com toda a sua indiferença e toda a sua ignorância.
António Pinto Ribeiro
Crónica inicialmente publicada a 7 de Março de 2014 no suplemento Ípsilon do jornal Público.
Brian Chikwava
The diaspora novel is not a new phenomenon in the relatively small body of Zimbabwean literature as Dambudzo Marechera’s posthumous publication, The Black Insider (1992) and Wilson Katiyo’s Going to Heaven (1979) stand out from those writers who were forced into exile by different but more horrible circumstances of colonial apartheid. DE Mutasa’s Nyambo DzeJoni (2000) is a recent Shona account of life down south.
But what is also uniquely apparent is that the diaspora novel is becoming the dominant genre of contemporary Zimbabwean writing. Those writers who are giving a global face to Zimbabwean literature are ensconced outside, far from the madding crowds of Harare or Bulawayo, not witness to the buzz, the gossip, the scandals. Perhaps it doesn’t mean anything.
Leiam o artigo do jornal The Standard.
Only the reader who truly loves books — books full to brimming with imagery — will appreciate the magic Owuor has made of the classic nation-at-war novel. With splintered lyricism, she tells the story of the Oganda family: Moses Odidi, a young, brilliant, rugby-playing engineer who is brutally murdered in the prologue; his younger sister, Arabel Ajany, a gifted painter who returns from Brazil to bury her brother, then switches tack and scours Nairobi to “find” him; their father, Aggrey Nyipir, an elegant gravedigger turned cattle herder, once the right-hand man to the rogue British officer Hugh Bolton; Bolton’s son, Isaiah William, arriving in Kenya to search for his father; and Akai Lokorijom, the devastatingly beautiful, AK-47-wielding woman who unites them all. These are fragile, passionate human beings, most of them guilty of righteous violence, all of them bearing wounds and hopes that will lead to death or redemption. The richness of the plot alone will challenge a lazy reader. But the visceral lusciousness of the prose will thrill a lover of language.
Leiam a crítica de Taiye Selasi no New York Times.
Yoweri Museveni, Presidente do Uganda
A revista Pambazuka dedica um número especial às lutas LGBT em Árica. Leiam a introdução do jornalista Henry Makori, Why we must stop this gay witch-hunt now.
The sheer weight of indignation and revulsion of most of Nigerian humanity at the recent Boko Harma atrocity in Yobe is most likely to have overwhelmed a tiny footnote to that outrage, small indeed, but of an inversely proportionate significance. This was the name of the hospital to which the survivors of the massacre were taken. That minute detail calls into question, in a gruesome but chastening way, the entire ethical landscape into which this nation has been forced by insensate leadership. It is an uncanny coincidence, one that I hope the new culture of ‘religious tourism’, spearheaded by none other than the nation’s president in his own person, may even come to recognize as a message from unseen forces.
For the name of that hospital, it is reported, is none other than that of General Sanni Abacha, a vicious usurper under whose authority the lives of an elected president and his wife were snuffed out. Assassinations – including through bombs cynically ascribed to the opposition – became routine. Under that ruler, torture and other forms of barbarism were enthroned as the norm of governance. To round up, nine Nigerian citizens, including the writer and environmentalist Ken Saro-wiwa, were hanged after a trial that was stomach churning even by the most primitive standards of judicial trial, and in defiance of the intervention of world leadership. We are speaking here of a man who placed this nation under siege during an unrelenting reign of terror that is barely different from the current rampage of Boko Haram. It is this very psychopath that was recently canonized by the government of Goodluck Jonathan in commemoration of one hundred years of Nigerian trauma.
