O Grande Kilapy, de Zezé Gamboa, apresentado no Próximo Futuro em Outubro, e que chegou às salas de cinema no circuito comercial, acaba de vencer o prémio de Melhor Guarda Roupa no Festival Caminhos do Cinema Português. É um dos filmes referidos no artigo que o habitual cronista do audiovisual da Site Wiriko, Sebastian Ruiz, dedica à evolução das filmografias dos países africanos de língua portuguesa e ao discurso cinematográfico português e de outras nacionalidades sobre as ex-colónias, em que aborda o projecto de Jean Luc Godard em Moçambique, o filme dos italianos Gualtiero Jacopetti e Franco Prosperi sobre a Guerra Colonial e o documentário de Margarida CardosoKuxa Kanema: The Birth of Cinema.
Se podría resumir en tres grandes etapas la aparición del cine en los países de habla portuguesa en África.En un primer momentoel cine nacional no existía como tal aunque había varias iniciativas de pequeñas salas de exhibición propiedad de alguna familia adinerada de Cabo Verde. Estas películas eran en su mayoría producciones realizadas bajo el sello de Hollywood y también representaciones de operetas de los teatros franceses e italianos.
El segundo momento se enmarca durante el período de las independencias y la búsqueda usurpada de la unidad nacional, donde los líderes de la lucha anti-colonial, como Agostinho Neto o Samora Machel, favorecieron la construcción de la imagen con el fin de construir una nueva sociedad. El documental y el reportaje fueron las principales herramientas para crear esta conciencia. En este sentido, el teatro socialista produjo mensajes con fines educativos precisamente, uno de los pilares que subrayara el senegalés Ousmane Sembène en la década de los sesenta: “¿Por qué el realizador debe desempeñar semejante papel? Porque, como muchos artistas, es quizás más sensible que otras personas. Los artistas conocen la magia de las palabras, de los sonidos, de los colores, y utilizan estos elementos para ilustrar lo que los demás piensan y sienten. El realizador no debe vivir recluido en su torre de marfil; tiene una función concreta que desempeñar
A Conferência Africana de Economia Criativa decorreu de 11 a 15 de Novembro de 2014, em Rabat, centrada no debate sobre as indústrias culturais e criatiavas em África, sob o lema: A cultura é a solução.
O El País ouviu Aadel Essaadani, porta-voz de Arterial Network e o poeta sul-africano Pitika Ntuli e convocou referências como o escritor senegalês Cheikh Anta Diop para fazer um retrato de um encontro que lidou com questões como a herança colonial, a distinção entre os elementos comuns e diferenciadores das culturas africanas, o impacto de eventos como 1:54 Contemporary African Art Fair e a relação com o Norte.
“En algunas regiones de Nigeria, Ghana y Sudáfrica, el cordón umbilical de los bebés no se corta: se espera hasta que cae en la tierra y allí plantas un árbol. Ese es el vínculo entre el ser humano y el mundo natural. Es la interconexión, la interdependencia de todo lo que hay; algo como la física cuántica que ya sabían nuestros ancestros indígenas”. Así explica el poeta sudafricano Pitika Ntuli que África debe volver a ser África, sin buscar el reflejo (a veces poco nítido) del Norte.
Para bajar a tierra, para hacer del vínculo entre países una misión real y “para no seguir diciendo que África tiene patrimonio humano, cultural y artístico pero que no somos capaces de hacer fructificar, tenemos que trabajar por la formación”, afirma contundente Aadel Essaadani, portavoz marroquí de Arterial Network, una asociación internacional africana “cien por cien civil” que trabaja por el desarrollo humano, social y cultural, con sede central en Sudáfrica y cinco secretariados regionales en Marruecos, Mali, Gabón, Kenia y Senegal. “Para acceder a la calidad, debemos tener técnicos formados y administradores profesionales”, explica Essaadani, hundiendo sus pies en el terreno.
Lina Martínez Hernández , doutoranda de Hispanic Studies na Universidade de Pennsylvania, tem como temas de investigação Literatura Caribenha e Hispânica, queer latino-americano e as tradições intelectuais latino-americanas. No site Africasacountry escreve sobre a relação entre a academia americana e os Estudos Hispânicos.
Henríquez Ureña’s main concerns shaped the debates regarding the region: is there a unique Latin American expression? Is Latin America always defined by foreign influences? Is there an alternative to the oscillation between dogmatic nationalisms and the adoption of European or U.S. political and cultural models?
The debate changed radically during the second half of the 20th century. The Cuban revolution, the international relevance of authors from the Latin American boom–Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, and Carlos Fuentes, among others–and the dictatorships in the Southern Cone transformed the questions regarding what Latin America was and who was “qualified” to talk about it.
Ángel Rama (1926-1983), an exiled Uruguayan writer and cultural critic, was central to this rhetorical and political shift. Rama taught in Latin America and in the U.S. academy. He brought Jean Paul Sartre’s model of the “committed intellectual” to the fore in Latin American discussions. This meant asking what is the role of scholars and intellectuals in the material and political realities of Latin American nations. Asking this from U.S. classrooms represented a particular challenge, one that intensified the frustration that endures to this day.
If literature and artistic expressions are now understood as part of an ideological practice extended throughout the region–often times denouncing the impact of U.S. intervention in Latin America–, how can Latin American scholars in the U.S. mediate the inherent contradictions that arise between their political filiations and their institutional commitments? For Rama, his fight against the U.S. migration service heightened this dilemma, after authorities denied him a visa to continue teaching at the University of Maryland. This remains a common problem faced by Latin American scholars working in the U.S. today.
Imagem: ‘Baoba’s Dream’ featuring artist Iris Chocolate. National Museum for Natural History, Luanda, 2013.
Houghton Kinsman entrevistou a curadora Suzana Sousa, que fala sobre a necessidade de infraestruturas eficientes e da contribuição dos jovens artistas para a reconfiguração do discurso artístico em Angola.
Houghton Kinsman| How would you describe the current artistic climate of Angola? What are some of the most exciting/challenging elements facing the discourse?
Suzana Sousa | Currently, the artistic climate in Angola is still marked by the few existing exhibition spaces, some run by governmental institutions and others by international cultural institutions. However, more recently the international attention on the work of young artists has shaken the construction of artistic discourses that were essentially based on local culture and identity. This is something that I find exciting, especially the balance, still in the making, between a global artistic language and reflections on local histories and aesthetic elements.
In thinking about the development of the artistic landscape in Angola, what are some of the challenges that you have found working in Angola?
I think, the lack of public grants/funds for art and culture, is the biggest challenge. Although it is always possible to work with private companies as sponsors, there is another set of demands in regards to working with the economic sector.
A Critical Perspective on Emerging Artistic Practice in Angola, em Another Africa
Em determinado momento de Tristes Trópicos, Lévi-Strauss diz que “o mundo começou sem o homem e terminará sem ele”. Esta frase poderá ser medonha para o ser humano narcísico contemporâneo. Ele é aquele que, na posse de todas as tecnologias existentes, não apenas se julga a razão de ser da criação como equaciona já a sua própria eternidade. Isto, claro, enquanto sobrevivente do mundo que ele próprio vem destruindo. (Curioso como ele não se importa de destruir o seu mundo e ir ocupar outros mundos no recém-estreado filme Interstellar, de Christopher Nolan.) A frase de Lévi-Strauss será medonha na medida em que ameaça esse ultra-narcisismo dos seres que ocupam apressada e vorazmente todo o espaço em volta.
