Logótipo Próximo Futuro

Bissau

Bissau é cheiro. Cheiro de terra e panos (a lembrar o índigo que originalmente os tingia). Cidade junto ao mar virada para terra. Sem monumentos que fascinem, nem paisagens que marquem. Bissau não é beleza.

É o apurar dos sentidos e o entranhar da ambiência.
Várias cidades numa só.
Dois centros.
Um, o dos edifícios coloniais, dos restaurantes e cafés para “cooperantes” e elites. O centro da Pensão Central, lugar mítico para os portugueses que passam por esta África, conhecido pelo nome da sua proprietária, “D. Berta”, e do Centro Cultural Francês, que perfaz o cenário cultural de Bissau.
Outro, o do eixo onde pulula a vida, o Mercado do Bandim, grande, mas não descomunal, como noutras cidades africanas. Local de comércio de produtos da Guiné e do mundo, e de encontros (em pontos como as grandes mangueiras a norte) entre os residentes nos diversos bairros: Antula, Belém, Militar, Quélélé, Sintra, Ajuda, Cuntum, Gã-Beafada… Bairros espacial e urbanamente confinados, mas com populações flutuantes, se se contar com todos os parentes que vêm das “tabancas” (aldeias), por uns dias, uns meses ou até uns anos. Numa territorialidade e continuidade étnica que torna a cidade um espelho do país.
Cidade africana pobre, sem electricidade, abastecimento de água, serviços eficazes de saúde, “emprego”… Cidade onde se afadigam, em múltiplas actividades de sobrevivência e laços sociais com raízes no tempo, cerca de 250.000 habitantes (estima-se que na capital esteja perto de ¼ da população do país).
Em Bissau a noite é breu pontuado pelas estrelas, pela iluminação de gerador das raras casas privilegiadas e pelas velas de vendedores de rua.
Em Bissau o dia é teia de vida, é cor.
Amélia Frazão Moreira
Antropóloga
Fotografia de André Barata