It has been long a-coming. One of the broadest avenues in the nation’s capital, Abuja, bears the name of General Sanni Abacha. Successive governments have lacked the political courage to change this signpost – among several others - of national self degradation and wipe out the memory of the nation’s tormentor from daily encounter. Not even Ministers for the Federal Capital territory within whose portfolios rest such responsibilities, could muster the temerity to initiate the process and leave the rest to public approbation or repudiation. I urged the need of this purge on one such minister, and at least one Head of State. That minister promised, but that boast went the way of Nigerian electoral boast. The Head of State murmured something about the fear of offending ‘sensibilities’. All evasions amounted to moral cowardice and a doubling of victim trauma. When you proudly display certificates of a nation’s admission to the club of global pariahs, it is only a matter of time before you move to beatify them as saints and other paragons of human perfection. What the government of Goodluck Jonathan has done is to scoop up a century’s accumulated degeneracy in one preeminent symbol, then place it on a podium for the nation to admire, emulate and even – worship.
There is a deplorable message for coming generations in this governance aberration that the entire world has been summoned to witness and indeed, to celebrate. The insertion of an embodiment of ‘governance by terror’ into the company of committed democrats, professionals, humanists and human rights advocates in their own right, is a sordid effort to grant a certificate of health to a communicable disease that common sense demands should be isolated. It is a confidence trick that speaks volumes of the perpetrators of such a fraud. We shall pass over - for instance - the slave mentality that concocts loose formulas for an Honours List that automatically elevate any violent bird of passage to the status of nation builders who may, or may not be demonstrably motivated by genuine love of nation. According generalized but false attributes to known killers and treasury robbers is a disservice to history and a desecration of memory. It also compromises the future. This failure to discriminate, to assess, and thereby make it possible to grudgingly concede that even out of a ‘doctrine of necessity’ – such as military dictatorship - some demonstrable governance virtue may emerge, reveals nothing but national self-glorification in a moral void, the breeding grounds of future cankerworm in the nation’s edifice.
Such abandonment of moral rigour comes full circle sooner or later. The survivors of a plague known as Boko Haram, students in a place of enlightenment and moral instruction, are taken to a place of healing dedicated to an individual contagion – a murderer and thief of no redeeming quality known as Sanni Abacha, one whose plunder is still being pursued all over the world and recovered piecemeal by international consortiums – at the behest of this same government which sees fit to place him on the nation’s Roll of Honour! I can think of nothing more grotesque and derisive of the lifetime struggle of several on this list, and their selfless services to humanity. It all fits. In this nation of portent readers, the coincidence should not be too difficult to decipher.
I reject my share of this national insult.
Wole Soyinka
Fonte: Sahara Reporters
Ao longo de processo de crescimento e desenvolvimento da sua capacidade de analise e maturidade, o ser humano vai aos poucos ganhando a sua identidade na medida em que se vai humanizar e é evidente que a tal identidade depende muito mais do ambiente em que o mesmo vai se formando com predominância de divergências e convivências de variáveis ideias, características ou elementos distintos entre si. É nesta abordagem onde constata-se também o papel fundamental que a fotografia desempenha na construção da memória e o seu desempenho na formação de ser humano, desde a sua descoberta, a fotografia esteve presente na vida social, econômica, política entre varias outras vertentes como índice puro da realidade.
Com o passar do tempo, todos querem rever a imagem no espelho refletindo o passado de cada um de nós para melhor compreender as nossas distintas formas de ser e as mudanças entre as nossas semelhanças e diversidades.
O tema do Festival de fotografia ENCONTROS DE MAPUTO 2015 é "Diverscidades". A escolha de tema neste contexto está ligada a intersecção de diferenças, ou ainda, na tolerância mútua. A diversidade é as diferentes características das pessoas cada uma tem defeitos e qualidades diferentes.
Mário Macilau, Presidente
A nossa oradora de Sábado, Ros Gray, sugere-nos a leitura dos seus artigos The Militan Image: A Ciné-Geography e Cinema on the cultural front: Film-making and the mozambican revolution.
A segunda sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas tem lugar no próximo Sábado, dia 1 de Março, às 15h, no Aud.3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. A entrada será livre, mediante inscrição prévia. Consultem a programação.
"A África tão perto e tão longe do Brasil com curadoria de António Pinto Ribeiro".
Artigo no Público sobre a programação especial que o Museu de Arte do Rio irá dedicar ao continente africano e às suas relações com o Brasil, com conferências, palestras, seminários, mostras de cinema e várias actividades educativas.