Porém, a clareza e a objectividade daquela frase podem provocar outras reacções. Uma reacção de inactividade, de tipo letárgico, que se traduz na atitude de, perante os factos, achar que não há nada a fazer, que nenhum esforço é merecido, que não vale a pena qualquer intervenção ou compromisso com o mundo. Ou uma reacção de voracidade. Ora, a fotografia é, na actualidade, um excelente exemplo dessa apropriação exaustiva do mundo que é também, ao mesmo tempo, expressão do consumo imparável.
Saltemos o tempo em que a fotografia implicava uma produção complexa, exigia um enorme domínio da tecnologia e era um objecto de raridade, olhada como a actividade que tinha ousado atentar contra a suprema habilidade da pintura. Saltemos também os dilemas de Walter Benjamin sobre a possível perda da aura da obra de arte, dada a sua reprodutibilidade possível e infinita. Hoje, a par de uma minoria de fotógrafos que recorrem à metodologia da “antiga fotografia” e que são uma espécie de artesãos da imagem, basta a qualquer utilizador de telemóvel reclamar-se fotógrafo para ser como tal reconhecido por um número excessivo de pares que o incensam com um simples like nessa função. E dado que as redes sociais impõem a quantificação como critério supremo de classificação, eis que uma imagem vulgar pode ter centenas de milhar de likes e uma fotografia de autor não ter direito a qualquer like.
Dir-se-á que, ainda assim, com certeza haverá uma diferença entre estes fotógrafos de impulso e os fotógrafos profissionais; estes últimos têm, antes da fotografia, um pensamento sobre a fotografia (que por vezes justifica alguma lentidão no processo de produção). Mas estes são os poucos fotógrafos crentes, que ainda vivem a fantasmagoria da imagem, aquela que provoca o sentimento de ausência, de desejo, de fantasia. De resto, concordemos: os resultados são muito semelhantes. Entre os milhões de fotografias feitas por impulso e os milhares de fotografias produzidas por profissionais e expostas em feiras, bienais, websites, livros, há uma semelhança de atitude — e, até, alguma continuidade.
A continuidade vem quer dessa incontinência de clicar, quer porque qualquer fotografia devolve ao observador o facto de ela resultar da interrupção de um momento e do seu consequente aprisionamento dentro de quatro margens. Em cada uma delas pode estar o desejo de ser continuada para lá dessas margens, de poder conter um enquadramento em expansão permanente. Assim, tanto nas feiras de fotografia como no rolar das imagens no iPhone ou no tablet está presente e subentendido um exercício: colar pelas margens todas as fotografias do mundo, criando como que um mapa universal onde todas as subjectividades estivessem contidas.
Trata-se de um paradoxo, é certo, porque nesta compulsão de produzir tantas imagens não está presente outra coisa se não a predação continuada do mundo e o desejo de imortalidade. À medida que crescem exponencialmente os auto-retratos, os famosos selfies, mais sentido faz a afirmação de Joan Fontcuberta — “Eu fotografo. Eu existo!” — e mais esta projecção narcísica se expande por todo o espaço em redor: “Acentuou-se a necessidade de capturar tudo e tudo pode ser fotografado — e, mais ainda, tudo pode ser mostrado… As fotografias transformaram-se em expressões de vitalidade, experiências que são transmitidas, partilhadas e depois desaparecem mental e fisicamente” (Joan Fontcuberta, em Pandora’s Camera). Este autor e fotógrafo não tem uma visão necessariamente pessimista da fotografia digital, até porque ela permitiu que o horror dos prisioneiros de Abu Ghraib fosse testemunhado em todo o mundo, mas não deixa de afirmar que o digital abriu a caixa de Pandora — e ainda só estamos no início... Estas imagens aceleraram um processo de inversão: já não são imagens do mundo, elas fazem o mundo e, como são apenas media, de alguma maneira há muito já extinguiram um certo mundo, o mundo dos fenómenos (chuva, vento, carícias, medo, luta, etc.). Restaram pois as imagens e os seus predadores.
O escritor brasileiro Milton Hatoum e o poeta sírio Adonis estiveram no Próximo Futuro, a 21 de Setembro de 2013, para uma conversa sobre literatura. O jornal Público chamou ao encontro "dueto de titãs", onde quem estava presente pôde ouvir Adonis dizer um poema seu em árabe, um dos momentos registados por Luís Caetano, para a Antena 2. A Força das Coisas de 1 de Novembro de 2014 é dedicada aos dois escritores.
Imagem: Ousmane Sow, fotografia de Jean Christophe
«Les Magiciens de la Terre», exposição de 1989 no Centre Pompidou, o leilão de uma obra de Ousmane Sow, a venda «African Stories» no Piasa, a feira londrina dedicada à arte africana 1:53, a Frieze: pontos referidos no artigo do jornal francês Le Figaro, em que se analisa o mercado da arte africana, e a relação do público francês com arte deste continente, a própria designação/etiqueta de "arte africana" e como os artistas se relacionam com ela.
L'étude Millon, qui dispersait 81 œuvres d'art contemporain africain, en avait fait son point d'orgue. L'ensemble, réalisé en 1990 et intituléZoulous, du nom de cette ethnie conquérante d'Afrique du Sud, était estimé entre 200.000 et 300.000 euros par le spécialiste de l'étude Millon, Eddie Hautchamp. Lors de la précédente grande vente qui lui avait été consacrée, Ousmane Sow n'avait même pas atteint ce prix. En 2009, seulement deux des dix pièces présentées chez Christie's avaient été vendues, dont Guerrier debout, à 121.000 euros. L'ancien kinésithérapeute de Dakar était alors connu depuis dix ans grâce à son exposition de guerriers pétris de terre africaine sur le pont des Arts, à Paris. Depuis, l'artiste est devenu le premier Africain de l'Académie des beaux-arts, en 2013. Et, depuis hier, le grand Sow est aussi un géant du marché de l'art contemporain africain. Une exception.
(...)
En France, depuis l'exposition «Les Magiciens de la Terre», en 1989 au Centre Pompidou, on n'a rien fait de mieux pour mettre en lumière la scène africaine. L'événement fut tel, que Beaubourg a remonté cette présentation des «cultures invisibles » l'été dernier. Afrique, Asie et Océanie étaient concernées. Mais d'où vient que l'on reste myopes sur l'Afrique ? «Certains photographes de renom revendent à des ateliers d'artiste leurs clichés bien cotés, au mépris de la logique du marché », déplore un professionnel, à Paris. «Au pays, dès qu'un artiste émerge, un atelier de copistes apparaît », maugrée un peintre africain.
Après vingt ans dans la diaspora en France, le Camerounais Barthélémy Toguo a, lui, décidé de créer un centre d'art à Bandjoun, où l'art classique africain est très implanté. Mais il refuse d'être cantonné à la scène africaine. Barthélémy Toguo était à Frieze avec la galerie Stevenson, à la Fiac avec la galerie Lelong, mais pas à 1:54. Millon n'a d'ailleurs pas voulu intégrer cet artiste trop international à son catalogue africain. «Certains artistes sont présents dans les collections de musées tels que le Centre Pompidou, la Tate Modern ou le MoMA à New York. Mais leur présence sur la scène artistique africaine n'est toujours pas clairement identifiée », observe André Magnin.
