Morreu Pina Bausch, aquela que foi uma das últimas heroínas do século xx. Deixou um reportório único, invulgar que condensa a história da condição humana. Os heróis e as heroínas das suas peças eram demasiado homens, eram demasiado mulheres; nas suas contradições como nos seus modos singulares de habitarem este mundo. Quantas vezes quisemos ser como aqueles homens crianças, homens deuses, mulheres submissas, mulheres rebeldes?! Quantas vezes aquelas obras de culto foram as obras que ligaram comunidades?! E nunca nos esqueceremos: " não importa tanto o modo como as pessoas dançam, mas a razão porque o fazem".
António Pinto Ribeiro
Em 2002, um grupo de amigos se reuniu para realizar um antigo desejo: formar uma típica orquestra de gafieira. A idéia era interpretar um repertório variado, boleros e temas dos anos 60, os clássicos da cultura de salão, com novos arranjos. A diferença era que estes amigos formavam a vanguarda da cena musical carioca. Quando a Orquestra Imperial estreou, reuniu em um só palco representantes das mais diversas vertentes da nova música brasileira.
Tornou-se uma das maiores sensações da cena cultural carioca, atraindo e animando grande público durante seus concorridos baile-shows. Já que a idéia era reunir os amigos, convidados ilustres foram aparecendo naturalmente: Caetano Veloso, Jorge Mautner, Marisa Monte, Erasmo Carlos... O palco, sempre aberto a participações especiais, fez da “big band” uma sala de estar dos mais diversos estilos musicais. Seu Jorge, único ex-integrante do grupo, Elza Soares, Fernanda Abreu, Ed Motta, Andreas Kisser (Sepultura), Jards Macalé, Miúcha, Luiz Melodia, Bebel Gilberto, Ney Matogrosso, Marcelo Camelo, Arnaldo Antunes, Sandra de Sá, Lobão, Chrissie Hynde (do Pretenders) são alguns dos artistas que já participaram dos shows. Isso sem contar o pessoal do samba, Beth Carvalho, Dudu Nobre, Zeca Pagodinho, Délcio Carvalho e muitos mais. Aliás, depois de muitas canjas, o grande sambista da Império Serrano,Wilson das Neves, juntou-se ao grupo.
(Fotos de Catarina Botelho)
(Fotos de Catarina Botelho)
Devido à chuva, o concerto de hoje com Dema y su Orquesta Petitera foi transferido para a Sala Polivalente do CAMJAP.
Dada a possibilidade de chuva hoje à noite, o concerto de A. J. Holmes foi transferido do Anfiteatro ao Ar Livre para a Sala Polivalente do CAMJAP.
Amanhã, no anfiteatro ao Ar Livre. 21h30
New Electric Hi-Life é a mistura única que Holmes faz da música highlife, da África Ocidental, com a pop electrónica britânica. A Highlife é um género musical com origem na Serra Leoa, Gana e Nigéria, a partir dos anos 1920. É um híbrido entre estilos musicais africanos e europeus. «Efectivamente edificante» foi o que o semanário alemão Die Zeit chamou ao seu álbum de estreia, Between Arrival and Departure (editora: Pingipung), e classificou-o como ‘álbum do ano 2005’. Desde então, Holmes tem refinado a sua técnica e, através do uso da tecnologia digital, conseguiu atingir algo total e deliciosamente único: a New Electric Hi-Life.
Cala a boca! Ele está fazendo levantar o sol!
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Ele fez o sol levantar...
«Fomos de táxi para o cinema. O filme, uma espécie de pioneiro, devido ao seu elenco composto sobretudo por negros brasileiros, fora rodado nos anos 50. A história era simples: o mito dos amantes infelizes, Orfeu e Eurídice, transposto para as favelas do Rio, durante o Carnaval. No esplendor do Technicolor, tendo como pano de fundo um cenário de colinas verdes, uns brasileiros negros e cor de café com leite cantavam e dançavam e tangiam as suas guitarras como pássaros felizes de plumagem colorida. A meio do filme, achei que já vira o suficiente e virei-me para a minha mãe para ver se estaria disposta a sair. Mas o seu rosto, iluminado pelo reflexo azulado do ecrã, tinha um olhar nostálgico. Nesse momento, senti como se me tivessem proporcionado uma janela para o seu coração, o coração impulsivo da sua juventude.»