Leiam o artigo.
The presentation will situate the films of the armed struggle and the cinema culture that was constructed in Mozambique after independence at the center of a trans-national movement of militant ciné-cultural practices.This movement sought both to harness cinema as an agent of social change in Africa, and to decolonise filmmaking itself in terms of production, distribution and exhibition. The presentation will explore manifestations of the militant image in terms of contradictory tendencies towards disciplinary models of revolutionary comportment embodied in the figure of the ‘New Man’ and more experimental, anti-authoritarian modes of politically engaged cinema, both of which were present within the nation-building project of the InstitutoNacional de Cinema established in 1976. The mission of the INC was to ‘delivery to the people an image of the people’. In the ‘birth of a nation’ through film, how does the militant image insert itself into the revolutionary situation of decolonisation, and how can its significance and potentiality be understood today?
Ros Gray, Estudos Artísticos, Goldsmith College, Universidade de Londres
A segunda sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas tem lugar no próximo Sábado, dia 1 de Março, às 15h, no Aud.3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. A entrada será livre, mediante inscrição prévia. Consultem a programação.
Frantz Fanon
Quem quiser preparar-se melhor para a sessão de Sábado, pode dedicar-se à leitura de dois artigos da nossa oradora Maria-Benedita Basto: "Quem é escrito?" Revolução, alteridade, experiências de reescrita e história conectada no contexto da guerra colonial e de libertação em Moçambique e ainda Le fanon de Homi Bhabha: Ambivalence de l'identité et dialectique dans une pensée postcoloniale.
A segunda sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas tem lugar no próximo Sábado, dia 1 de Março, às 15h, no Aud.3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. A entrada será livre, mediante inscrição prévia. Consultem a programação.
Esta comunicação estrutura-se em dois eixos que se cruzarão a dado momento da intervenção. No primeiro trata-se de apresentar uma reflexão sobre o cânone estético moçambicano elaborada durante a luta de libertação moçambicana e publicada em dois jornais de circulação internacionalista, Mozambique Revolution (1969) e Lotus/Afro-Asian Writings (1971), intitulada “The Role of Poetry in the Mozambican Revolution”. O segundo eixo procura analisar as dinâmicas das escritas dos guerrilheiros da Frelimo nos jornais que publicavam nas bases e campos de treino. Em ambos os casos, trata-se de material de arquivo, em parte inédito e/ou muito pouco estudado.
Por circulação internacionalista entendo (numa aparente tautologia) as circulações que visam criar laços desfazendo ao mesmo tempo identidades fixas nacionalistas. É como classificaria então o caso da circulação de ideias e pessoas nos anos 60/70, i.e., nos anos que correspondem ao início da formação dos movimentos anti-coloniais das colónias portuguesas e ao período das lutas de libertação. Iniciadas quando uma grande parte do continente africano já estava independente, estas lutas acabam por se inserir numa ordem mundial diferente sobretudo graças ao impacto que Cuba ( e a América latina) vai ter no conjunto dos modelos e representações da revolução e dos militantes revolucionários. Uma das suas contribuições é, sem dúvida, a sobreposição entre vanguarda estética e vanguarda revolucionária que se traduz, numa estetização acrescida da militância e assim, novas achegas para os temas centrais da arte desde a revolução de Outubro: os pares colectivo/indivíduo, forma/fundo, arte/real, nacional/internacional.
Numa primeira parte, “The Role of Poetry in the Mozambican Revolution”, estabelece uma periodização da literatura moçambicana partindo, sem citar, de Frantz Fanon (um autor incómodo dado o desencontro político ocorrido); na segunda parte apresenta o novo cânone, recorrendo de um modo bastante inesperado à noção situacionista/letrista de “détournement”. Não é assim o território “nacional” mas a circulação internacionalista das representações da luta que enfocam também esta proposição de cânone estético.