"500 anos de futuro": é o mote da 2ª Bienal de Arte Contemporânea de Montevideo, no Uruguai, que começou em Setembro e termina amanhã. O evento juntou mais de 40 artistas do Uruguai, Chile, Argentina, Alemanha, India, África do Sul, Brasil, China, Costa Rica, Albânia e Honduras, ocupando vários lugares da capital, na zona da Ciudad Vieja, em edifícios patrimoniais que receberam obras contemporâneas. Pensar a arte e o tempo está na raiz desta segunda edição, como se lê no site da organização:
La distancia que separa el presente del futuro se mide de modos diferentes y en unidades de medida variables en cada época. Ora el futuro parece estar al alcance de la mano, ora se aleja hasta lo inalcanzable. En ocasiones esta distancia se mide en nano segundos, otras en años, décadas y siglos. Los ingenieros intentan traducir la dimensión temporal a otra espacial y determinar la distancia entre presente y futuro con categorías físicas como millas, horas, kilovatios, o con el tacómetro, mientras que a los artistas les toca –no pocas veces– registrar las ruinas que bordean ese camino. Mientras que en el arte esta distancia es vivenciada de forma extremadamzente subjetiva y no lineal, la ciencia y la tecnología aspiran a la objetividad y plausibilidad.
El temor al mañana o, por el contrario, su anhelo, hará aparecer siempre al futuro en un matiz y extensión diferentes.
A Revista Clarín publica um artigo sobre o evento:
Estos espacios con tanta carga histórica, fueron intervenidos por una serie de artistas internacionales: algunos de ellos realizaron obras site-specific , otros acondicionaron sus trabajos para ser expuestos aquí. El alemán Franz Ackermann se quedó 20 días pintando en los balcones del Banco Central. Adrián Paci envió su video desde Albania, lo mismo que Julián Dupont desde Colombia (ambos los proyectan en el Anexo, allí ocurren alusiones a las antiguas fantasmagorías, inmersiones en una cueva iluminada por proyecciones, otro tiempo: la construcción de una realidad alternativa, su detención). El uruguayo Federico Rubio colgó sus fotos, Paysandú, en el hall del Banco, increíbles paisajes desolados que son más bien naturalezas muertas.
Bajo la atenta dirección del curador general, de Tavela, y también de la directora ejecutiva de la Bienal, Graciela Rompani, el mix curatorial se nota: en comparación con la primera edición de la Bienal existe una maduración, un mejor despliege espacial, selección de artistas y sobre todo, una sagacidad más específica en la expografía. Pasa como con todo, los eventos van creciendo y consolidándose con el tiempo. Idem aquí. Esta edición es una hermosa y pequeña joya, en especial en referencia a estos montajes curatoriales exhibidos en el gran hall del Banco Central y en la antigua iglesia.
Gran hall del Banco Central: con su imponente techo curvado, abovedado, quiebra el espacio en la entrada un tremendo dibujo de escala mural del argentino Eduardo Stupía,Paisaje . Tamaño dibujo esconde todo lo que viene después, aunque se presiente por el sonido: lo marca Pachacutik, las seis máquinas de humo a presión de la uruguaya Lucía Pittaluga. Ellas dan la pista de que hay algo más allá de este mundo de Stupía. Efectivamente, cuando uno da la vuelta al dibujo, del otro lado se encuentra con el gran mural de Ackermann y un especial reloj de madera, Standard time, del artista alemán Mark Formanek. Construido durante una performance el primer fin de semana de la bienal, y realizado con palos de madera rústicos y un conjunto de obreros que iban clavando las horas, minuto a minuto, a medida que pasaban, conformaban los números con una tipografía hecha en madera de estilo rústico y apariencia toscamente digital. La obra expone la representación del tiempo, a la vez que el transcurrir del tiempo real, marcado por el ritmo del trabajo de los obreros. También expone algo a medio camino entre lo artesanal, lo mecánico y lo digital. La perfo duró 24 horas seguidas.
Otra obra sobre el tiempo, Tiempo muerto, del uruguayo Fernando Alvarez Cozzi -escondida en el Anexo tras unas cortinas cuyo acceso es a través de una puertita, quizás debido a su contenido con algo de erotismo-alto-voltaje- expone una ficción en donde la realidad se volvió extraña pero próxima: muestra las grandes ciudades con su soledad, usuarios conectados a chats de Internet buscando sexo virtual, voyeurismo o contacto para sus fantasías más bizarras, nunca blanqueadas ante sus amigos o familias. Mucha imagen de urbanidad bella y cierta soledad muy triste.
Em que medida as mulheres estão representadas como criadoras, no cinema africano? Que temas tratam? O que caracteriza a presença das mulheres? Que barreiras enfrentam? Perguntas feitas por Lizelle Bisschoff no texto "Gender Equality, Women and African Film", incluído no documento da Unesco dedicado às questões de género e igualdade, em termos culturais.
Female African filmmakers, like female directors all over the world, are hugely underrepresented in comparison to their male counterparts. Statistics show that women make up less than 10 per cent of film directors and less than 15 per cent of screenwriters internationally (Dovey, 2012). This also means that female directors are much less visible than male directors in the fi lm industry, and the small handful of award-winning or internationally – renowned female fi lmmakers are regarded as an unusual oddity. Despite the underrepresentation of women in the African film industries, film in Africa has huge potential to enable consciousness-raising, storytelling and creative expression, perhaps even more so than other creative industries due to the prevailing economic, social and political barriers to literacy in many African countries, especially for young girls. The social and political currents in contemporary African societies involve new levels of critical awareness. Film, when used as a tool in this process of awareness-raising, becomes a terrain in which conventional and stereotypical representations are challenged.
O texto citado integra o relatório Gender Equality: Heritage and Creativityque dá conta, pela primeira vez, do estado da igualdade de género, em relação a acesso, participação e contribuição para a cultura, um dos focos desta instituição. Baseia-se em documentos da ONU e em resoluções da Assembeia Geral, incluindo o Plano de Acção para as Políticas Culturais do Desenvolvimento da Conferência de Estocolmo de 1998, o relatório da Unesco sobre Diversidade Criativa de 1995, inquéritos enviados aos estados-membros bem como estudos de caso em vários países do mundo.
A UNESCO Global Priority, gender equality refers to the roles and responsibilities of men and women, along with gender dynamics, created and embedded in families, societies and cultures. UNESCO’s approach to promoting gender equality is based on a commitment to cultural rights and cultural diversity, underpinned by the international human rights framework. From this angle, cultural diversity and human rights must be seen to be mutually beneficial, with gender equality as a precondition for genuinely people-centred development. This was the argument that I brought to the 2014 Commission on the Status of Women, where I joined other UN leaders in highlighting the need to tackle all forms of discrimination against women and girls, including through discriminatory laws, social norms, practices and stereotypes. In all development efforts, we must ensure that culture is never invoked to justify the infringement on, or limitation of, human rights.
Do prefácio, por Irina Bokova, Directora-Geral da Unesco
Culture is in constant motion and is always linked to power relations. Cultural rights must be understood as also relating to who in the community holds the power to define its collective identity. Belonging does not confer equality within the community, and there can be multiple views within a community as to the elements that constitute the essentials of one’s culture. It is imperative to ensure that all voices within a community, representing the interests, desires and perspectives of diverse groups, are heard without discrimination.
Discourses that essentialize cultures, presenting cultures as monolithic, static and ahistorical, must be vigorously contested to ensure these no longer form the basis for challenging the universal legitimacy and applicability of human rights norms. Under international human rights law, no one may invoke cultural diversity to infringe upon or limit human rights. International human rights norms clearly state that restrictions on the cultural rights of women, which ultimately amount to restrictions on the principles of non-discrimination and equality, must not be imposed to preserve cultural diversity. In addition, the cohesion of a specific cultural community – be it transnational, national or sub-national –should not be achieved to the detriment of one group within the community, such as women.
