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"Vou lá visitar pastores": uma análise da obra de Ruy Duarte de Carvalho

"Vou lá Visitar Pastores", espectáculo de Manuel Wigorg que se apresenta no Próximo Futuro em Setembro, mais de uma década depois da sua estreia na Culturgest, baseia-se no livro homónimo de Ruy Duarte de Carvalho (1941-2010), escritor, cineasta e antropólogo. A obra, publicada pela Cotovia em 1999, é um percurso angolano em território Kuvale e aborda esta sociedade pastoril do Sudoeste de Angola. O espectáculo contará com um conjunto de desenhos e fotografias do próprio autor. A investigadora brasileira Rita Chaves escreveu sobre o livro, em texto publicado no site Buala.

Numa tentativa de síntese, podemos definir essa narrativa como um relato apurado, baseado em longo trabalho de pesquisa sobre os kuvale, povo pastoril que vive na região sul de Angola e que vem sendo objeto das pesquisas antropológicas realizadas por Ruy Duarte de Carvalho desde o início dos anos 90. No texto, estão os dados que a etnografia ajuda a selecionar, sistematizar e classificar e, com isso, revelar lógicas que não são as nossas, decifrando um universo de percepções, sentimentos, causalidades e relações que definem um outro modo de estar no mundo. Dividido em quatro partes – Memórias, colocações / Viagens e encontros: figuras / Etnografias, torrentes / Decifrações, desafios -, o livro traz-nos ainda um post-scriptum e um glossário, além de ilustrações que participam do esforço do autor para nos apresentar um outro mundo.

O título da própria obra e de cada uma de suas partes antecipa ao leitor a inquietação confirmada a cada página desse que pode ser visto, afinal, como um livro incatalogável. Após o fim da leitura, vamos continuar sem saber exatamente como definir esse livro que habita a estante de antropologia e não ficaria mal localizado na de literatura. É certo que temos um ensaio antropológico, acurado, rigoroso, responsável; contudo, ao lado do olhar etnográfico atento, detectamos a preocupação de alguém que pretende mais que descrever o outro. Desses pastores que têm sido foco da atenção do autor, com resultados publicados em vários textos, a narrativa tenta chegar mais perto, num movimento de aproximação, no entanto, diferente daquele que comumente é a base dos documentos produzidos pelas ciências sociais. A energia da linguagem poética que emerge em muitas passagens sugere outras dimensões para esse que não deixa de ser um relato de viagens.

O texto completo em "Vou lá visitar pastores" - literatura, antropologia e identidade(s)