Quanto às escritas dos guerrilheiros, irá interessar-me sobretudo pôr aqui em perspectiva a antologia organizada pelas instâncias centrais da Frelimo, em 1971, e os poemas publicados pelos guerrilheiros nos seus jornais locais, poemas que serviram precisamente de material para essa publicação. O que aqui estará em jogo são então as possíveis maneiras de escrever o colectivo e por aqui se vem cruzar o primeiro eixo. Subjacente à antologia está a ideia de uma oposição colectivo/indivíduo que esta obra deveria resolver optando pelo primeiro termo. Nas experimentações estéticas dos jornais, as escritas fazem funcionar uma equivalência entre os dois termos da qual resulta uma outra dinâmica: uma prática revolucionária imprópria que ao mesmo tempo desorganiza e concretiza a militância anti-colonial, na postulação de uma utopia feliz de descolonização do saber.
Maria-Benedita Basto, Paris Sorbonne/CRIMIC-IMAF
A segunda sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas tem lugar no próximo Sábado, dia 1 de Março, às 15h, no Aud.3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: O Anticolonialismo da Imagem Militante à Guerra das Escritas. A entrada será livre, mediante inscrição prévia. Consultem a programação.
Elise Atangana, curadora e colaboradora da Revue Noir
A ARCO Madrid organiza amanhã uma reunião de profissionais com o tema "Curating Africa (in, from and for)".
“[This is a] professional meeting that addresses the 'African trend' among Western museums and other institutions. The purpose of this encounter is to debate the challenges raised by curating in, from, and for Africa. Participating curators are both Western or Western-based, and African or African-based.
Leiam mais informações.
Muitos intelectuais africanos pronunciaram-se nas ultimas semanas sobre atitudes e leis homofóbicas. A última reacção é este texto da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, escrito para o Scoop.
I will call him Sochukwuma. A thin, smiling boy who liked to play with us girls at the university primary school in Nsukka. We were young. We knew he was different, we said, ‘he’s not like the other boys.’ But his was a benign and unquestioned difference; it was simply what it was. We did not have a name for him. We did not know the word ‘gay.’ He was Sochukwuma and he was friendly and he played oga so well that his side always won.
In secondary school, some boys in his class tried to throw Sochukwuma off a second floor balcony. They were strapping teenagers who had learned to notice, and fear, difference. They had a name for him. Homo. They mocked him because his hips swayed when he walked and his hands fluttered when he spoke. He brushed away their taunts, silently, sometimes grinning an uncomfortable grin. He must have wished that he could be what they wanted him to be. I imagine now how helplessly lonely he must have felt. The boys often asked, “Why can’t he just be like everyone else?”
Possible answers to that question include ‘because he is abnormal,’ ‘because he is a sinner, ‘because he chose the lifestyle.’ But the truest answer is ‘We don’t know.’ There is humility and humanity in accepting that there are things we simply don’t know. At the age of 8, Sochukwuma was obviously different. It was not about sex, because it could not possibly have been – his hormones were of course not yet fully formed – but it was an awareness of himself, and other children’s awareness of him, as different. He could not have ‘chosen the lifestyle’ because he was too young to do so. And why would he – or anybody – choose to be homosexual in a world that makes life so difficult for homosexuals?
The new law that criminalizes homosexuality is popular among Nigerians. But it shows a failure of our democracy, because the mark of a true democracy is not in the rule of its majority but in the protection of its minority – otherwise mob justice would be considered democratic. The law is also unconstitutional, ambiguous, and a strange priority in a country with so many real problems. Above all else, however, it is unjust. Even if this was not a country of abysmal electricity supply where university graduates are barely literate and people die of easily-treatable causes and Boko Haram commits casual mass murders, this law would still be unjust. We cannot be a just society unless we are able to accommodate benign difference, accept benign difference, live and let live. We may not understand homosexuality, we may find it personally abhorrent but our response cannot be to criminalize it.