Barack Obama no livro A Minha Herança, Casa das Letras, 2008
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«Fomos de táxi para o cinema. O filme, uma espécie de pioneiro, devido ao seu elenco composto sobretudo por negros brasileiros, fora rodado nos anos 50. A história era simples: o mito dos amantes infelizes, Orfeu e Eurídice, transposto para as favelas do Rio, durante o Carnaval. No esplendor do Technicolor, tendo como pano de fundo um cenário de colinas verdes, uns brasileiros negros e cor de café com leite cantavam e dançavam e tangiam as suas guitarras como pássaros felizes de plumagem colorida. A meio do filme, achei que já vira o suficiente e virei-me para a minha mãe para ver se estaria disposta a sair. Mas o seu rosto, iluminado pelo reflexo azulado do ecrã, tinha um olhar nostálgico. Nesse momento, senti como se me tivessem proporcionado uma janela para o seu coração, o coração impulsivo da sua juventude.»
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<br />Barack Obama no livro A Minha Herança, Casa das Letras, 2008
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(Fotografia de Catarina Botelho)
O Descobrir - Programa Gulbenkian Educação para a Cultura colabora com o Próximo Futuro concebendo e organizando um conjunto de iniciativas de âmbito educativo que vão ao encontro de algumas linhas programáticas do Próximo Futuro, interpretando-as e recriando-as numa parceria que terá continuidade nas próximas edições. A edição deste ano concentrar-se-á num programa de actividades educativas dedicadas a todos mas, maioritariamente, às famílias, crianças e adolescentes. As iniciativas seguem o calendário da edição deste ano do Próximo Futuro (20 de Junho a 12 de Julho), concentrar-se-ão, em particular, nos fins-de-semana e os protocolos de funcionamento, inscrição e visitas são os comuns às outras iniciativas do Descobrir - PGEC. Mais detalhes aqui
Imagem de Sara & André
Fundação Sara & André por Isabel Brison
2009
Cortesia Galeria 3+1
Hoje, 25 de Junho, anfiteatro ao ar livre, 22h
Primeira cena do filme: eu estou no telefone, meio hesitante.
- Alô? Consulado da Hungria, bom dia.
- Eu queria uma informação, por favor. Uma pessoa cujo avô é húngaro… tem direito a um passaporte húngaro?
A pessoa do outro lado tem um sotaque húngaro muito forte. Não tem certeza de ter entendido minha pergunta.
- Essa pessoa é húngara?
- Não. Meu avô é húngaro.
- Você é francesa?
- Não. Sou brasileira.
A ideia está lançada: vou pedir a nacionalidade húngara. O processo administrativo será o fio condutor do filme. Ele levanta questões sobre o que é uma nacionalidade, para que serve um passaporte, sobre o que somos porque queremos ser e o que somos porque herdamos.
Vítor Belanciano no Público de hoje
Nicolas Bourriaud teorizou sobre o conceito de altermodernidade na Gulbenkian, mas ele pode ser experienciado nos próximos dias, nas acções do programa Próximo Futuro
Domingo, o Anfiteatro da Gulbenkian, em Lisboa, converteu-se numa invulgar pista de dança, com o sírio Omar Souleyman a colocar toda a gente em delírio, através de uma música física e sintética, impossível de definir nemocidental, nem africana, nem do passado, nem do presente, mas tudo isso também.
Foi o primeiro fim-de-semana do programa Próximo Futuro e naquela libertação de energia já estavam condensadas muitas das considerações que, anteontem, o curador e ensaísta francês Nicolas Bourriaud expôs na Sala Polivalente do Centro de Arte Moderna, pequena para o interesse suscitado.
Curador, este ano, da trienal de arte contemporânea da Tate Britain, Bourriaud tem dado que falar por causa do conceito que cunhou, a altermodernidade, forma de superar o pósmodernismo, a sensação de fim de história, a hegemonização ou a nostalgia do regresso ao passado, num mundo globalizado, desordenado, massificado, em crise. Um paradigma que divide opiniões e que aplicou às artes, mas que atravessa todos os edifícios do mundo contemporâneo, propondo chaves de leitura para a actualidade.
Também ele falou da libertação de uma nova energia, como forma de resolver o impasse para práticas artísticas - mas que poderiam ser as formas de viver ou os modelos de sociedades - onde tudo já parece ter sido tentado, feito, produzido. Uma energia já não criada ou controlada, apenas, a partir do Ocidente, mas que ultrapassa todas as fronteiras. "Ser moderno no séc. XX correspondia a pensar de acordo com as formas ocidentais, hoje a modernidade produz-se segundo uma negociação planetária."