Farida Shaheed, relatora especial na área dos direitos culturais, nomeada pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e activista dos direitos das mulheres
O jornalista britânico David Goldblatt faz, neste livro, um percurso pela história do Brasil, através do 'desporto-rei', desde o século XIX até aos nossos dias, abordando as diferenças entre as altas esferas do negócio e o público popular, as tensões políticas em torno do jogo, e como elas se reflectiram em figuras como Pelé ou Garrincha.
Goldblatt starts his tale chronologically, with the return, in 1894, of Charles Miller, a Brazilian son of a Scotsman, from his education in England. At his arrival at the port of Santos, in São Paulo, he carried a pair of boots, a rule book and a football. A decade later, football was already a craze in Brazil, with Miller’s passion expanding in São Paulo and other Brazilian-Europeans arriving shortly afterwards with a contagious love of the sport to Rio de Janeiro and other major Brazilian cities.
From here on, although he still works in a mostly chronological order, Goldblatt divides his book in themes which he aligns with what he considers to be distinct eras of Brazilian football: first as an amateur sport for the upper class communities of European expats and its descendants; then, as professionalization became widespread (even if not legal yet), as a sport where the poor, or non-white could become, even so briefly, part of the elite; and so on. Goldblatt’s insistence on dealing with themes, rather than describing a mere sequence of events, does a wonderful job of explaining how football is interconnected with every aspect of Brazilian life. But, for those not initiated with Brazilian history and politics, like me, it can get confusing at certain moments, with his jumps back and forward between years, governments and tournaments.
James Webb, nascido em 1975, em Kimberley, tem formação em Teatro, Religião Comparada e Publicidade, e assina instalações sonoras em vários trabalhos, numa linguagem multimedia que vai além do som. Numa entrevista ao site Another Africa, onde se pode ouvir a sua recriação da canção de protesto de T. Rex "The Children of the Revolution", fala do seu percurso e da sua obra.
How do you think your studies have influenced your artistic practice?
Theatre, Comparative Religion and Advertising might sum up my strategies too neatly, and although they don’t directly relate to Contemporary Art and experimental music, they have affected my work greatly, and continue to do so.
I like that in Theatre there is talk of the “company,” which includes everyone from the director to the lighting operators. This view of a group of people involved in a project together makes a lot of sense to me, especially as it challenges the hierarchical notion of the artist as a hermetic genius.
Comparative Religion probes our differences as well as our similarities. It shows the presence of belief in all the things we do: from simple superstition to the way we regard each other in terms of our private politics and views on an afterlife. Our world history is very much linked to religion. It’s found in our schedules, fashion sensibilities, jurisprudence, and diets. Whether we like it or not, humans are meaning seeking creatures, and religion and spirituality have played vital roles in the way the world is today.
Advertising is about other people, and communicating particular messages. It is also a highly polished financial machine capable of stretching all over the globe and influencing us in many different, positive and negative ways. It should be scrutinised extensively.
Are you drawn to sounds just for their own aesthetic qualities first or are you also listening to them as, say, a political or social texture?
In terms of sounds, I am very interested in what they could represent, and how those meanings change with context and presentation. Aesthetics play a strong part, alongside my interest in the “conceptual” and “social” interpretations that can be generated. There is always an emphasis on the political, poetic and social readings of sounds in my work, but also an invitation for the audience to personalise the pieces in some way. My ongoing, worldwide intervention, There’s No Place Called Home (2004, ongoing), is a good example of this. Here I conceal audio speakers in trees and broadcast the songs of birds that would never be found in that area, e.g. non-migratory Canadian birds in trees in Reims, France (There’s No Place Called Home (Domaine Pommery), 2011). Aside from anthropomorphic ideas of avian musicality, bird vocalizations are generally used to mark territory and attract mates. The introduction of new, geographically unique birdsong into a site generates a multitude of readings pertaining to human and animal migration, ecological contingency, territory marking, communication streams and folkloric magic. And it normally sounds very beautiful too…
Jihan El-Tahri é uma reconhecida documentarista libanesa, que começou a carreira como jornalista de televisão, cobrindo o conflito do Médio Oriente. Mais tarde, dedicou-se aos documentários, tendo produzido filmes para a BBC inglesa, a PBS americana e a televisão francesa. The House of Saud, The Price of Aid, vencedor de um prémio europeu de documentário em 2004, e Cuba: An African Odysseyestão entre os seus trabalhos mais conhecidos. De 2009, Behind the Rainbow, é uma análise da transição democrática na África do Sul. Actualmente, a realizadora está a preparar um filme de 3 horas, com o título provisório Egypt’s Modern Pharaohs, e é autora dos livros The 9 Lives of Yasser Arafate Israel and the Arabs: the 50 Years War . Em entrevista ao siteAfricaisacountry, Jihan El-Tahri falou do seu percurso profissional.
What is your first film memory?
I actually remember watching Shadi Abdel Salam’s The Mummy at a hotel screening in London when my family moved there. I was around 5 and I knew I was Egyptian and the mummy terrified me but got me very curious. I remember the lighting of the film until today. It made these ancient stories so real and timeless.
Why did you decide to become a filmmaker?
I started off as a journalist because I truly believed that journalism is the first draft of history and if done properly it could actually change the world. Young and idealistic I thought I could change the world single handedly … Alas, the Gulf war of 1990 was a rough wakeup call. It is then that I realized that I needed to reassess many things, including my own identity and what stories were important for me to engage in. I finally realized that I could only tell one story at a time if I wanted to do it properly. Documentary was the obvious choice. I made numerous “observational” films but that still was not satisfying. Then one day I was hired to work with a company in the UK and they gave me their last film series to watch: Death of Yugoslavia. A 7-hour series that I stayed up all night watching. There and then I decided that that was the kind of documentary filmmaking I wanted to pursue.
Festival de Artes Palestiniano, desfile em Ramalah em comemoração da primeira intifada. Foto Uriel Sinai para o The New York Times
O festival de artes palestiniano Qalandiya International acontece de 2 em 2 anos. O desfile evocativo da primeira intifada, quando dominava a ocupação militar israelita e não se via nas ruas a Autoridade Palestiniana teve, em 2014, um ambiente urbano diferente, com forças da Autoridade Palestiniana a bloquearam as ruas para os artistas passarem, numa tranquilidade em nada semelhante aos anos 80, até que a polícia à paisana deteve dois jovens mascarados que distribuiam reproduções de panfletos da época a incitar à resistência. O jornal americano The New York Times fez a reportagem do local dos acontecimentos:
“Sometimes art is more political than politics itself,” said Khaled Hourani, a Palestinian artist who helped organize the procession. “In a way,” he said of the mask episode, “it became part of the show.”
Putting on an arts biennale anywhere is complicated. Here, the festival, Qalandiya International, faced special challenges in catering to a Palestinian society that is highly politicized, physically fragmented, internally divided, partly autonomous but still struggling against Israeli occupation, and not given to displays of frivolity or celebration.
The timing of the biennale, from late October to mid-November, raised more questions about appropriateness, so soon after the death and destruction of this summer’s 50-day Gaza war.
“There was a discussion,” said Jack Persekian, director of the Palestinian Museum, now under construction, and an organizer. “But it is a celebration of continuity, of life, of steadfastness and, if I may, resistance. There was no doubt we should go on.”
If anything, the festival has served to underscore the intense interplay between art and the Palestinian cause.
