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os pequenos mundos do edifício yacoubian

de Alaa El Aswany

Trad. do inglês de Helena Falé Chora

Editora Presença

Um livro que retrata a sociedade egípcia desde a década de 30 do século passado – data da construção do edifício Yacoubian – até à Guerra do Golfo. Yacoubian é um dispositivo que tanto permite a construção de pequenas narrativas relativas a cada um dos ocupantes dos vários apartamentos, como se  tratasse de várias cenas de teatro em simultâneo, como é o ponto de partida e de chegada para as narrativas maiores em torno das grandes questões sociais, políticas e religiosas que trespassaram o Cairo ao longo de oitenta anos.

A perícia do escritor egípcio no modo como encadeia e combina as pequenas e as grandes narrativas é exímia e constitui uma das grandes qualidades da construção desta obra. Uma outra qualidade decorre da forma minuciosa como tece cada uma das personagens e as faz evoluir respondendo às situações que vai construindo ao longo do romance. Ler este livro a poucas centenas de metros da praça Tahrir tem também como efeito entender esta obra como um passado histórico onde a corrupção dos governos, o nacionalismo fundamentalista de Nassar, o fanatismo religioso para o qual muito contribuiu a repressão do regime, terá conduzido a esta praça.

APR

Literatura Árabe do Norte de África (I): Albert Cossery

Nascido no Cairo em 1913 e falecido num hotel de Paris a 22 de Junho de 2008, Albert Cossery terá sido o último da geração dos chamados escritores dandies, título atribuído pelo tipo de vida urbana e flânneur que levavam. A sua obra, constituída por cerca de uma dezena de livros, tem como cenário de acontecimentos o seu Egipto do século XX.

No caso do romance "Les Couleurs de L’Infamie", lido na versão da tradutora brasileira Flávia Nascimento, trata-se da pequena história de um ladrão profissional – Ossama – descrito como um ladrão bom porque só rouba os ricos que se vê enredado numa história de corrupção que envolve um político detentor de um grande poder no Egipto sob o regime de Hosni Mubarak. Há como sempre em Albert Cossery uma metáfora da corrupção e da violência social deste regime – que acaba de cair – descritas nas ruas dos bairros pobres do cairo, na presença de milhares de mendigos na cidade, no confronto com a permanente corrupção que alimenta o regime. Parte da narrativa decorre no cemitério do Cairo, uma autêntica cidade que tivemos recentemente a possibilidade de ver no excelente documentário de Sérgio Tréfaut “A Cidade dos Mortos”.

Em "As Cores da Infâmia" há todo um manual de regras de comportamento para o ladrão que é profissional; corre riscos e tem princípios: “Não há nada de mais imoral do que roubar sem riscos” ou “Não inculquei em você a minha arte para que se tornasse um ladrão de cinema, cuja única preocupação é não desagradar ao público” (págs. 66 e 67). E com doses certas de ironia o autor sai das fronteiras do Egipto e fala do mundo: “Repare nas pirâmides. Neste país, não passa pela cabeça de ninguém construir uma pirâmide. O lugar está ocupado há 4 mil anos. Mas no estrangeiro tem-se erguido algumas pirâmides. Aliás essa é a moda da arquitectura moderna” (págs. 129-130).

APR