Uma energia já não presa à ideia clássica de história, mas possuída por múltiplas temporalidades simultâneas, "onde a história é apenas mais um espaço como qualquer outro". Uma energia difícil de definir, mas que, em vez de se sustentar em todos os "pós" que fomos acumulando ao longo das últimas décadas (pósmodernismo, pós-feminismo, póscolonialismo, etc), assume que a vida e arte podem ser articuladas, e surgir como experiências positivas, desde que cada um consiga "construir a sua própria navegação", não ambicionando a totalidade, "porque ela é impossível." Ou seja, assumindo que tudo à nossa volta é precário e errante. "É isso que os artistas nos têm mostrado."
É essa modernidade, finalmente planetária, e não simplesmente pseudo-ocidental, que vai continuar em destaque na programação do Próximo Futuro.
Sábado e domingo há música com A.J. Holmes e Dema Y Su Orquesta Petitera. A 4 e a 5 é a vez da Orquestra Imperial e a 11 os Gala Drop. O ciclo de cinema, a decorrer no Anfiteatro, teve início ontem, prolongando-se até 10 de Julho, privilegiando filmes - antigos e recentes - que aprofundem relações entre acontecimentos, que conjuguem imagens provenientes da América Latina, África ou Europa.
(Fotografia de Catarina Botelho)
A partir de hoje, no Anfiteatro ao Ar Livre
Afrique sur Seine (França, Senegal, 1955), de Paulin Soumanou Vieyra.
De todos os países subsarianos, o Senegal pode ser considerado o país fundador do cinema africano por causa da presença cimeira de Ousmane Sembene, o primeiro realizador africano a ganhar reconhecimento internacional. Porém, foi outro senegalês, Paulin S. Vieyra, que, em conjunto com outros três realizadores africanos (Mamadou Sarr, Robert Caristan e Jacques Melo Kane), fez em 1955 a primeira obra – uma curta-metragem – que materializou as aspirações do cinema africano, Afrique sur Seine.
Casa de Lava (Portugal, 1994), de Pedro Costa
Casa de Lava será talvez a mais completa e profunda obra das relações sempre esquivas e por resolver que Portugal tem estabelecido e estabeleceu, com as suas colónias. A inconsciência aparente das imagens de Casa de Lava revelam a consciência profunda de um convívio que foi e é muito próximo mas nunca de plena intimidade. Ou então a verificação instintiva de que essa intimidade é uma circunstância e um acaso, proporcionado por um aturado convívio, é certo, mas sempre fugidio e nunca atingível pela fixidez do cinema, a arte mais em mutação e em movimento que existe.
José Navarro de Andrade (Colaboração: Cinemateca Portuguesa)
4 Jantares de 3 continentes, África, América Latina e Caraíbas e Europa
20 e 27 de Junho/ 4 e 11 de Julho, na Cafetaria do Museu Gulbenkian.
19h30 - 21h30
Miguel Castro Silva e José Avillez, que representam duas gerações de criadores da cozinha portuguesa, apresentam quatro jantares onde se abordarão técnicas e produtos de cozinha com receitas de África, da América Latina e Caraíbas e da Europa.
Do fluxo de produtos e de experiências culinárias entre estas culturas resultaram alimentos e gostos que se tornaram globais e que integram as cozinhas regionais de cada uma delas. É a partir desta história que propomos uma viagem com os aromas dos três continentes, através da degustação de cerca de nove pratos inesquecíveis.
(Jantar do passado Sábado, dia 20. Fotografias de Catarina Botelho).
Apesar de a luminosidade
outrora tão brilhante
Estar agora para sempre afastada do meu olhar,
Ainda que nada possa devolver o momento
Do esplendor na relva,
da glória na flor,
Não nos lamentaremos, inspirados
no que fica para trás;
Na empatia primordial
que tendo sido sempre será;
Nos suaves pensamentos que nascem
do sofrimento humano;
Na fé que supera a morte,
Nos tempos que anunciam o espírito filosófico.
William Wordsworth
(Tradução de Catarina Belo)
José Bechara explica o seu mais recente trabalho, no programa de televisão brasileiro Catálogo.
"A Casa" está instalada em frente ao Museu Gulbenkian até ao próximo dia 30 de Setembro.
How Altermodern are you?
(para utilizadores de facebook)
Nicolas Bourriaud, amanhã, às 18h30 na Sala Polivalente do CAMJAP.
