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Ensaio sobre a I Guerra Mundial e a participação africana

Pu­bli­cado9 Set 2014

Imagem: Trin­cheiras junto ao Rio Ro­vuma. Ar­quivo His­tó­rico Mi­litar

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O re­cru­ta­mento for­çado de afri­canos para serem car­re­ga­dores, mi­li­tares e para tra­ba­lhar na cons­trução de es­tradas (que re­for­çavam a co­mu­ni­cação de guerra e também o al­cance do apa­relho co­er­civo da ad­mi­nis­tração co­lo­nial) re­a­cendeu nu­me­rosos con­flitos. Al­guns destes ad­qui­riram um ca­rácter pan-ét­nico, como su­cedeu, por exemplo, na Zam­bézia. A agi­tação e as re­voltas em Tete e no Barué em 1917, que en­vol­veram cerca de 15,000 com­ba­tentes afri­canos numa re­gião que fora ob­jecto de pa­ci­fi­cação uns anos antes, es­ti­veram cer­ta­mente re­la­ci­o­nadas com as mo­vi­men­ta­ções da guerra, em­bora não se possam com­pre­ender senão num en­qua­dra­mento his­tó­rico mais amplo, do ponto de vista cro­no­ló­gico, e mais apro­fun­dado, de um ponto de vista ana­lí­tico.

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O uso de tropas na­tivas não foi apenas mais um exemplo da im­pro­vi­sação ge­ne­ra­li­zada que ca­rac­te­rizou o es­forço de guerra na­ci­onal. Foi também mais uma en­trada no vasto ca­tá­logo de atro­ci­dades que pau­taram a acção por­tu­guesa (e eu­ro­peia) na al­tura. Os vo­lun­tá­rios da corda – ou seja, os afri­canos “va­dios” e “in­do­lentes” que eram cap­tu­rados, atados a uma corda e con­du­zidos a ins­ta­la­ções mi­li­tares, num pro­cesso em muito se­me­lhante ao re­cru­ta­mento de mão-de-obra para tra­ba­lhos pú­blicos e pri­vados – de­ti­veram um papel fun­da­mental nestes con­flitos.

A guerra eu­ro­peia em África foi es­sen­ci­al­mente pro­ta­go­ni­zada por afri­canos. Estes, sim, são os sol­dados e par­ti­ci­pantes mais des­co­nhe­cidos de todos. Um pouco por toda a Eu­ropa estão ser de­vi­da­mente re­co­nhe­cidos, ainda que tar­di­a­mente. O “im­posto de vidas” assim o exige.

En­saio com­pleto pu­bli­cado na série de­di­cado à I Guerra Mun­dial no jornal Pú­blico: O Choque das Ci­vi­li­za­ções: tes­te­mu­nhos, hor­rores e si­len­cios, por Mi­guel Ban­deira Je­ró­nimo, his­to­ri­ador e in­ves­ti­gador do ICS-UL