Houghton Kinsman parte da constação do crescimento económico e artístico de várias cidades africanas, socorrendo-se da expressão "afropolis", de Achille Mbembe que, com o termo, designa as grandes cidades transformadas em espaços cosmopolitas, reconfiguradas por fluxos complexos e assimétricos de ideias, bens, capitais e pessoas. Houghton Kinsma analisa, em particular, o caso de Joanesburgo, e a zona de Newtown, "nascida do desastre", por ter sido afectada por um enorme fogo no início do século XX.
By providing inspiration, preserving history and encouraging cultural participation, these cities have an increasingly multifaceted role in helping shape their country’s artistic discourse. The city’s ability to provide access to museums, its urban atmosphere and cultural, political and religious diversity are but a few of the factors that characterize a city’s influence on creative practice. Therefore, as these major African cities undergo renewal in order to provide the necessary infrastructure to position themselves as “global African cities,” questions inevitably arise over the consequent implications associated with urban redevelopment.
The dichotomy that exists between renewal and preservation within this discussion is a compelling phenomenon that can arguably be seen nowhere more pertinently than in Johannesburg. Long since considered a major economic and cultural city in South Africa, Johannesburg has and is undergoing continued urban renewal, especially in its arts precincts like Maboneng and Newtown. Mirroring major urban redevelopment in international cities such as Berlin, New York and London, Johannesburg is beginning to find success in reimagining its cultural landscape, in speaking with former Johannesburg mayor Mpho Parks Tau, it is “a city at work to remake itself.” As a result, Maboneng has blossomed into a – privately developed – arts mecca with lofts, chic cafés and independent movie theatres, and after numerous failed redevelopments, Newtown is finally beginning to realize its potential as the precinct awaits the R1.3 billion Newtown Junction shopping center. This reinvigoration – of Newtown in particular – which was conceptualized as early as 2005, has seemingly done wonders for the cultural and artistic climate of the city.
(...)
Playing host to numerous museums, galleries, and cultural spaces – most of which have either been initiated or developed in accordance with the renewal, Newtown now boasts institutions such as Museum Africa, the Goodman and Stevenson Galleries, Mary Fitzgerald Square and the Market Theatre. Additionally, the precinct has recently welcomed the Turbine Hall Art Fair – an event that arguably best embodies Newtown’s transformation, having developed out of renovations to the precinct’s iconic Turbine Hall. With the fair established in order to highlight local young emerging artists, it serves as a reminder of the reciprocal relationship between artist and city. Consequently, it is no surprise that the development of Newtown’s creative landscape continues to have a significant impact on those working in the city.
O livro Disculpe que no me levante reúne textos inéditos de autores latino-americanos, em torno da temática da morte, explorando abordagens contemporâneas a um assunto que sempre teve forte presença na literatura daqueles países e que hoje enfrentam novos desafios sociais que interpelam a criação. Entre os autores, está a argentina Selva Almada, presente na Festa da Literatura e do Pensamento da América Latina do Próximo Futuro em Junho de 2014.
Cuando se habla de muerte aparece México. Primero por sus raíces culturales al acercarse a ella en un sentir singular recogido en clásicos como Pedro Páramo, de Juan Rulfo. Y, segundo, porque en los últimos días, y años, el país vive una relación cotidiana con un tipo de muerte en particular, explica la mexicana Laia Jufresa: “Arbitrarias, violentas, masivas e impunes, que además muchas veces no se nombran como tal. Tenemos (y también tiene Centroamérica) muchos desaparecidos (más de 25.000) (sí, veinticinco mil personas) cuyas familias no pueden con certeza, con un acta, llamar muertos. Son muertos no nombrados, gente que ya no está, y un montón de duelos que no pueden emprenderse cabalmente”. Una situación que ha influido en la escritura, aunque, se lamenta Jufresa, autora de El esquinista, “hay algunos libros notables y también hay mucha basura que, so pretexto de retratar la realidad, coloca la violencia en un pedestal, trabaja con estereotipos y deja de ocuparse de la labor narrativa que es generar mundos propios que se sostengan independientemente de cuánto se parezcan a este”.
“A gente nasce, cresce, amadurece, envelhece, morre. Pra não morrer, tem que amarrar o tempo no poste. Eis a ciência da poesia: amarrar o tempo no poste”
Palavras de Manoel de Barros, no documentário Só dez por cento é mentira, realizado por Pedro Cezar e lançado em 2008.
Nascido a 19 de Dezembro de 1916, em Cuiabá, Manoel de Barros passou a infância no Pantanal, o que terá contribuído para o seu imaginário poético, repleto de imagens da natureza. Aos 8 anos, foi para um colégio interno em Campo Grande, onde conheceu a cultura grega, os sermões do Padre António Vieira e o poeta francês Arthur Rimbaud. Viajou pela Bolívia e Perú, e viveu um ano em Nova York, onde se interessou por arte e cinema. Chegou a pertencer à Juventude Comunista, da qual saiu, tendo sido sempre um defensor da liberdade.
Considerado nome maior da poesia brasileira, conta-se que Drummond de Andrade recusou o epípeto de "maior poeta vivo do Brasil", a seu favor. Deixa-nos 18 livros de poesia, além de textos autobiográficos e obras para a infância. “Ele encontrou a equação perfeita entre natureza e linguagem, inovadora para a história da poesia”, disse ao 'Época' Alberto Muller, professor da Universidade Federal Fluminense. Nos poemas de Manoel de Barros há musgos, sapos, pedras, rãs, árvores e caracóis. “Gosto de alguma coisa na infância que eu tenha mijado nela”, costumava dizer, segundo o mesmo jornal, que o considerou "o poeta das miudezas à espera do infinito". Alguns títulos sugerem isso mesmo, como Livro sobre o Nada (1996) ou Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo. (2001).
O livro premiado pela Academia Brasileira de Letras, Compêndio para uso dos pássaros, de 1960, foi escrito depois de onze anos como fazendeiro, numa propriedade herdada, que o libertou de uma vida no Rio de Janeiro com dificuldades financeiras, período em que se ocupou exclusivamente das lides do campo e praticamente não escreveu. Mais tarde, mudou-se para Campo Grande, onde viveu até ao fim da vida, e ali escreveria mais vinte livros.
Poesia é trabalho, defendia, numa rotina disciplinada que o levava a um quarto onde trabalhava, o "lugar de fazer o inútil", todos os dias, desde as sete da manhã, durante vários anos.
João Guimarães Rosa, que conheceu em 1960, foi uma das suas influências confessas, de quem contava que após ter lido o primeiro livro "ficou roseado". A vontade de descontruir a linguagem e de a tornar uma matéria nova, como tantos dos seus poemas evidenciam, prende-se também com este grande encontro. Millôr Fernandes, jornalista, escritor e humorista, considerado pelo poeta "o homem mais genial do Brasil" foi outro nome decisivo, quando no final dos anos 80 começou a escrever sobre os livros de Manoel de Barros, dando-lhes visibilidade a uma escala até então inédita. Ganhou duas vezes o prémio Jabuti em 1989 e 2002, entre vários outros prémios.
Casado com Stella desde 1947, que conheceu no Rio de Janeiro, onde se formou em Direito, tiveram três filhos, dos quais dois morreram, em 2007 e 2013. Foi em 2013 que editou o seu último livro, Portas de Pedro Viana. Muitas páginas de apontamentos e notas soltas ficam agora entregues aos seus herdeiros, embora seja conhecido que, nos últimos meses, a fragilidade da sua saúde e a tristeza da perda dos filhos o tivessem afastado da escrita, segundo notícia de CampoGrandeNews.