Conferência em inglês, sem tradução simultânea
(Fotografias de Catarina Botelho)
e hoje a partir das sete da tarde, no anfiteatro ao ar livre
Escuta a palpitação do espaço
são os passos da estação no cio
sobre as brasas do ano
Rumor de asas e de guizos
tambores longínquos do aguaceiro
crepitação e respiração da terra
sob suas vestes de insectos e raízes
A sede desperta e constrói
suas grandes gaiolas de vidro
onde tua nudez é água encadeada
água que canta e se desencadeia
Armada com as armas do Verão
entras em meu quarto e em minha fronte
e desatas o rio da linguagem
olha-te nestas rápidas palavras
O dia queima-se pouco a pouco
sobre a paisagem abolida
tua sombra é um país de pássaros
que o sol dissipa com um gesto
Octávio Paz
Tradução de Luís Pignatelli
Antologia Poética, Dom Quixote
Toldos e Poemas. A partir de amanhã
(mas já se pode espreitar)
Amanhã, 20 de Junho, no Anfiteatro ao Ar Livre
Na continuação de anteriores apresentações no Anfiteatro ao Ar Livre dos jardins da Fundação, a Orquestra Gulbenkian organizou para este Verão um programa da sua inteira responsabilidade a propósito das relações musicais possíveis entre compositores da América Latina, de África e da Europa. Num único concerto e sob a direcção do maestro Osvaldo Ferreira, vamos poder assistir à execução das seguintes obras:
George Gershwin – Cuban Overture 10’
Heitor Villa-Lobos – Dansa e Toccata (da Bachiana Brasileira N.º 2) 10’
Hans Rosenschoon – Clouds Clearing 10’
Alberto Ginastera - Variações Concertantes 23’
Aaron Copland – Three Latin-American Skecthes 10’
Astor Piazzolla – Violentango 5’
(um video de Violentango de Piazolla, pela Orquestra Sinfónica de Haifa)
Convide-me a passar a noite na sua boca
Conte-me a juventude dos rios
Pressione a minha língua contra o seu olho de vidro
Dê-me a sua perna como alimento
E depois durmamos irmão do meu irmão
Porque os nossos beijos morrem mais depressa que a noite.
Joyce Mansour
(Tradução anónima)
Hoje, às 18h30, na FNAC do Chiado, apresentação do Programa Gulbenkian Próximo Futuro.
Os moços tão bonitos me doem,
impertinentes como limões novos.
Eu pareço uma atriz em decadência,
mas, como sei disso, o que sou
é uma mulher com um radar poderoso.
Por isso, quando eles não me vêem
como se me dissessem: acomoda-te no teu galho,
eu penso: bonitos como potros. Não me servem.
Vou esperar que ganhem indecisão. E espero.
Quando cuidam que não,
estão todos no meu bolso.
Adélia Prado
Bagagem
Livros Cotovia, 2002
Omar Souleyman é uma estrela da música popular da Síria. Editou já para cima de 500 discos e cassetes (tanto em estúdio como ao vivo). Com uma carreira de 15 anos, recolhe vocabulários musicais da sua terra natal, do Iraque, Turquia e da vasta população Curda. Trabalhando desde o Dabke (música de dança folclórica regional), acompanhado de um indescritível som de teclado em escalas arábicas infernais, emprega também orquestrações de metais, cordas e percussão. Paralelamente, tem constantemente procurado explorar formas de canto improvisado tradicional, de pendor mais meditativo.
No dia 21 de Junho, às 19h00 em concerto com o Group Doueh.
Sessão de Djs Sublime Frequencies (na esplanada do Centro de Arte Moderna) e projecção de filmes Sublime Frequencies a partir das 17h00.
(fotografia: Catarina Botelho)
D. Josefina Amélia dos Prazeres Santos Tembe
viajando no tejadilho do calhambeque "Chapa 100"
ia à cidade de Maputo vender
uma trouxa de 8 couves
quando aquele frufru
da rajada não deixou.
