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PORVENTURA, António Cicero

porventura

António Cícero não publicava poesia há dez anos. O último livro chamava-se "A cidade e os Livros" (publicou ensaio entretanto). Acaba de sair um livro notável, "Porventura" é o título. Uma obra evocando permanentemente os autores clássicos helenistas e latinos que ele tão bem conhece e manuseia com a sabedoria de quem tem estes autores como seus convivas.

Dois exemplos:


Desejo

Só o desejo não passa

e só deseja o que passa

e passo meu tempo inteiro

enfrentando um só problema.

ao menos no meu poema

agarrar o passageiro

Diamante

O amor seria fogo ou ar

em movimento, chama ao vento;

 e no entanto é tão duro amar

este amor que o seu elemento

deve ser terra; diamante,

já que dura e fura e tortura

e fica tanto mais brilhante

quanto mais se atrita , e fulgura,

ao que parece, para sempre:

e às vezes volta a ser carvão

a rutilar incandescente

onde é mais funda a escuridão;

e volta indecente esplendor

e loucura e tesão e dor.

[mais António Cícero, aqui]