Ao jornal Estadão, por ocasião da publicação de O Menino do Mato, em 2010, disse que, a escolher uma palavra preferida, seria"criança", com dúvida aberta para "borboleta".
O POETA
Vão dizer que não existo propriamente dito. Que sou um ente de sílabas. Vão dizer que eu tenho vocação para ninguém. Meu pai costumava me alertar: Quem acha bonito e pode passar o resto da vida a ouvir o som das palavras Ou é ninguém ou zoró. Eu teria treze anos. De tarde fui olhar a cordilheira dos Andes que se perdia nos longes da Bolívia E veio uma iluminura em mim. Foi a primeira iluminura. Daí botei meu primeiro verso: Aquele morro bem que entorta a bunda da paisagem. Mostrei a obra pra minha mãe. A mãe falou: Agora você vai ter de assumir as suas irresponsabilidades. Eu assumi: entrei no mundo das imagens.
Isabel Noronha é considerada um nome fundamental do cinema moçambicano. Nascida em 1964, em Maputo, filha de pai goês e mãe moçambicana, ingressou , em 1984 no Instituto Nacional de Cinema. Foi membro fundador da primeira cooperativa independente de Video ( “Coopimagem”) e da Associação Moçambicana de Cineastas. Assinou vários filmes, de que se destaca Ngwenya, O Crocodilo, em torno da figura do pintor Malangatana, distinguido pelo Festival de Milão como melhor documentário de África, Ásia e América Latina.
A sua obra é marcada por temáticas ligadas à construção social e identitária da sociedade moçambicana. Exemplo disso, A Trilogia das Novas Famílias, Prémio Kuxa –Kanema, melhor filme moçambicano de 2007, apresentada no Próximo Futuro em 2010, é um conjunto de três curtas metragens documentais sobre crianças órfãs, devido a mortes por HIV, que são adoptadas por outras famílias nas suas comunidades.
Desenvolveu a partir de 2008, com a realizadora de animação brasileira Vivian Altman, uma linha cinematográfica entre o documentário e a animação, o que permite tratar temáticas delicadas sem expor a identidade dos testemunhos. Neste âmbito, destacam-se os filmes “Mãe dos Netos,” ( 2008), “Salani” (2010) e “ Meninos de Parte Nenhuma” ( 2011).
Espelho Meu (2011), co-realizado com Vivian Altman ( Brasil), Firouzeh Khosrovani ( Irão) e Irene Cardona ( Espanha) é um documentário/ animação, sobre a auto-imagem de mulheres de diferentes culturas, nos quatro continentes: o filme venceu o primeiro prémio no festival Documenta Madrid 2011 e Mujerdoc 2012.
Além do cinema, Isabel Noronha dedica-se à investigação. Licenciada em Psicologia Clínica e Aconselhamento pelo Instituto Superior Politécnico Universitário (ISPU), onde também leccionou, é mestre em Saúde Mental e Clínica Social pela Universidade de Léon, na Espanha, e actualmente está a fazer um doutoramento em Antropologia na Unicamp, em Campinas. Foi nesta cidade que deu uma entrevista sobre o seu percurso, como começou a fazer cinema, a sua experiência em Moçambique colonial e pós-independência, as eleições recentes no seu país e no Brasil.
Desde cedo Isabel soube o que era viver em uma sociedade segregada. “Se Moçambique não vivia em um apartheid declarado, era de qualquer modo uma situação clara de estratificação social, com a divisão geográfica e social por raças”, ela lembra. Perto da bela orla marítima viviam os brancos, de ascendência portuguesa. Depois vinham os mestiços, como os portugueses-indianos de Goa. Em seguida vinham os estrangeiros que não procediam de colônias portuguesas e, finalmente, os mulatos e negros, a maioria em situação de extrema pobreza – quadro que melhorou, mas não foi totalmente modificado, pois metade da população vive abaixo da linha da pobreza, segundo dados oficiais e das Nações Unidas.
(...)
A trajetória de Isabel Noronha mudaria em um dia, no início da década de 1980, quando encontrou na rua um grupo que estava envolvido na produção de “O tempo dos leopardos”, primeiro longa-metragem moçambicano, em co-produção com a Iugoslávia. Estavam juntos o cineasta Camilo de Sousa (seu futuro companheiro), o jornalista Machado da Graça e Luis Patriquim, que assinaria o roteiro.
Do encontro surgiu o convite para Isabel participar da produção, mas havia uma grande barreira. Ela era uma “improdutiva”, e não conseguiria o emprego, a menos que aceitasse uma condição: teria que obter um laudo psicológico indicando que tinha sofrido um esgotamento nervoso, e por isso não pôde trabalhar anteriormente. Assim foi feito e ela se tornou assistente de logística da produção moçambicano-iugoslava, que teve direção geral de Zdravko Velimorovic.
(...)
A AIDS continua um grande desafio. São 1,5 milhão de infectados, em uma população de 22 milhões de pessoas. Estima-se que 85 crianças nasçam diariamente com o vírus HIV no país, onde a taxa de prevalência é de 11,5%, contra 0,5% no Brasil.
(...)
A “Trilogia das novas famílias” é o retrato desse enorme drama. Os filmes de Isabel mostram a realidade dos novos arranjos familiares criados a partir da tragédia da AIDS. O corpo político e biológico dominado por um novo tipo de imperialismo, o da doença ligada à miséria e ao estigma.
"Conversations: African and African American Artworks in Dialogue" junta duas grandes colecções: a do National Museum of African Art - que viria a tornar-se o Smithsonian- e a colecção Camille O. and William H. Cosby Jr. - da estrela televisiva Bill Crosby, começada nos anos 60 e raramente vista em público. Na comemoração do 50º aniversário do Smithsonion National Museum of African Art, em Washington, mostram-se obras de artistas americanos e africanos, desde o século XVII até à contemporaneidade, em diálogos articulados em torno de temas como espiritualidade, poder e política, memória, família e esfera pública. O New York Times chamou-lhe "Continents in Conversation":
And everything gets a zap of vitality from being seen in the context of African objects from the museum’s holdings. The addition of Africa to African-America naturally implies complicating of the history told by the Cosby collection. But the show’s organizers — Mr. Driskell, working with Adrienne L. Childs, an independent scholar, along with Christine Mullen Kreamer and Bryna Freyer, curators at the museum — don’t explicitly pursue that route. They keep the cross-cultural conversation unpressured and loosely thematic. Some inspired exchanges result.
A few are obvious: a 1970s tempera painting by Mr. Driskell of a cast bronze head from Benin, in West Africa, shares a display case with a splendid example of the real thing. Elsewhere, atmosphere is, at first glance, a binder. Tanner’s “The Thankful Poor,” an image of an older man and boy saying grace at a table, is paired with a smaller painting by the South African painter Gerard Sekoto of a young man sitting alone near a lighted candle. Both pictures are about luminosity, but their moods are different. Tanner’s tableau is serene; the face of Sekoto’s candle watcher is tensed and tight.
Ideals of fashion bounce around between eras and continents. Archibald J. Motley Jr.’s “Senegalese Boy,” painted in Paris in 1929, is of an African subject who, in his white shirt and tie, might easily be in New York or in Chicago, Motley’s hometown. With her lace collar, delicate necklace and elegant empire gown, the sitter in Johnston’s “Lady on a Red Sofa” is clearly dressed to the nines. But so is the woman in a Baule carving from Ivory Coast, who also wears a necklace but whose only other attire is a few strands of beads around her waist.