A crime is a crime for a reason. A crime has victims. A crime harms society. On what basis is homosexuality a crime? Adults do no harm to society in how they love and whom they love. This is a law that will not prevent crime, but will, instead, lead to crimes of violence: there are already, in different parts of Nigeria, attacks on people ‘suspected’ of being gay. Ours is a society where men are openly affectionate with one another. Men hold hands. Men hug each other. Shall we now arrest friends who share a hotel room, or who walk side by side? How do we determine the clunky expressions in the law – ‘mutually beneficial,’ ‘directly or indirectly?’
Many Nigerians support the law because they believe the Bible condemns homosexuality. The Bible can be a basis for how we choose to live our personal lives, but it cannot be a basis for the laws we pass, not only because the holy books of different religions do not have equal significance for all Nigerians but also because the holy books are read differently by different people. The Bible, for example, also condemns fornication and adultery and divorce, but they are not crimes.
For supporters of the law, there seems to be something about homosexuality that sets it apart. A sense that it is not ‘normal.’ If we are part of a majority group, we tend to think others in minority groups are abnormal, not because they have done anything wrong, but because we have defined normal to be what we are and since they are not like us, then they are abnormal. Supporters of the law want a certain semblance of human homogeneity. But we cannot legislate into existence a world that does not exist: the truth of our human condition is that we are a diverse, multi-faceted species. The measure of our humanity lies, in part, in how we think of those different from us. We cannot – should not – have empathy only for people who are like us.
Some supporters of the law have asked – what is next, a marriage between a man and a dog?’ Or ‘have you seen animals being gay?’ (Actually, studies show that there is homosexual behavior in many species of animals.) But, quite simply, people are not dogs, and to accept the premise – that a homosexual is comparable to an animal – is inhumane. We cannot reduce the humanity of our fellow men and women because of how and who they love. Some animals eat their own kind, others desert their young. Shall we follow those examples, too?
Other supporters suggest that gay men sexually abuse little boys. But pedophilia and homosexuality are two very different things. There are men who abuse little girls, and women who abuse little boys, and we do not presume that they do it because they are heterosexuals. Child molestation is an ugly crime that is committed by both straight and gay adults (this is why it is a crime: children, by virtue of being non-adults, require protection and are unable to give sexual consent).
There has also been some nationalist posturing among supporters of the law. Homosexuality is ‘unafrican,’ they say, and we will not become like the west. The west is not exactly a homosexual haven; acts of discrimination against homosexuals are not uncommon in the US and Europe. But it is the idea of ‘unafricanness’ that is truly insidious. Sochukwuma was born of Igbo parents and had Igbo grandparents and Igbo great-grandparents. He was born a person who would romantically love other men. Many Nigerians know somebody like him. The boy who behaved like a girl. The girl who behaved like a boy. The effeminate man. The unusual woman. These were people we knew, people like us, born and raised on African soil. How then are they ‘unafrican?’
If anything, it is the passage of the law itself that is ‘unafrican.’ It goes against the values of tolerance and ‘live and let live’ that are part of many African cultures. (In 1970s Igboland, Area Scatter was a popular musician, a man who dressed like a woman, wore makeup, plaited his hair. We don’t know if he was gay – I think he was – but if he performed today, he could conceivably be sentenced to fourteen years in prison. For being who he is.) And it is informed not by a home-grown debate but by a cynically borrowed one: we turned on CNN and heard western countries debating ‘same sex marriage’ and we decided that we, too, would pass a law banning same sex marriage. Where, in Nigeria, whose constitution defines marriage as being between a man and a woman, has any homosexual asked for same-sex marriage?
This is an unjust law. It should be repealed. Throughout history, many inhumane laws have been passed, and have subsequently been repealed. Barack Obama, for example, would not be here today had his parents obeyed American laws that criminalized marriage between blacks and whites.
An acquaintance recently asked me, ‘if you support gays, how would you have been born?’ Of course, there were gay Nigerians when I was conceived. Gay people have existed as long as humans have existed. They have always been a small percentage of the human population. We don’t know why. What matters is this: Sochukwuma is a Nigerian and his existence is not a crime.
Comunicação de Ros Gray, que será uma das nossas oradoras no Observatório do dia 1 de Março.