José Craveirinha
A casa do artista plástico José Bechara (Rio de Janeiro 1957; http://www.josebechara.com/) teve a sua primeira figuração no contexto de um workshop no Paraná, em Maio de 2002. Então a casa, literalmente uma casa, colorida, tropical, expulsava os seus haveres de um modo quase lúdico, quase infantil, quase rebelde. Era o início de um outro – mais um - processo de criação e de experimentação, prática obsessivamente permanente do artista. Depois a casa apareceu mais tarde na quase-forma com que é instalada aqui no pátio em frente ao Museu Gulbenkian. A casa assume agora o lado absolutamente físico, atlético da sua condição de construção e o lado metafórico da condição de vida. Nesta casa temos, pois, algo que vem de outros trabalhos e suportes de José Bechara como as lonas de camiões oxidadas, as peles curtidas de bovinos como telas, as folhas de papel enferrujadas e suspensas. O lado físico, o lado do confronto entre o corpo e a construção artística plástica é da ordem da criação do artista. Por isso é possível falar nesta dimensão atlética da casa, da sua fisicalidade, de fluidos que são os móveis e os pertences expulsos pelos orifícios da casa que faz com que expressões como a ’casa vomita‘, a ’casa cospe’,”a ’casa expulsa‘, numa aparente elegância que lhe é dada pela composição, tenham todo o sentido. E é neste momento que nos aproximamos da metáfora possível desta casa: a casa não contém mais a tensão no seu interior seja ela social, psicológica, afectiva, política e tem de expulsar. Mas é na forma desta expulsão que está também a pertinência desta obra porque este movimento é de regeneração do interior da casa, da vida e do que faz as ideias. Para Bechara, no contexto de toda a sua obra, é fulcral a regeneração, a capacidade de fazer circular a energia nas suas várias expressões: na arte, no dinheiro, nas cidades, nas casas e nada disto é apocalíptico. Pelo contrário, o vazio que se imagina ficará como fim no interior da casa e é, em segredo, quase um poema haiku ou um aforismo essencial sobre a vitalidade, sobre a energia da criação.
Em cima, os preparativos para "A Casa". A partir do dia 20 de Junho.
(fragmento)
as estrelas levam-nos o coração
porque as estrelas não têm o mínimo desejo
de nos devorar!
as estrelas trocam-nos o coração pelo coração de
uma estrela
as estrelas levam-nos o coração e dão-nos
o coração de uma estrela
e nunca mais teremos fome
porque as estrelas dizem: ‘Tsau! Tsau!’
e os bosquímanos dizem que as estrelas amaldiçoam
os olhos do antílope
as estrelas dizem: ‘tsau’, dizem: ‘Tsau! Tsau!’
amaldiçoam os olhos do antílope
cresci a ouvir as estrelas
as estrelas dizem: ‘Tsau! Tsau!’
é sempre Verão quando ouvimos as estrelas dizer Tsau
Composto por /HAN#KASS'O ( - ); convertido num poema por Antjie Krog
(Tradução: Catarina Belo)
I’m a creep, I’m a weirdo, what the hell am I doing here, I don’t belong here
Radiohead, ‘Creep’ (Pablo Honey)
quem me dera poder levantar-me como ontem
tomar banho, vestir-me, ir trabalhar como ontem
mas hoje é outro dia
hoje, tudo o que sei se perdeu e tudo o que se perdeu sou eu
talvez amanhã seja melhor
se eu conseguir sobreviver ao perigo de hoje
Ronelda Kamfer
(tradução de Catarina Belo)
Porque as manhãs são rápidas e o seu sol quebrado
Porque o meio-dia
Em seu despido fulgor rodeia a terra
A casa compõe uma por uma as suas sombras
A casa prepara a tarde
Frutos e canções se multiplicam
Nua e aguda
A doçura da vida
Sophia de Mello Breyner Andresen
Livro Sexto
Círculo de Poesia – Moraes Editores
Lisboa 1976
Se eu fosse chamado
A erigir uma religião
Faria uso da água.
Ir à igreja
Envolveria passar a vau
Com roupas secas, diferentes;
A minha liturgia empregaria
Imagens de encharcar,
Um alagamento de furor e devoção.
E do lado nascente iria erguer
Um copo de água
Em que a luz de qualquer ângulo
Se congregasse sem fim.
Philip Larkin
(tradução de Rui Carvalho Homem)
O jardim da Fundação Gulbenkian é um lugar de culto. Começa por ser um jardim magnificamente desenhado pelo Arquitecto Ribeiro Telles - de algum modo inspirado numa ilha paradisíaca conforme o autor, com uma flora diversificada com fortes traços do sul, para se tornar num lugar cheio de histórias de espectáculos, de lições públicas, por onde passam visitantes cujos maiores propósitos são lúdicos, de encontros ou de leituras prazenteiras. No Verão, as sombras das árvores protegem os passeantes do calor tórrido que em certos dias se faz sentir, que indicia que estamos no Sul,e, a este propósito, desde 2006, têm sido instalados toldos que, no seu conjunto, perfazem um caminho que começou por ser um passeio de sombra que protegia do sol abrasador e, posteriormente, esta função foi associada à função de suporte de telas impressas. Este ano este passeio terá inscrito, ao longo dos seus 80 metros, poemas de autores da mais variada região cultural, clássicos, modernos e contemporâneos.
A partir do dia 20 de Junho, e até ao dia 30 de Setembro, no Jardim Gulbenkian