A série The Samaritans é uma sátira que, através do humor, oferece uma visão crítica da ajuda humanitária em África, explorando aspectos como a capacidade para o lugar dos gestores que nada conhecem das realidades locais, a falta de ética de funcionários "bem intencionados" e a falta de propósito concreto da organização retratada na ficção. O programa foi criada pelo queniano Hussein Kurji, da Xeinium Productions, que falou ao El Pais da ideia do projecto e da reacção do sector da cooperação.
¿Cuálha sido la reacción de la industria de la cooperación con la serie, de las ONG o de los trabajadores locales que trabajan en este sector?
La reacción ha sido realmente grande. En primer lugar, la gente se ha quedado impresionada con la calidad de la producción y la calidad de la serie en sí. Se sorprenden sobre todo de que sea un producto de Kenia ya que no se conoce mucho sobre la industria de la televisión en este país. En segundo lugar, creo que los que trabajan en este sector pueden sentirse identificados con algunos de los personajes, con sus estereotipos, y que la gente se puede reír (tal vez de sí mismos hasta cierto punto). Estamos contentos de que el público reconozca que es una obra de ficción creada para el entretenimiento pero también para la reflexión.
¿Qué opina de lemas como Salvar África?
Sin duda este lema es horrible y crea muchísima negatividad. Tal vez hace más daño que bien.
Eneste sentido, en otra entrevista afirmó que sabía que estaba criticando a una gran máquina pero que le gustaría que la gente hablase y pensase en qué contextos las obras de ayuda de las organizaciones se habían roto. ¿Cree que el diálogo ha comenzado?
Estamos teniendo una gran repercusión en la prensa de todo el mundo, los profesores están discutiendo esta serie en sus aulas, las entrevistas de televisión se centran en la eficacia de la ayuda… Yo diría que este diálogo ha comenzado.
Em 1984, Jorge Luis Borges e o poeta argentino Osvaldo Ferrari tiveram várias conversas, transmitidas na rádio, sobre budismo, amor, Henry James. Agora traduzidas para inglês e editadas pela Seagull Books, no livro Conversations, vol 1, a New York Review of Books publica um excerto destes diálogos dedicado ao tema de "Deus".
Osvaldo Ferrari: Many people still ask whether Borges believes in God, because at times they feel he does and at times that he doesn’t.
Jorge Luis Borges: If God means something in us that strives for good, yes. If he’s thought of as an individual being, then no, I don’t believe. I believe in an ethical proposition, perhaps not in the universe but in each one of us. And if I could I would add, like Blake, an aesthetic and an intellectual proposition but with reference to individuals again. I’m not sure it would apply to the universe. I remember Tennyson’s line: “Nature red in tooth and claw.” He wrote that because so many people talked about a gentle Nature.
Ferrari: What you have just said confirms my impression that your possible conflict about belief or disbelief in God has to do with the possibility that God may be just or unjust.
Borges: Well, I think that it’s enough to glance at the universe to note that justice certainly does not rule. I recall a line from Almafuerte: “With delicate art, I spread a caress on every reptile, I did not think justice was necessary when pain rules everywhere.” In another line, he says, “All I ask is justice / but better to ask for nothing.” Already to ask for justice is to ask for much, too much.
O livro 90º Degrees of Shade: 100 Years of Photography in The Caribbean mostra cem anos de História em imagens, retratando realidades tão diversas como a música calipso, o vudu, o reggae, o tráfego de escravos e o colonialismo, bem como as revoluções e independências, a indústria, o turismo e as diásporas com origens nestes países que viajaram para os Estados Unidos e Inglaterra.
Organizado por Stuart Baker, fundador do Soul Jazz Records, o livro tem prefácio de Paul Gilroy, professor em King's College, investigador das diásporas, autor de The Black Atlantic (1993),There Ain’t No Black in the Union Jack (1987), Black Britain - A Photographic History (2004), entre outros.
O editor do The Guardian Hugh Muir escreve sobre o livro
The Haitian drummer from 1950s Port-au-Prince, meanwhile, symbolises the verve and colour you enjoy whenever the Caribbean lets its hair down. The sight of sugar-cane cutters in a field near Le Carbet, Martinique, in 1959 – working in the hot sun, appearing, as such workers often do, overdressed for the task in hand – could have been taken on virtually any island yesterday. Rastafarians in vivid colours chant psalms in Jamaica. Tourists, now the economic lifeblood for many islands, alight from cruise ships in 1970s Saba.
There are harsh realities too. American troops, incongruous during the Reaganite invasion of Grenada in 1983. An armed Tonton Macoute patroller on the streets of Port-au-Prince in 1980. The man poking his handgun through an open car window during the 1965 civil uprising in the Dominican Republic.
Different challenges, different struggles, but recognisable to any child of the Caribbean diaspora. London/Bridgetown, Birmingham/Kingston, Manchester/Port-au-Prince. We are both sides of that coin.
Abdelwahab Meddeb (1946-2014) foi um nome de referência na reflexão sobre a cultura árabe e a sua relação com a Europa. Nascido na Tunísia, radicou-se em França, onde se destacou como escritor, ensaísta, poeta, tradutor, editor e professor. É autor de vinte livros, de que são exemplo La maladie de l’Islam ou L’exil occidental e ensinou Literatura Comparada na Universidade de Paris X-Nanterre. Director do jornal Dédale, foi também, entre 1974 e 1987, editor nas Editions Sindbad onde divulgou obras clássicas de língua árabe e persa. Era autor do programa semanal "Cultures d'Islam" na rádio France Culture, que lhe presta homenagem e lhe dedica o programa La Grande Table
Abdelwahab Meddeb esteve no Próximo Futuro em 2012, onde falou sobre as primaveras árabes. O livro Grandes Lições. (Vol 1), inclui o seu texto "Depois da Primavera Tunisina: o futuro da liberdade na alvorada do conflito entre laicos e islamistas"
O que hoje acontece na Tunúsia é da responsabilidade de Habid Burguiba, o homem que criou um Estado «educador do povo» (rousseau), com o objectivo de lhe proporcionar o grau de instrução necessário, tendo em vista a disseminação de uma cultura democrática, sem a qual o advento da democracia pode ser desviado (como assistimos actualmente) porque, em democracia, os homens e as mulheres têm uma voz activa. Para que o espírito da liberdade de faça sentir na comunidade, é essencial que todos os votantes tenham a consciência de que são capazes de decidir sobre o que consideram ser o bem comum a partilhar com os outros, servindo-se apenas do livre arbítrio. Enquanto esteve no poder, Habid Burguiba não chegou a por em prática as etapas que conduzem de um Estado autoritário, que instituiu a cultura da liberdade, a um Estado democrático, que assegura o seu exercício.
Sobre o tema das primaveras árabes, deu várias entrevistas:
Jeune Afrique : Commençons par les causes de ce "printemps arabe". Quels sont les facteurs qui ont conduit à ces révolutions ?
Abdelwahab Meddeb : En Tunisie, comme dans les autres pays arabes, nous n’étions plus dans une tyrannie mais dans une oligarchie au sens où Averroès l’entendait : le « gouvernement des vils », c’est-à-dire un pouvoir mû par les mauvaises passions, la concupiscence et la corruption. Les gens en ont tiré une grande lassitude, mais le plus surprenant c’est qu’en Tunisie la révolution n’ait pas eu lieu plus tôt.