Within the context of cinematographic traditions and different liberation movements on the African continent, Ros Gray’s research focuses on revolutionary cinema and its global networks; the screen as a site of radical gathering; anti-colonial and post-colonial theory; and contemporary film and video art.
Pieter Hugo, "Yakubu Al Hasan, Agbogbloshie Market, Accra, Ghana" from the series "Permanent Error"
O Getty Research Institute apresenta a exposição Connecting Seas: A Visual History of Discoveries and Encounters. Uma das curadoras, Isotta Poggi, reflecte sobre o trabalho dos fotógrafos Pieter Hugo e Richard Moss.
The international media continually report alarming news from the African continent. Often the images in these reports document military and social conflicts and the plight of refugees, frequently women and children, forced to abandon their villages to escape violence. These conflicts may seem remote—confined to forests and deserts from another continent. That’s why the work of two contemporary photographers strikes me for effectively placing African affairs at the center of today’s globalized interconnected world: Richard Mosse and Pieter Hugo. - See more at: http://blogs.getty.edu/iris/portraits-of-africa-from-colonization-to-e-w...
Leiam o artigo na íntegra.
Na segunda metade do século XX, os movimentos anticoloniais tornaram-se objecto de inúmeras representações artísticas, grande parte das quais visando reforçar a efectividade desses mesmos movimentos. Entretanto, o trabalho de representação artística reforçou a dinâmica dos movimentos anticoloniais e enformou a própria ideia de militância que lhes era subjacente. Tais representações caracterizaram-se pelo recurso a novos meios de comunicação, nos quais, além da palavra, também a imagem assumiria preponderância. Caracterizaram-se ainda pela capacidade de circulação trans-nacional, que conferiria um novo entusiasmo internacional a muitas das práticas militantes de então. E, finalmente, por o seu modo de produção procurar, em vários casos, fazer a crítica da soberania e do individualismo autoral (recorrendo a relações de maior reciprocidade entre representante e representado, bem como à figura do autor colectivo).
A segunda sessão do Observatório de África, América Latina e Caraíbas será realizada no dia 1 de Março, às 15h, no Auditório 3 da Fundação Calouste Gulbenkian. O tema será A arte do comum e a produção da cultura: o anticolonialismo da imagem militante à guerra das escritas.
Oradores:
Ros Gray, Estudos Artísticos, Goldsmith College, Universidade de Londres
Maria-Benedita Basto, Estudos Literários, Universidade de Paris IV
Comentador:
Luís Trindade, Historiador, Birkbeck College – Universidade de Londres
Sem título, da série "Notre Peau" (2010)
Esa piel ofrece una metáfora de la respuesta africana al impacto que el capitalismo, tecnología y consumismo ha tenido en el continente. La piel es frágil y vulnerable a las agresiones, pero también increíblemente resistente, mostrando una enorme capacidad de regeneración y cicatrización. De forma similar, África y su gente han aprendido a resistir, adaptarse o amortiguar el daño que les han causado.
Leiam a entrevista do artista Maurice Mbikayi.
Artigo de opinião de Thabo Mbeki e Mahmood Mamdani no New York Times.
Just as the violence in South Africa in the early 1990s was a symptom of deep divisions, the same is true of extreme violence in today’s Kenya, Congo, Sudan and South Sudan. Nuremberg-style trials cannot heal these divisions. What we need is a political process driven by a firm conviction that there can be no winners and no losers, only survivors.
Leiam o artigo na íntegra.
Imagem retirada do portal Africa is a Country
A fotógrafa queniana Mimi Cherono regressou ao seu país natal depois de muitos anos na África do Sul e sentiu-se deslocada. Onde é que fica a casa?
In 2008 she produced a solo exhibition, I am Home, on African immigrants living in South Africa. I am Home is series of black and white portraits where Mimi addressed the sensitivity, subtlety and complexity of life in South Africa as an African, as the other other. The humanistic and sensible approach that characterizes this series is also prevalent in a more personal body of work, a series still untitled, exploring her own relation to places, people and spaces of her native Nairobi.