Pour comprendre cet état de fait, il faut se référer au modèle mécaniste appliqué aux pays arabes par Emmanuel Todd et Youssef Courbage* : la croissance du taux d’alphabétisation combinée à la maîtrise de la natalité a pour conséquence l’affranchissement des femmes et la libération de l’énergie féminine. Partout dans le monde, la conjonction de ces deux facteurs produit inéluctablement un processus démocratique. Pas en Tunisie, car la très forte endogamie a détourné l’énergie collective de l’espace public, d’où un retrait par rapport au désir de démocratie. Mais la jeune génération de la blogosphère a su se forger une nouvelle socialité par son ouverture sur le monde et des solidarités nouvelles, ce qui lui a permis d’avoir ce rôle décisif.
Le schéma égyptien est-il différent ?
Le rôle de l’armée rend la situation autrement plus complexe en Égypte. Après le coup d’État de 1952, elle a opéré une restructuration intégrale de la société et constitue aujourd’hui l’armature autour de laquelle tout s’organise. Avec la promotion du libéralisme voulue par Moubarak, elle est devenue très entreprenante. On a ainsi une trentaine de généraux qui se sont partagé le territoire et se comportent en « seigneurs de guerre » : l’armée ne lâchera jamais l’État en Égypte. Selon mes informations, elle mènerait des négociations très avancées avec les Frères musulmans pour s’assurer une majorité relative au gouvernement et garder le contrôle du pouvoir. C’est ce qui met en colère les jeunes de la place Al-Tahrir, qui estiment qu’il n’y a pas de changement.
Criado em 2007, como uma organização sem fins lucrativos, o Centre for Contemporary Art, em Lagos, na Nigéria, pretende ser uma plataforma para o desenvolvimento, apresentação e discussão da cultura e artes visuais contemporâneas, com mais de 7000 livros, revistas, videos e outros objectos. Entre eles, colecções importantes, descontinuadas, de publicações periódicas relevantes dos anos 60.
Nigeria Magazine
At CCA, Lagos our primary emphasis is on materials published in Nigeria and Africa, so we are really privileged to have this rich collection of Nigeria Magazines that are no longer in circulation. It is a quarterly publication, particularly important because it was written and published just after the Nigerian independence when the country was learning to take hold of its own reins, and, as stated by the magazine, it was published “for everyone interested in the country and its people”. The Nigeria Magazine focused on Nigeria’s rich culture – from festivals, art, people and their languages, dance, hairstyles, fashion, religions, architecture, agriculture to the railway system – you name it, it was all featured, representing all parts of the country. The magazine reflects the true Nigerian culture and how it was embraced by the people. The issues available at the CCA, Lagos library span the years between 1964 and 1989.Nigeria Magazine was published by the Cultural Division of the Federal Government of Nigeria and had various editors at different times.
Jonathan Jones é jornalista, critico de arte e colunista habitual do jornal The Guardian desde 1999, e também membro do juri do Turner Prize. Neste artigo, discute a relação entre o imperialismo e os museus britânicos, em particular, colocando questões relacionadas com a temática da conferência de abertura de António Pinto Ribeiro no 8º Encontro Ibero Americano dos Museus. Afirma o colunista do The Guardian:
Britain’s museums need to face up to a reality. Cultural imperialism is dead. They cannot any longer coldly keep hold of artistic treasures that were acquired in dubious circumstances a long time ago.
Amal Clooney may or may not be the best ambassador for the Greek government in its long campaign to return the Parthenon marbles to Greece. The celebrity support this cause has attracted ever since Lord Byron made it part of his romantic image in the early 19th century keeps it in the limelight, but also allows the British Museum, where the best sculptures from the 5th century BC Parthenon continue to be kept, to portray its critics as self-publicists.
Yet this is not the only case of a cultural treasure whose true ownership is disputed. The Benin sculptures in the British Museum, taken from the splendid west African city by a British “punitive raid” in 1897, are never going to rest easy in Bloomsbury. Meanwhile the international mood is shifting and will inevitably continue to shift towards a consensus that many wonders of the world are wrongfully hogged by western museums.
Gordon Parks (1912-2006) é considerado um dos maiores nomes da fotografia americana, além de músico, escritor e realizador de cinema. Negro, nascido e criado no tempo da segregação racial americana, a sua obra reflectiu essa experiência, tornando-o um artista destacado na defesa dos direitos civis. A reportagem de 1956 para a revista Life sobre a vida dos negros no final dos anos 50, retratando a vida quotidiana de uma família, catapultou a sua carreira, tendo sido então integrado como fotógrafo permanente daquela revista. A exposição "Segregation Story", que inaugura dia 15 de Novembro no Museum of Art de Atlanta, mostra fotografias dessa série, cuja importância é analisada por Dorrit Harazim na Revista Zum.
O ensaio sobre os Thornton foi publicado na edição de setembro de 1956 da LIFE, a mais influente revista noticiosa e ilustrada de todos os tempos, cuja circulação semanal chegou a alcançar os 13,5 milhões de exemplares. O ensaio de Parks não continha nenhuma foto de brutalidade policial, passeatas, boicotes ou racismo violento. Esparramadas ao logo de doze páginas da semanal de formato grande, 20 fotos documentavam pela primeira vez em cores o cotidiano prosaico de uma família negra do Sul rural: os Thornton sentados no sofá de casa, indo à igreja, membros da família tomando sorvete, olhando vitrines, crianças brincando displicentemente com armas, e outras cenas inofensivas do gênero. Nada apocalíptico, portanto, mas causou o desejado impacto.
Parks sabia que o grosso dos leitores de LIFE eram brancos e tinham escolaridade decente. Também sabia que o branco americano daquela época não operava com a noção de que o negro tinha uma vida privada plena e rica, no essencial igual à dele. Como ensinou o escritor James Baldwin, autor de Giovanni’s Room e o primeiro a dizer aos brancos com todas as letras o que os negros americanos pensavam e sentiam, os fundamentos incontestes de todo ser humano são apenas cinco: prazer, tristeza, amor, humor e dor.
Num segundo texto sobre o fotógrafo, a Revista Zum aborda a sua viagem ao Rio de Janeiro, e os retratos da vida na favela da Catacumba, reunidos então numa reportagem a que Gordon Parks chamaria “Visita a um Mundo Sombrio”, em 1961. Um acontecimento que causa uma verdadeira guerra institucional, com a Revista Cruzeiro a "responder" contra a associação Rio de Janeiro/pobreza, retratando a vida de famílias pobres em Nova Iorque, intitulada: "Favela sem samba e sem sol". Ambas as reportagens ficaram sob suspeita de métodos pouco documentais, numa polémica que se prolongou em publicações e contra-publicações. Gordon Parks ficou sempre ligado ao Rio de Janeiro e à criança que protagonizara a sua reportagem dos anos 60.
Passados quarenta anos desde que subira pela primeira vez a ladeira da Catacumba, Parks voltou ao Rio em 2000. Veio fotografar o Flavio já cinquentão para a edição de encerramento da LIFE, bíblia do fotojornalismo desde 1936. Engolida pela internet, ela deixou de existir em versão impressa.
Também a Catacumba deixara de existir desde 1970, quando o governador Negrão de Lima emitiu ordem de remoção e transferiu os moradores para conjuntos habitacionais na distante Zona Oeste do Rio. Rebatizada de Parque Natural da Catacumba, o local, hoje, é uma área ambiental de 30 hectares.
Gordon Parks morreu em 2006. Boa parte de sua fotografia são metáforas da vida. Alguém já escreveu que ele sempre misturou realismo documental com sensibilidade ficcional. Ou, como o próprio Parks se auto definiu : “Acabei me tornando um repórter objetivo com um coração subjetivo”.