Leiam a sua entrevista ao portal Africa is a Country.
A conferência "African perspectives: The Lagos Dialogues 2014" terá lugar de 10 a 13 de Abril na capital da Nigéria. Procura ser um ponto de encontro para reflectir e debater temas emergentes relacionados com a cidade africana e o ambiente urbano no continente.
Os temas principais serão cinco:
1. A diáspora africana - A cultura e as artes interdisciplinares;
2. Culturas de habitação;
3. Cidades africanas e habitações sociais;
4. Os mundos físicos e virtuais da África;
5. O imperativo verde e as novas tecnologias para a África Urbana.
Para mais informações, consulte o website da conferência.
Começa no dia 13 de Fevereiro mais uma edição dos Seminários CEsA - Centro de Estudos sobre África, Ásia e América Latina. Até 5 de Junho, cerca de uma dezena de investigadores irão participar nas sessões especialmente dirigidas a estudantes, mas com entrada livre para o público em geral. Consultem a programação.
Imagem retirada do portal African Digital Art
"We The People of the Diaspora - Black Culture Exploration" é uma série de ilustrações da artista Jamilla Okubo que mostram as influências das suas raízes quenianas e trinitárias.
Just like quilts, I feel like I can use textiles (designing patterns) to tell stories by creating symbols that represent what I am trying to share or tell. Regardless of whether a print is intentionally telling a story or not, it creates a connection with the person wearing it. For example, Kanga fabric, which comes from East Africa, is sometimes worn to tell viewers something about that person.
Vejam mais aqui.
A exposição "The Rise and Fall of Apartheid - Photography and the Bureaucracy of Everyday Life" abre no próximo dia 13 no Museum Africa em Joanesburgo e apresenta o trabalho de mais de 70 fotógrafos e artistas sul-africanos, incluindo mais de 800 imagens, 27 filmes e um livro.
Leiam a entrevista com o co-curador, Okwui Enwezor (próximo comissário da Bienal de Veneza).
Um artigo do nosso orador Paulo Granjo, inicialmente publicado no jornal Público a 2.9.2010 (via Buala)
Moçambique passou, com o fim da guerra civil, de um regime socializante e paternalista para uma política ultraliberal que trouxe o aumento do desemprego e das elites económicas, coincidentes ou ligadas às elites políticas. Trouxe também a erosão do controle local da população através de instituições partidário-estatais que, se podiam cometer abusos, também podiam canalizar as necessidades e reclamações populares.
Leiam o texto na íntegra.
A primeira sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas, intutulada A economia dos movimentos sociais urbanos: Protesto e revolta em Maputo e no Rio de Janeiro de hoje, tem lugar no próximo Sábado, dia 8 de Fevereiro, às 15h00.
Mais uma sugestão de leitura do nosso orador Giuseppe Cocco a propósito dos protestos no Brasil.
A palavra revolução voltou a circular. Nas ruas, nas praças, na internet, e até mesmo nas páginas de jornal, que a olha com olhos temerosos. Mas, principalmente, em nossos espíritos e corpos. Da mesma maneira, a palavra capitalismo saiu de sua invisibilidade: já não nos domina como dominava. Assistimos ao final de um ciclo – o ciclo neoliberal implementado a partir dos anos 80, mas cujo ápice se deu com a queda do muro de Berlim e o consenso global em torno da expansão planetária do mercado. Muitos dentre nós (principalmente os jovens) experimentam seu primeiro deslocamento massivo das placas tectônicas da história. Mas nossa era não é apenas crepuscular. Ao fim de um ciclo abrem-se amplas oportunidades, e cabe a nós transformar a crise da representação e do capitalismo cognitivo em novas formas de democracia absoluta.
Leiam o texto na íntegra.
A primeira sessão do 4º Observatório de África, América Latina e Caraíbas, intutulada A economia dos movimentos sociais urbanos: Protesto e revolta em Maputo e no Rio de Janeiro de hoje, tem lugar no próximo Sábado, dia 8 de Fevereiro, às 15h00.